Opinião

Multidisciplinaridade da LGPD exige cuidados em diversas áreas do Direito

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27 de novembro de 2021, 6h03

A Justiça do Trabalho já está vivendo o aumento dos conflitos trabalhistas que envolvem questões de privacidade e proteção de dados.

Recentemente, uma decisão do TRT de Minas Gerais condenou uma empresa ao pagamento de indenização, em virtude do entendimento de que houve a utilização do telefone pessoal da trabalhadora como contato comercial da empregadora, o que teria causado transtornos à vida privada da profissional.

Os limites entre a vida privada dos trabalhadores e suas atividades de trabalho já não são uma novidade nos processos trabalhistas. Essa linha tênue coloca em debate temas como comportamento em redes sociais, valores e posicionamento social público dos indivíduos, em contraponto aos limites dos controles e interferência dos empregadores. Nesse contexto, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) está impulsionando ainda mais esses assuntos e conflitos.

Temos acompanhado um movimento crescente e exponencial da tecnologia no ambiente de trabalho. O quadro ainda é acentuado pela necessidade de o trabalhador estar cada vez mais conectado, fator que inclusive tomou maiores proporções na pandemia. No entanto, esse comportamento social e de mercado exige uma análise de riscos eficiente, além da observância de limites e o estabelecimento de regras e políticas claras. Além disso, é preciso equilibrar as práticas e comportamentos de ambos os lados (empregado e empregador), para evitar danos, demandas judiciais, administrativas e condenações indesejadas que podem trazer alto impacto financeiro e reputacional.

A adoção pelas empresas de práticas como o BYOD (bring your own device, ou "traga seu próprio dispositivo") é cada vez mais comum. No entanto, essas práticas têm desafiado inclusive os processos de adequação à LGPD, requerendo ações específicas, elaboração e revisão de políticas e dos limites de mitigação de riscos. E isso vale tanto para a segurança da informação e incidentes com dados pessoais que podem ocorrer, quanto para a observância da privacidade dos profissionais envolvidos.

Temos em jogo simultaneamente questões que envolvem Direito Digital, Direito Constitucional e Direito Trabalhista, cenário que reforça a multidisciplinariedade com que as novas tendências de governança, gestão de riscos e compliance devem ser tratadas.

Para mitigar riscos é mandatório que as empresas apliquem esse olhar multidisciplinar para estruturar seus departamentos, políticas e práticas. Para tanto, é preciso estabelecer uma cultura organizacional que garanta a privacidade e a proteção de dados em consonância com direitos trabalhistas e constitucionais, com embasamento inclusive no artigo 49 da LGPD  que trata da tecnologia adequada para manipular com segurança dados pessoais , e nas melhores práticas do mercado, especialmente em segurança da informação, com a referência na ISO 27001.

É imprescindível que as empresas se atentem à extrema importância da transparência, que deve ser observada conjuntamente com a conscientização e treinamento dos colaboradores. Soma-se ao escopo deste trabalho a escuta ativa para evitar conflitos e munir os trabalhadores com informações, instruindo-os para a melhor forma de atuação.

É necessário garantir o "ser e parecer compliance", atuando e mantendo evidências de que é estimulado de maneira clara, objetiva e transparente que as ações e decisões corporativas, bem como os colaboradores, sejam norteados e adotem comportamento adequado e equilibrado entre os direitos individuais e os objetivos empresariais. Essa linha de ação consequentemente estabelece maior controle e conformidade, tornando a empresa mais segura.

Ainda, de acordo com o artigo 41 da LGPD toda empresa precisa ter, obrigatoriamente, um canal de comunicação oficial com o titular do dado pessoal para esclarecimentos e recebimento de requisições. Essa ferramenta poderá ser acionada pelos próprios colaboradores, também enquanto titulares de dados que estão sob o controle de sua empregadora, por isso a empresa deve estar preparada e com fluxos adequados para esse atendimento.

Por mais que a empresa trabalhe na construção de um projeto robusto de adequação à LGPD, nada vai ser suficiente se a cultura não estiver enraizada na operação e no cotidiano da empresa, alinhada ainda com o comportamento dos seus profissionais e baseada em um escopo multidisciplinar.

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