Opinião

Requerimento administrativo no INSS e restabelecimento de benefícios

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23 de agosto de 2022, 16h06

Este artigo tem por escopo aclarar o estágio atual da legislação e jurisprudência acerca de tema tão caro à vida dos cidadãos que necessitam da tutela do Estado-Juiz em demandas de natureza previdenciária: o interesse processual de agir e a necessidade do requerimento administrativo prévio perante o INSS.

Agência Brasil
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Mais especificamente, vem-se discutir a obrigatoriedade ou não da prévia solicitação de prorrogação ou restabelecimento/manutenção de benefício por incapacidade temporária (antigo auxílio-doença), permanente (antiga aposentadoria por invalidez) e benefício assistencial para que, sob a ótica jurídico-processual, tenha-se por satisfeita a condição da ação conhecida como "interesse de agir" (artigo 17 do Código de Processo Civil).

Até 2014, havia substanciosa controvérsia jurisprudencial acerca da necessidade do prévio requerimento administrativo no INSS para fim de configuração do interesse-necessidade de agir nas demandas previdenciárias. Contudo, em data de 27 de agosto de 2014, o Plenário da Corte Suprema julgou o RE 631.240/MG, decidindo pela compatibilidade entre a exigência do prévio requerimento administrativo e o princípio da inafastabilidade da jurisdição insculpido no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição.

Na ocasião do julgamento, foram tecidas flexibilizações à tese geral, destacamos uma dentre as várias delas, in litteris:

"Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo  salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração , uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão."

Muito embora já pacificado o tema pela jurisprudência soberana do Supremo Tribunal Federal, pois o julgamento, embora não tomado em sede de jurisdição vinculativa (controle concentrado de constitucionalidade), o foi pela sistemática da repercussão geral, gozando assim de necessária observância pelas instâncias jurisdicionais e administrativas inferiores.

Contudo, é cediça a existência de decisões jurisdicionais de Juízes de primeira instância, Turmas Recursais e inclusive da Turma Nacional de Jurisprudência (TNU) desafiando a autoridade do julgamento proferido em sede do RE 631.240/MG, pelo STF.

Cita-se, por todos, o Tema 277 da TNU, o qual, escorando-se na novidade legislativa prescrita no artigo 60, §9º da Lei nº 8.213/90 (acrescentado pela Lei nº 13.457/2017), mas ao arrepio do quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal no bojo do RE multicitado, proferiu a seguinte ementa:

O direito à continuidade do benefício por incapacidade temporária com estimativa de DCB (alta programada) pressupõe, por parte do segurado, pedido de prorrogação (§9º, artigo 60 da Lei nº 8.213/91), recurso administrativo ou pedido de reconsideração, quando previstos normativamente, sem o que não se configura interesse de agir em juízo.

Se, contudo, a jurisprudência sedimentada no STF é no sentido de não se admitir a fossilização da constituição, ou, em outros termos, de se admitir a reversão legislativa da jurisprudência da Corte (valendo as decisões, inclusive aquelas prolatadas em controle concentrado de constitucionalidade, a todos agentes e órgãos públicos, com exceção do Poder Legislativo em sua função típica de legislar — nessa senda: Rcl 552/1966, relator ministro Victor Nunes Leal;  Rcl 467/1994, relator ministro Celso de Mello; e AgR-Rcl 2.617/2005, relator ministro Cezar Peluso), é certo que, com o advento legislativo da Lei n. 14.331/2022, que inseriu o artigo 129-A na Lei nº 8.213/90, houve verdadeira consolidação normativa e encampação da jurisprudência do STF consolidada no RE 631.240/MG.

O novel artigo 129-A, inciso II, alínea 'a', da Lei nº 8.213/91, dispõe  que, nos litígios e medidas cautelares relativos aos benefícios por incapacidade de que trata a lei, a petição inicial deverá ser instruída com "comprovante de indeferimento do benefício ou de sua não-prorrogação, quando for o caso, pela Administração Pública".

Assim, fica nítido que a legislação atual acolhe e prestigia a jurisprudência do E. STF firmada desde 2014, equiparando a decisão de não prorrogação do benefício à decisão administrativa de indeferimento do benefício, pois a não-prorrogação equivale, nos termos do julgamento do multicitado recurso extraordinário, ao indeferimento, ainda que tácito, da pretensão de continuidade no recebimento do benefício previdenciário/assistencial.

É urgente, assim, a revisão da jurisprudência, inclusive da TNU, contrária às premissas estabelecidas pela Corte Excelsa no julgamento e cristalização do tema 350 (RE 631.240/MG), e agora positivadas na Lei nº 8.213/91, em seu artigo 129-A, II, alínea "a".

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