Opinião

Dados de localização do celular do trabalhador são usados como prova

Autor

  • Célio Horst Waldraff

    é mestre e doutor pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) mestre pela Universidad Internacional de Andalucia na Espanha pós-doutorado pela Universitat degli Studi di Firenzina Itália professor de Direito Processual do Trabalho da UFPR e desembargador do Tribunal do Trabalho do Paraná.

19 de abril de 2022, 20h09

Em mandado de segurança julgado em Santa Catarina foram aceitos os dados de geolocalização do celular de uma bancária para confirmar, por amostragem, a jornada de trabalho das suas folhas de ponto.

O TRT-12 afastou o inconveniente da violação de intimidade, alvo do MS. Só se pesquisa a localização do celular, excluindo áudios ou vídeos, inúteis para a ação trabalhista, onde não se brinca de 007 ou X9. Também considerou-se que não há violação da Lei Geral de Proteção de Dados.

Eis uma inovação na busca da verdade real no processo.

Se alguém imagina que esses dados do celular já não são escarafunchados por terceiros, convenhamos, é ingenuidade. Por outro lado, a investigação dos horários de trabalho torna a sala de audiências da Justiça do Trabalho uma agonia, do qual não poucos fogem como "Belial de um banho bento".

Além disso, é claro que a apuração da jornada pela prova oral nada mais é que uma média aproximada, porque os registros escritos não existem ou são fraudulentos.

Se esse "segredo de polichinelo" de que dados de nossos celulares são acessíveis, não há porque não os usar judicialmente, dentro dos limites civilizados  evidentemente.

É até curioso que não se utilizem também outros meios tecnológicos correlatos para os horários como fez o banco nesse caso. Um exemplo: vídeos de segurança da agência, para apurar, também por amostragem, os horários de entrada e saída do empregado na agência, comparando-os com a média da jornada dos depoimentos.

Temos então a segurança de uma prova documental produzida legitimamente em juízo figurando como mais uma arma da jurisdição lutando pela "verdade real". Diz o brocardo latino, "res ipsa, verba volens" (as palavras voam, as coisas permanecem).

Pode ser uma solução singela e barata, para um mitigar o problema complicado. Até reconheço que para todo problema complexo, aparece uma solução simples… e errada (em frase atribuída a Churchill).

"Esticando a corda" e sendo mais ambicioso, toquemos no delicado assunto da prevenção do ilícito trabalhista. Segundo Dinamarco, Cintra e Grinover ("Teoria Geral do Processo"), o escopo social da jurisdição é "pacificar com justiça". A forma mais qualificada dessa pacificação é impedir, evitar, prevenir, inibir que o Direito seja violado.

Essa linha emana da chamada Teoria Geral da Prevenção oriunda do Código de Defesa do Consumidor  artigo 6º, inciso IV, que afirma ser direito do consumidor não só a reparação dos danos, mas a sua prevenção  e do Direito Ambiental  onde o dano à natureza é quase sempre irreparável.

Trata-se então do acesso à ordem jurídica justa em plenitude, o que significa, no caso das horas extras, que elas não sejam praticadas ou que sejam pagas regularmente, independentemente de ação trabalhista.

Não há nenhuma arbitrariedade nisso. Os dados são plenamente acessíveis e foi a mesma perplexidade quando se implantou a penhora online. O sistema financeiro já usava. O que fez o Judiciário foi aceder a informações já disponíveis por meio do BacenJud.

Einstein dizia que o irracional é fazer sempre a mesma coisa, esperando resultados diferentes. Nessa linha, ultimamente, vamos "secando gelo" e a pedra de Sísifo continua a rolar.

Autores

  • é mestre e doutor em Direito pela UFPR e juiz do Tribunal do Trabalho do Paraná. Autor do livro “O Tratamento Jurídico do Empregador Insolvente e a (Nova) Lei de Falência”, Ed. Gênesis.

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