Opinião

Cuidados que as OSCs devem observar na captação de recurso

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12 de abril de 2022, 6h32

Nos últimos dias, temos visto a grande repercussão no noticiário nacional, sob o enfoque penal, dos sorteios de carro de luxos conduzidos por um famoso youtuber. Isso porque, de acordo com a Polícia Civil, haveria suspeita de lavagem de dinheiro e exploração de jogo de azar.  Sabemos que os sorteios são utilizados, recorrentemente, nas redes sociais, pois devido ao impulsionamento existente, não é raro ver influenciadores digitais e alguns artistas utilizando-se do grande alcance nas plataformas para obter engajamento para promoção dos sorteios. A partir de uma pesquisa simples nas principais mídias sociais, percebemos que a prática contempla uma gama de sorteios que vão desde livros, passando por celulares, viagens e até mesmo veículos de luxo.

Nessa altura, alguns leitores estão perguntando: "Mas o que esse cenário tem a ver com o Terceiro Setor?" Já outros começaram a pensar: "Então que dizer que eu não posso mais rifar um carro para angariar recursos para as minhas obras sociais?" A  resposta a essas duas inquietações é o que pretendemos expor neste artigo, a fim de trazer segurança jurídica às ações  adotadas pelas Organizações da Sociedade Civil (OSCs).

Sabemos que no Terceiro Setor esse assunto ronda diariamente as OSCs, isso porque sorteios, rifas, e afins são estratégias comuns para a captação de recursos. O aumento dessas atividades nas redes sociais fomentam o interesse da diretoria ou equipe de captação da OSC em realizar tais operações, uma vez que são amplamente divulgadas nas redes sociais.

Ocorre que devemos estar atentos ao adotar essa estratégia, pois, como estamos vendo nos noticiários, a realização de um sorteio não depende da liberalidade única e exclusiva da parte promotora da ação. Isso porque, há que se observar, estritamente, o regramento estabelecido no ordenamento jurídico, a fim de afastar conduta enquadrada como contravenção penal, cuja a pena pode chegar até dois anos de prisão. Além disso, a distribuição gratuita de prêmios sem autorização ou ao arrepio da norma que regula o assunto fica sujeita, separada ou cumulativamente, às seguintes sanções, dependendo da infração:

– Cassação da autorização;
– Proibição de realizar distribuição gratuita de prêmios pelo prazo de até dois anos;
– Multa de até cem por cento do valor total dos prêmios.

Portanto, é indispensável a autorização prévia do poder público para a realização de sorteios e afins, conforme previsto na Lei nº 5.768/1971 e Portaria nº 20.749/2020 do Subsecretário de Prêmios e Sorteios, ligado ao Ministério da Economia.

Para a distribuição de prêmios, sorteio, vale-brinde, concurso ou afins, a OSC deverá possuir, entre os seus objetivos sociais, pelo menos UMA das finalidades elencadas no artigo 4º, §1º-A da Lei nº 5.768/71, que guardam relação com o interesse público. Por sua vez, o pedido de autorização deve ser formulado à Secap/ME por meio do Sistema de Controle de Promoção Comercial (SCPC), no endereço scpc.sefel.fazenda.gov.br, antes da data de realização da operação, acompanhado do comprovante de pagamento da taxa de fiscalização, recolhida por meio de Guia de Recolhimento da União — GRU (UG 170592, Gestão 00001, Cod. 10033-1), que varia de R$ 27 a R$ 66.667, a depender do valor do prêmio, conforme tabela do artigo 50 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001.

É visível que a legislação no afã de combater a lavagem de dinheiro é mais um exemplo de norma que não leva em consideração as peculiaridades do Terceiro Setor, impondo caminho oneroso para uma operação que muitas vezes é realizada para custear despesas emergenciais ou de manutenção das OSCs. No entanto, ainda que seja válida a crítica e o nosso inconformismo com a norma, é dever a adequação dessa estratégia de captação de recursos aos marcos normativos e procedimentos apresentados nesta reflexão.

Autores

  • é advogada da Covac Sociedade de Advogados, com atuação no Terceiro Setor, mestre em Democracia e Bom Governo pela Universidade de Salamanca (Espanha), pós-graduada em Organizações da Sociedade Civil (Flacso Argentina – EAD) e ex-secretária-geral da Comissão de Direito do Terceiro Setor OAB DF.

  • é graduando em Direito pela Universidade de Brasília, estagiário na Covac Sociedade de Advogados e coordenador/educador social voluntário na Rede Emancipa, movimento nacional de educação com foco em cursinhos populares pré-universitários.

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