Opinião

Cyberloafing: como uso de celular no trabalho pode afetar patrão e empregados

Autor

  • Mirella Pedrol Franco

    é advogada e coordenadora da área trabalhista no Granito Boneli e Andery Advogados (GBA Advogados Associados) pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e auditora líder pela Q Academy: Sistema de Gestão de Compliance Sistema de Gestão Antissuborno e Anticorrupção.

15 de abril de 2022, 7h03

Estamos vivendo em meio a um caos. Um caos que tem nome. Aliás, três nomes: Cyberloafing (vadiagem cibernética), Goldbricking (tijolo coberto de ouro) e Cyberslacking (fuga do dever ou do trabalho). Os três servem para definir colaboradores que acessam excessivamente a internet e as redes sociais durante o horário de trabalho, deixando que essas ações interfiram diretamente na sua eficiência e produtividade.

Cada vez mais presente nos processos produtivos e na vida das pessoas, a tecnologia se tornou um desafio para as empresas e gestores e tem afetado empregados e empregadores. Se, por um lado, os avanços tecnológicos nos processos produtivos passaram a exigir cada vez mais profissionais polivalentes e altamente especializados, o que gerou uma expectativa por produtividade e dedicação, de outro, muitos empregados têm praticado o cyberloafing, ou seja, utilizar a tecnologia durante o expediente para questões pessoais, afetando seu rendimento e causando ineficiência.

Por isso, muitas empresas já traçam estratégias para combater a prática, fazendo desde um acompanhamento com softwares especializados aos cyberloafers (a denominada cyberveillance) até a instalação de servidores proxy, restringindo a possibilidade de uso da internet no ambiente de trabalho.

Ocorre que esse fenômeno ultrapassou a esfera corporativa, chegando à Justiça do Trabalho, que, nesse contexto, deixou claro que está à favor das empresas que possuem, por exemplo, normas limitando o uso do celular por seus funcionários. Decisões do Tribunal Superior do Trabalho e de tribunais regionais consideraram válida a demissão por justa causa de empregados pelo uso excessivo de internet para fins pessoais. A fundamentação é simples: o funcionário está direcionando seu tempo para realizar atividades diversas para as quais foi contratado e devidamente remunerado.

No Paraná, a 6ª turma do TRT-9 considerou lícita a proibição do uso do celular privado no ambiente de trabalho. Conforme a decisão, esse tipo de regra está dentro do poder diretivo do empregador e é evidente que, enquanto utiliza o celular, está deixando de trabalhar, ou seja, direcionando seu tempo em atividades distintas daquela para a qual é pago.

O TST julgou um caso de um operador de telemarketing que levou o seu celular para a mesa de trabalho, o que era proibido pelas normas da empresa. A 6ª Turma concluiu que, diante da situação descrita, ficou comprovado o ato de insubordinação e indisciplina. No mesmo sentido, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), por unanimidade, manteve a demissão por justa causa de um segurança que também descumpriu as regras da empresa ao usar o celular durante o horário de trabalho.

Assim, a orientação primordial às empresas é que suas normas e regimentos internos sejam sempre claros em relação ao uso de aparelhos móveis e alinhados com as regras da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), ressaltando que não se pode fazer fotos ou vídeo no ambiente de trabalho com o celular sem que haja autorização da própria empresa e dos outros colaboradores.

Importante salientar que o mercado tem mudado sua cultura, valorizando cada vez mais a produtividade, proatividade, novas ideias, pessoas que tragam impactos positivos e tenham sinergia com a empresa, e não mais em busca de horas trabalhadas.

O uso de celular de forma indevida também tem gerado condenações para algumas companhias. Em março, por exemplo, o TRT de São Paulo condenou uma empresa do segmento de seguro de vida a pagar R$ 15 mil de indenização por danos morais a uma colaboradora. O motivo foi o recebimento de mensagens de cunho sexista e palavras de baixo calão em um grupo de WhatsApp criado para trocar informações de trabalho.

Ainda que não tenha sido criado pela firma, a Justiça manteve a sentença, pois um supervisor direto participava do grupo. Assim, o desembargador-relator do caso, Marcos Cesar Amador Alves, após verificar que diversas dessas mensagens humilhantes e vexatórias às quais a trabalhadora foi submetida ao longo do pacto laboral partiram do supervisor, condenou a empresa. E não só: ainda reconheceu o vínculo de emprego e a rescisão indireta (justa causa aplicada à companhia) da colaboradora.

Esse é mais um exemplo de que, cada vez mais, as empresas devem se atentar às novas tecnologias e investir fortemente em políticas internas, treinamento de gestores e compliance, sendo essencial a atuação preventiva sinérgica entre jurídico e os gestores corporativos.

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