Opinião

Uma reflexão sobre a chegada (ainda que tardia) do 5G ao Brasil

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7 de novembro de 2021, 11h13

Após uma série de ajustes e revisões, a diretoria da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) aprovou o edital e agendou o leilão que define o futuro da implementação da tecnologia 5G no país [1]. O movimento, que se iniciou em 2019, parece próximo de uma definição.

Diferentemente do que pode saltar aos olhos em um primeiro contato, a tecnologia 5G não diz respeito apenas a ferramentas mobile ou conexões mais velozes, como somos induzidos a imaginar frente aos anúncios de operadoras de telefonia móvel em flagrante tentativa de conquistar clientes. O 5G corresponde à quinta geração de tecnologia wireless, um novo conceito de conectividade. Mais importante do que carregar vídeos e arquivos mais rapidamente é o fato de que o tempo que uma mensagem leva a partir do momento em que sai de um ponto até chegar a outro é praticamente reduzido a zero. E isso muda todo o jogo.

A implementação do 5G será marcante para economia global, não apenas pela sua própria evolução, mas por ser o grande catalisador para o desenvolvimento de novas possibilidades e o aperfeiçoamento de tecnologias já existentes. Estamos aqui falando sobre novos paradigmas de relacionamento empresarial. Além dos já conhecidos business to consumer (B2C), business to business (B2B) e de um dos motrizes da economia do compartilhamento, o peer to peer (P2P), o 5G potencializa as relações M2M — machine to machine —, abrindo portas para a consolidação da internet das coisas, por exemplo.

A instantaneidade e a confiabilidade das conexões com o 5G abrem caminho para uma nova era nos negócios brasileiros. E é aqui que percebemos o seu verdadeiro valor. Em estudo próprio, a Oracle ouviu líderes de 265 companhias de médio e grande porte, dos mais diversos setores da economia [2]. Os benefícios listados como insights compreendem o esperado aumento na eficiência com a melhoria na automação e controle de processos, por exemplo, mas também apresentam uma importante tendência: boa parte das empresas buscará novas formas de monetização a partir do 5G, trazendo ganhos multidimensionais ao longo de toda a cadeia de produção e relacionamento com clientes.

Por falar em relacionamento com clientes, recentemente o Facebook anunciou um reposicionamento de marca, como primeiro anunciado pelo The Verge [3]. Uma das razões por trás da movimentação acredita-se serem as apostas da companhia no metaverso [4], que é considerada a nova geração de experiências digitais. Ainda não é possível prever as inúmeras ramificações dessa tecnologia e suas aplicações corporativas, mas certamente facilitará o acesso a ambientes de realidade virtual e realidade aumentada, tornando a experiência de interatividade de clientes com as marcas verdadeiramente imersiva. Fato é que a conectividade do 5G e a sua capacidade de processar grandes arquivos digitais com incrédula rapidez são essenciais para o sucesso da jogada de Zuckerberg.

A instalação desse novo paradigma, é claro, traz consigo uma necessidade de atenção às repercussões legais. Todos esses exemplos representam novas possibilidades de relações entre empresas e entre empresas e consumidores, essencialmente movidas por dados. Falar em automação — ou casas, cidades, indústrias ou fazendas conectadas [5] —, é, necessariamente, falar em um intenso tráfego de informações entre dispositivos, o tempo todo. Verdadeiros oceanos de informações são gerados de forma quase ininterrupta. E, justamente por isso, a segurança dessas informações e a privacidade de usuários são duas das principais preocupações, graças ao potencial de controle e vigilância envolvido [6]. O desafio cresce porque o modelo regulatório atual ainda é dependente de normas complementares, confiando em padrões estabelecidos pelo mercado e suas interpretações aos princípios norteadores emitidos por governos e blocos econômicos. Um caminho que, inegavelmente, incentiva a inovação e reduz custos, mas que deixa o campo jurídico muito mais aberto.

Desse modo, ainda que regulamentações específicas sobre essas novas relações jurídicas cheguem ao país com atraso ainda maior do que a própria tecnologia, isso não deve (e não pode) significar um impedimento às inovações. Cabe a nós a busca atenta por referências, conceitos e marcos jurídicos internacionais capazes de antecipar discussões e promover maior segurança mesmo frente a cenários incertos.

Ao olhar ao nosso redor, o que se vê em movimentos regulatórios são tentativas de conciliar o incentivo à evolução com redução de impactos socioambientais e garantia de transparência. São, esses, três pilares da connectivity toolbox, publicada recentemente, que consiste em um acordo entre os países-membros da União Europeia sobre um conjunto de boas práticas consideradas como as mais eficientes para evoluir na implementação da tecnologia 5G [7]. A medida apresenta uma tendência regulatória baseada em diretrizes gerais e princípios [8]. Com isso, o bloco espera que as empresas naturalmente busquem aplicar as melhores práticas em seus desenvolvimentos, objetivando um acesso facilitado a investimentos e benefícios, em um movimento similar ao que vivenciamos com a introdução das políticas ESG [9] no mercado.

Por todos esses motivos, a chegada, ainda que tardia, da tecnologia 5G no Brasil não precisa significar, necessariamente, que chegar atrasado à festa é algo ruim. Uma certeza fica: o movimento é global. Por isso, é preciso olhar para os próximos capítulos com o otimismo de um copo meio cheio, já carregado com informações valiosas que permitem a antecipação e identificação de oportunidades de negócios.

 


[1] VALENTE, Jonas. Agência Brasil. Anatel aprova leilão da exploração do acesso móvel na tecnologia 5G. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2021-09/anatel-aprova-leilao-da-exploracao-do-acesso-movel-na-tecnologia-5g

[2] 5G Smart Ecosystems are Transforming the Enterprise: Are you ready?. January 2019. Disponível em: https://www.oracle.com/a/ocom/docs/dc/em/5genterprisesurvey20181221v08.pdf

[3] HEATH, Alex. Facebook is planning to rebrand the company with a new name. Disponível em: https://www.theverge.com/2021/10/19/22735612/facebook-change-company-name-metaverse

[4] Apesar de não ser o foco do artigo, é importante pontuar que o metaverso não é um termo ou conceito exatamente novo, e pode ser entendido como uma reprodução digital de espaços interativos e conectados via Internet com o auxílio de tecnologias como a realidade virtual. Mark Zuckerberg se refere ao mesmo como uma internet em que se é possível estar, ao invés de apenas ver.

[5] Referência aos conceitos de smart cities, smart industries e smart farms.

[6] ERTAN, Amy. PERRONE, Christian. Managing 5G Security Challenges: Options for Multistakeholder Governance. Disponível em: https://itsrio.org/wp-content/uploads/2020/07/2020.07.07-Article-Managing-5G-Security-Challenges-Amy-Chris.pdf.

[7] Digital Strategy European Comission. Common Union Toolbox for Connectivity. Disponível em: https://ec.europa.eu/newsroom/dae/document.cfm?doc_id=75185.

[8] Leia-se: em formato similar ao soft law, com textos não equiparados ao Direito hierarquizado, vinculativo e sancionador.

[9] Sigla para Environmental Social and Government, que representam a adoção de melhores práticas ambientais, sociais e de governança pelas empresas.

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