Opinião

Máscaras no ambiente de trabalho: obrigatoriedade ou mera faculdade?

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6 de abril de 2022, 16h04

Com a flexibilização das regras por parte dos municípios em relação ao uso de máscaras em ambientes abertos e fechados, uma polêmica restou instaurada a respeito da obrigatoriedade ou não do uso de máscaras no ambiente do trabalho. Em que pese estarem os governos estaduais e municipais liberando o uso de máscaras em razão da redução de casos de Covid-19, permanece vigente parte da Lei nº 13.979/20, que trata das medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do coronavírus.

A vigência originária dessa norma estava vinculada a 31 de dezembro de 2020 (período do estado de calamidade pública, conforme Decreto Legislativo nº 6/20), mas restou prorrogada em razão da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), na ADI 6625. O julgamento do STF teve como fundamento — para a ampliação da vigência  a aplicação dos princípios da prevenção e da precaução. Isso mantinha as medidas excepcionais abrigadas na Lei nº 13.979/20, para que continuassem, "por enquanto", a integrar o arsenal das autoridades sanitárias no combate à pandemia.

O prestígio às evidências científicas presidiu tal decisão, que reafirmou o disposto no artigo 3º, §1º, da Lei 13.979/20, mesmo preceito legal que estabelece que as medidas de enfrentamento à Covid-19 deveriam "ser limitadas no tempo e no espaço ao mínimo indispensável à promoção e à preservação da saúde pública". Neste sentido, uma das medidas previstas era justamente o uso e o fornecimento de máscaras de proteção individual.

Percebe-se, pois, que ainda que se considere vigente a Lei 13.979/20, as suas próprias normas, somadas à competência concorrente da União, Estados, Distrito Federal e municípios nos assuntos relativos aos cuidados pertinentes à saúde (artigo 23, I, da CF), mostram-se legítimas as decisões administrativas dos entes federados que tenham flexibilizado o uso de máscaras  no caso de terem sido tomadas com base em evidências científicas e estatísticas.

 Além das disposições da Lei nº 13.979/20, a Portaria Conjunta nº 20/20, estabelece em seu item 7.1 que devem ser criados ou revisados os procedimentos de uso, higienização, acondicionamento e descarte dos Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e outros equipamentos de proteção utilizados na organização tendo em vista os riscos gerados pela Covid-19. No item 7.1.1 dessa mesma norma, há previsão para que o empregador oriente o trabalhador sobre o uso, higienização, descarte e substituição das máscaras. Ora, nada mais lógico que se houver redução do risco, seja possível que o empregador revise seus procedimentos e orientações, até mesmo para a inexistência de necessidade de uso de máscara. Se essa for a recomendação ou orientação do serviço de medicina e segurança do trabalho, não há previsão expressa na portaria conjunta sobre a exigência de fornecimento e uso da máscara.

A Portaria Interministerial nº 14/22 reproduz a previsão acima referida nas disposições dos itens 8.1 e 8.1.1 para as relações com empregados em geral. Para as relações com trabalhadores do grupo de risco, nessa segunda portaria há obrigatoriedade de fornecimento aos que possuem 60 anos ou mais ou aos que apresentam condições clínicas de risco para desenvolvimento de complicações da Covid-19. Quanto às disposições do item 8.2 da mesma Portaria Interministerial nº 14/22  no sentido de que máscaras devem ser fornecidas para todos os trabalhadores  há necessidade de interpretação sistemática, considerando as disposições do item 8.1 e em especial do item 8.1.2 da própria regra, que expressamente estabelece que "…máscaras cirúrgicas e de tecido não são consideradas EPI nos termos definidos na Norma Regulamentadora nº 6  Equipamentos de Proteção Individual e não substituem os EPI para proteção respiratória, quando indicado seu uso".

A fonte normativa da proteção está atrelada, fundamentalmente, à Lei nº 13.979/20, cuja aplicação haverá de ser interpretada a partir da noção de cooperação federativa própria das competências concorrentes referidas no artigo 23 da Constituição Federal, de modo a que não se pode desconsiderar as competências dos Estados e dos Municípios no tocante ao enfrentamento do coronavírus. Demais disso, como também antes referido, a própria Lei 13.979/20, em seu artigo 3º, §1º, preceitua que todas as medidas de proteção: a) somente poderão ser determinadas com base em evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em saúde; b) deverão ser limitadas no tempo e no espaço ao mínimo indispensável à promoção e à preservação da saúde pública. Assim, haverão de predominar as normas estaduais e municipais, caso embasadas em evidências científicas e caso se compreenda que a promoção e a preservação da saúde pública não mais exigem o uso de máscaras faciais.

Resta evidenciado, portanto, que não se tratando de EPIs, a competência normativa dos ministérios firmatários da referida Portaria Interministerial nº 14/22 não possui caráter primário, ou seja, assentam-se na competência regulamentar que, por definição, se coloca em posição subalterna às regras contidas em leis em sentido formal, bem como nas normas constitucionais que conferem competência concorrente a todos os Entes Federados.

Assim, diante das disposições das normas antes indicadas, chegamos às seguintes conclusões:

a)   Aos empregados do grupo de risco, permanece a obrigatoriedade de fornecimento de máscaras e consequentemente a exigência de uso;
b)  Aos demais empregados, não há obrigação de uso no ambiente de trabalho, caso seja essa a orientação do departamento de segurança e medicina do trabalho da empresa (Sesmet);
c) Os empregadores podem, ainda, exigir o uso de máscaras em determinados postos de trabalho ou para certas atividades, conforme o nível de exposição, se assim entender necessário o Sesmet ou se mantidas as restrições pela legislação do município;
d)  Os empregados possuem a faculdade de utilizarem ou não as máscaras nos ambientes não exigidos pelo empregador;
e)  Os empregados não podem se negar a utilizar máscaras naqueles ambientes ou nas atividades que for tecnicamente recomendada sua utilização.

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