Opinião

Desafios da expatriação de brasileiros: compensação de valores pagos no exterior

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22 de agosto de 2022, 6h10

No final de 2021, foi editado o Decreto nº 10.854/2021 com vistas a regulamentar disposições relativas à legislação trabalhista e instituir o programa permanente de consolidação, simplificação e desburocratização de normas trabalhistas infralegais e o prêmio nacional trabalhista. Dentre as alterações promovidas, houve a revogação expressa do Decreto nº 89.339/1984.

Editado após a Lei nº 7.064/1982, também conhecida como Lei do Expatriado ou Lei Mendes Junior, o Decreto nº 89.339/1984 tinha como objetivo regular a situação dos trabalhadores contratados ou transferidos, por empresas prestadoras de serviços de engenharia, inclusive consultoria, projetos e obras, montagens, gerenciamento e congêneres, para prestar serviços no exterior.

Quando a referida lei e o decreto foram editados pretendeu o legislador apenas regular a transferência e a contratação de empregados de empresas de engenharia no exterior. Ou seja, a princípio, as disposições legais não eram aplicáveis a todos os empregados transferidos para o exterior, ainda que, posteriormente, a jurisprudência as tenha aplicado, por analogia, aos demais casos. 

Essa situação se consolidou quando da edição da Lei nº 11.962/2009 que alterou a Lei nº 7.064/1982 para dispor expressamente que as disposições da Lei do Expatriado eram aplicáveis a todos "os trabalhadores contratados no Brasil ou transferidos por seus empregadores para prestar serviço no exterior", independentemente da área de atuação das empresas e de seus empregados.

Ocorre que o Decreto nº 89.339/1984 não sofreu essa alteração, tendo sua aplicação ficado limitada aos trabalhadores em empresas de engenharia, até o final da sua vigência em 2021. Com isso, não era possível ter segurança jurídica de que as disposições do Decreto valiam para todos os trabalhadores, diante da inexistência de ações judiciais discutindo a sua aplicabilidade aos demais trabalhadores.

Dentre os assuntos que o Decreto buscava regular, havia a possibilidade de dedução dos valores pagos pela empregadora, quando da liquidação de direitos no exterior, dos depósitos do FGTS em nome do empregado. Em outras palavras, a empresa poderia reaver os valores pagos no exterior em favor do empregado na liquidação de direitos, através do levantamento dos valores depositados na conta de FGTS do empregado.

Esse procedimento não poderia ser automático e dependeria de autorização e expedição de alvará judicial, cabendo à empresa apresentar em juízo uma cópia autêntica da documentação comprobatória da liquidação dos direitos do empregado no exterior, traduzida oficialmente. Caso o saldo existente na conta vinculada do FGTS do empregado não fosse o suficiente para a dedução integral dos valores correspondentes aos direitos liquidados pela empresa no exterior, a diferença poderia ser levantada mediante nova dedução dessa conta, quando da cessação, no Brasil, do contrato de trabalho, mediante a expedição de novo alvará.

Com a revogação do referido decreto, essas disposições passaram a ser reguladas pelos artigos 143 e seguintes da Lei nº 10.854/2021, no Capítulo XV, sendo aplicáveis a todos "trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior” havendo previsão expressa que “os valores pagos pela empresa empregadora na liquidação de direitos estabelecidos pela lei do local da prestação de serviços no exterior poderão ser deduzidos dos depósitos do FGTS em nome do empregado existentes na conta vinculada".

Essa alteração trouxe mais segurança jurídica às empresas que optem por compensar os valores pagos na liquidação de direitos ao empregado no exterior com os depósitos de FGTS do empregado, uma vez que há previsão expressa do seu cabimento. A matéria ainda é desafiadora considerando que deve ser levada aos Tribunais do Trabalho, que ainda não estão familiarizados com essa possibilidade, eis que pouco explorada.

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