Opinião

Do reajuste nos planos coletivos à incerteza sobre a extensão do rol da ANS

Autores

  • Luciana Goulart Penteado

    é advogada sócia fundadora do Goulart Penteado especialista em Direito Processual Civil pelas Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e integrante do Comitê do Instituto Brasileiro de Estudos de Concorrência Consumo e Comércio Internacional (Ibrac).

  • Desirreé Franco

    é sócia júnior do Goulart Penteado especialista em Direito Processual Civil pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e cursando Master Business Administration Gestão e Business Law pela Fundação Getúlio Vargas.

26 de abril de 2022, 13h09

A judicialização de temas atinentes aos deveres e obrigações dos planos de saúde sofreram um grande aumento nos últimos tempos. Em que pese tais questões serem de competência da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), muitos debates acabam sendo submetidos ao Poder Judiciário diante das diversas interpretações que um mesmo tema pode carregar.

E, mesmo com a atuação judicial, diversas temáticas seguem sem um desfecho uníssono, sendo muitas vezes necessária a afetação de recursos especiais para que a controvérsia seja resolvida pelo rito dos repetitivos.

Nessa toada, observamos que em março de 2022, os ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), deram continuidade ao julgamento do Tema Repetitivo nº 1.016. Referido Tema discute sobre a validade do reajuste por faixa etária em planos de saúde coletivos.

Em novembro de 2021, momento em que se iniciou o julgamento do Repetitivo, o ministro Relator Paulo de Tarso Sanseverino entendeu pela validade do reajuste na forma pretendida pelas operadoras de saúde, condicionando-o à uma prévia estipulação contratual e, também, à observância das normas da ANS.

A complexidade acerca da definição do Tema se fez notória quando, com incertezas a respeito da matéria, os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Nancy Andrighi solicitaram a suspensão do julgamento para a apuração de eventual abusividade.

Com a retomada do julgamento, firmou-se o precedente de aceitação quanto à aplicação do reajuste por faixa etária pelas operadoras de saúde, desde que respeitada a previsão contratual, as normas vigentes definidas pela ANS e, ainda, que os percentuais aplicados não fossem desarrazoados.

A controvérsia se limitou aos planos coletivos novos ou aos adaptados à Lei nº 9.656/1998. Isso porque, em 2016, o mesmo assunto já havia sido definido quando do julgamento do Tema 952, contudo, o debate compreendia apenas os planos individuais ou familiares.

Com a concessão da aplicação do reajuste por faixa etária aos planos individuais, as operadoras de saúde passaram a requerer a extensão do Tema 952 para os planos coletivos, o que culminou no Tema 1.016. No entanto, o restante do debate que fomentava o recurso responsável pelo julgamento do aludido Tema, que tratava sobre o ônus da prova da base atuarial do reajuste, foi retirado do Repetitivo.

Isso porque, em que pese o ministro relator ter defendido imputar às operadoras o ônus de comprovar a utilização de uma base atuarial idônea para a apuração do reajuste por faixa etária, a maioria dos ministros entendeu pela retirada do Tema, sob a premissa de inexistir um grande número de recursos sobre ele capaz de justificar sua análise como repetitivo.

Não resta dúvida de que as questões envolvendo planos de saúde acabam dividindo opiniões até mesmo entre os julgadores.

A exemplo disso, outro assunto de destaque e sobre o qual também não há consenso no Judiciário é a discussão acerca da taxatividade, ou não, do rol de coberturas obrigatórias, por força da Lei nº 9.961/2000.

A confusão é tanta que, apesar do entendimento sobre a lista de cobertura obrigatória para planos de saúde ter sido definida como exemplificativa pela 3ª Turma do STJ, ao final de 2019, a 4ª Turma, indo na contramão do entendimento jurisprudencial até então adotado, passou a julgar pela taxatividade do rol.

Agora caberá à Segunda Seção do STJ, no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial — EREsp 1.886.929 e 1.889.704, pacificar os entendimentos divergentes das turmas.

O julgamento já conta com o voto do ministro relator Luis Felipe Salomão, que considerou o rol como taxativo. Defendeu em sua tese que, por se tratar de saúde privada, não deve haver diferenciação entre os participantes para que não haja desequilíbrio contratual.

Em contrapartida, a ministra Nancy Andrighi, em voto-vista, considerou o rol exemplificativo, argumentando que "A obrigatoriedade das terapias que estão ali dispostas advém da identificação técnica feita pelo profissional da saúde, no entendimento de que tal terapia é necessária".

Ainda, em defesa aos direitos consumeristas, a ministra ressaltou o fato de não ser correto imputar aos consumidores a responsabilidade pelo conhecimento de todos os procedimentos incluídos, ou não, no rol da ANS.

No decorrer da sessão, o julgamento que já havia sido adiado anteriormente, voltou a ser suspenso após o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva pedir vista dos autos.

A possibilidade de prevalecer um precedente que entenda pela taxatividade do rol causou uma grande comoção popular, diante do forte impacto que tal decisão poderá acarretar aos consumidores.

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