Lenha na fogueira

FGV acusa Transparência Internacional de usar fundação sem consentimento

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16 de março de 2021, 11h22

A Fundação Getúlio Vargas enviou uma notificação à sede da Transparência Internacional, na Alemanha, acusando a seção brasileira de ter usado mão de obra, expertise  e instalações da própria FGV para cumprir um memorando firmado com a "lava jato", mas sem o seu consentimento.

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FGV RioFGV tinha parceria com a Transparência Internacional brasileira, mas diz que foi incluída em acordo sem consentimento

Reinaldo Azevedo, em sua coluna no UOL, reproduz trechos do documento enviado à Alemanha em 31 de janeiro. Nele, a FGV informa que ficou sabendo, por meio de uma notícia da ConJur, sobre um memorando de entendimento firmado entre o Ministério Público Federal e a Transparency International, cujo resultado envolveu quadros e instalações da FGV, mas sem a autorização da instituição.

Um dos resultados do memorando foi o estudo "Governança de estudos compensatórios em casos de corrupção", no qual um dos professores da entidade, Michel Freitas Mohallem, foi indicado na fica catalográfica como coautor, mas sem o conhecimento da FGV.

Além disso, prossegue a instituição, houve "utilização das instalações da FGV para a realização de entrevista, sendo que a Fundação não foi consultada sobre uso de espaço seu para tal finalidade e, portanto, não o autorizou".

Contexto
No documento enviado à Alemanha, a FGV esclarece que firmou um memorando de entendimentos com a TI em 2016, formalizando sua participação no Centro de Conhecimento Anticorrupção, e que em 2017 foi firmado um acordo geral com a seção brasileira para cooperação técnica, para viabilizar "uma variedade de Projetos de Pesquisa Aplicada dentro da temática de combate à corrupção, promoção e compliance nos setores público e privado e avanço de práticas de transparência".

Esse acordo, segue a FGV, previa que cada projeto de pesquisa seria objeto de um termo aditivo específico — o que efetivamente ocorreu. Em julho de 2017 foi firmado o 1º termo aditivo; em agosto, o 2º, e as pesquisas respectivas foram feitas.

Em julho de 2019, seria assinado o 3º termo aditivo, prevendo um projeto conjunto chamado "Lava jato global: lições para o combate à corrupção". No entanto, a TI brasileira notificou a FGV pedindo esclarecimentos sobre investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro. A FGV diz que prestou informações sobre todas as investigações e processos judiciais e administrativos contra pessoas físicas e jurídicas relacionadas à instituição, mas mesmo assim a Transparência Internacional rompeu unilateralmente as relações entre as instituições.

Só quando a ConJur noticiou a tentativa da TI de criar uma fundação para gerir dinheiro das empresas acusadas pela "lava jato" foi que a FGV tomou conhecimento sobre memorando de entendimento entre o MPF e a ONG, representada por Bruno Brandão, em dezembro de 2017, que incluía a J&F Investimentos. Além de prever a criação de uma fundação, o acordo também deveria resultar na produção de um estudo, o que foi levado a cabo.

Esse memorando, portanto, valeu enquanto ainda estava ativa a parceria entre a FGV e a TI Brasil, mas não contou com a participação da FGV. O problema é que há várias referências ao uso de instalações e pessoal da fundação para a produção do estudo que não passaram pela FGV, e deveriam ter passado, pois isso estava previsto pelo acordo geral, ainda vigente na época.

O texto de Reinaldo Azevedo tem um resumo do caso, feito pela própria FGV para a Transparência Internacional na Alemanha:

(i) a FGV não foi consultada sobre o eventual interesse em participar ou não (ii) a FGV não recebeu qualquer solicitação formal para autorizar a participação de um de seus professores de tempo integral na coautoria do Estudo encomendado pelo MPF; (iii) a FGV não autorizou a utilização das suas instalações para a realização de qualquer atividade relacionada, direta ou indiretamente, ao Estudo; (iv) a TI não firmou com a FGV qualquer Termo Aditivo para participação desta última no projeto objeto do MOU assinado entre a TI e o MPF, o que era exigido por força do Acordo Geral firmado.

"Parece-nos, mais do que descortês, grave o fato de a TI-B se (i) apresentar como expert em determinada área do conhecimento, (ii) ser contratada por órgão estatal para a realização de estudos e, ato seguinte, (iii) promover os estudos a partir e com a coautoria com professor dos quadros da FGV, tudo sem conhecimento ou autorização expressa da Fundação Getúlio Vargas, quando o próprio Acordo Geral firmado entre TI e FGV exigia formalização de Termo aditivo a cada novo projeto a ser desenvolvido pelas duas instituições", afirmou a FGV.

Fundo do poço
Em parceria com a Transparência Internacional, procuradores do Distrito Federal assinaram em 2017 um memorando que integrava as autodenominadas operações greenfield, sepsis, cui bono e carne fraca — que atingiram a holding J&F e levaram os executivos do grupo a fazer um acordo de delação e a leniência para a empresa.

Havia a pretensão de destinar parte dos recursos desse acordo, no valor total de R$ 10,3 bilhões, para um projeto de investimento na prevenção e no "controle social da corrupção". Custo dessa "campanha educativa": R$ 2,3 bilhões.  

O acordo firmado pelos procuradores do consórcio da capital federal previa que a ONG Transparência Internacional colaborasse com o desenho e a estruturação do sistema de governança e fundação de uma entidade "para atender a imposição de investimentos sociais" das obrigações impostas à J&F.

Tal parceria é uma espécie de "clone" da fundação que seria criada pelos procuradores de Curitiba com recursos da estatal de petróleo.

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