Opinião

As implicações do home office no pós-Covid-19

Autores

  • João Ubirajara Santana Junior

    é advogado atuante na área trabalhista e sócio da Advocacia Castro Neves Dal Mas coordenando a Unidade de Campinas possui especialização em Direito e Processo do Trabalho pela PUC Campinas e atualmente MBA em Gestão e Business pela FGV.

  • Igor Sa Gille Wolkoff

    é advogado atuante nas áreas trabalhista e empresarial e sócio da Advocacia Castro Neves Dal Mas coordenando a Unidade de Campinas possui especialização em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Cândido Mendes e MBA em Direito Empresarial pela FGV

8 de março de 2021, 10h37

Em razão da rápida escalada da pandemia da Covid-19, governos se viram obrigados a flexibilizar a legislação vigente e a implementar medidas eficientes, objetivando o estímulo à economia para mitigar os sérios impactos decorrentes da queda de produção e consumo, assim como fechamento de postos de trabalho provocado pelo necessário isolamento e distanciamento social.

Igualmente, empregadores se viram em um cenário que os obrigou a repensar seus modelos de trabalho para a manutenção de suas atividades, mas sem deixar de lado a saúde e o bem-estar de seus funcionários, sendo o teletrabalho e o home office, quando possíveis pela atividade desenvolvida, alternativas que ganharam adeptos até então relutantes a tais modelos.

Em que pese serem modelos muito semelhantes, na prática o teletrabalho e o home office são institutos distintos, possuindo características próprias.

A Consolidação das Leis do Trabalho não trazia em seu teor qualquer distinção entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador ou o trabalho realizado à distância, sendo que a reforma trabalhista (Lei 13.467/2017) apresenta em seu texto a normatização do teletrabalho, através dos artigos 75-A ao 75-E (da CLT).

Assim, segundo artigo 75-B, da CLT, teletrabalho consiste na "(…) prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com utilização de tecnologias de informação e comunicação que, por sua natureza, não se constituíam como trabalho externo".           

O teletrabalho pode ser exercido mediante previsão contratual ou adendo, ambos prevendo necessariamente de forma escrita e expressa a responsabilização pela estrutura de trabalho, nos termos do artigo 75-D [1] da CLT, seja da residência do empregado, seja de qualquer lugar que melhor lhe convir, sendo, contudo, realizado preponderantemente fora das dependências do empregador, cabendo destacar que eventual comparecimento do empregado nas dependências do empregador para a realização de tarefas específicas não descaracteriza o teletrabalho.

Em referida modalidade não se verifica o controle de jornada realizada pelo empregado, não tendo, assim, o empregado direito ao percebimento de horas extras, salvo em se comprovado efetivo controle e fiscalização da jornada pelo empregador.

Assim, indubitável que a principal característica do teletrabalho é a utilização de meios tecnológicos que possibilitem o desenvolvimento da atividade.

Diferentemente do teletrabalho, o home office pode ser conceituado como a atividade laboral realizada de forma remota por determinado período de tempo, ou ainda de forma eventual, não sendo, contudo, obrigatório que se desenvolva na residência do empregado, dispensando ainda expressa menção em contrato de trabalho, regulando-se por política interna do empregador.

Nada obstante não haver legislação específica acerca do home office, o trabalhador nesta modalidade experimenta dos mesmos direitos trabalhistas daquele que exerce suas atividades de forma presencial, sendo assim necessária a instituição de meio fidedigno de controle de jornada, em atenção ao artigo 6º da CLT.

Assim é que a atividade laboral na modalidade home office pode se utilizar de meios tecnológicos, porém, essa característica, atrelada à não eventualidade, não se tratando de hipótese de trabalho externo, pode ser caracterizada como teletrabalho.

O home office, em que pese a sua aplicação imposta pelo momento atual, haja vista o necessário distanciamento e isolamento nesta pandemia, tem se mostrado uma medida de redução de despesas aos empregadores, bem como a melhora da qualidade de vida dos empregados, apontando, assim, aspectos positivos e negativos da pandemia da Covid-19.

Algumas nuances sobre o tema são pertinentes no intuito de se decidir pela melhor forma de aplicação do home office.

Nos termos do previsto no artigo 2º da CLT, o qual prevê o princípio da alteridade, compete ao empregador o ônus do negócio, devendo este custear as despesas provenientes .

Neste período de pandemia, em que pese o aparente caráter temporário das atividades em home office, supostamente até que seja finalizada a vacinação em massa da população, os empregadores que o instituíram vislumbram a viabilidade do home office, mas também a necessidade de retorno às atividades presenciais.

As despesas operacionais com a aplicação do home office foram drasticamente reduzidas, como consumo de energia elétrica e água, telefonia fixa, móvel e internet, serviços de segurança, limpeza etc., mobiliário e equipamentos de escritório, custos com a locomoção dos empregados, custos com alimentação, vestuário.

Igualmente, aos empregados verificou-se a melhora na qualidade de vida, possibilitando um maior convívio familiar, alimentação saudável etc.

Alguns empregadores já decretaram, inclusive, a instituição permanente do home office, mesmo com os esforços e planejamentos governamentais para um retorno gradativo das atividades.

Nessa seara, além desses pontos relevantes destacados, quais sejam, a previsão contida no artigo 2º da CLT e o caráter não transitório que os empregadores tem atribuído ao home office, necessário se faz enfatizar ainda a responsabilidade do empregador no que diz respeito a NR17 — Ergonomia, notadamente em seu item 17.1.2 [2], o qual refere-se em específico à ergonomia no ambiente de trabalho.

Assim, uma vez que o home office está sendo aplicado como alternativa ao necessário distanciamento e isolamento social, deixando, portanto, de ter seu caráter eventual, recai sobre o empregador a obrigação de proporcionar todos os subsídios possíveis para se evitar a ocorrências de infortúnios/acidentes/doenças ocupacionais, sob o risco de serem demandados na Justiça do Trabalho. Nesse trilhar, se recai sobre o empregador tal incumbência, recai igualmente o ônus sobre os subsídios necessários para o trabalho, ainda que realizado de forma remota.

Com a Lei 13.467/2017, surgiu o artigo 75-E, que diz que "o empregador deverá instruir os empregados de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho", restando patente que, apesar das dificuldades, incumbe ao empregador a responsabilidade pelo adequado ambiente de trabalho, ainda que em teletrabalho/home office, a teor do já exposto no artigo 7º, inciso XXII [3], da CRFB e artigo 157 [4] da CLT.

Outro ponto de extrema relevância ao assunto é o fato de ser o home office apresentado como uma opção ao empregado, sendo-lhe ainda mantida a possibilidade de trabalho presencial nas dependências da empresa, ou se a modalidade home office se tornará a única realidade experimentada pelo empregado.

No caso da primeira hipótese, uma vez que não há redução de custos pelo empregador, havendo a possibilidade do trabalho nas dependências deste, não há, em tese, obrigatoriedade de arcar com custos de estrutura/ferramentas de trabalho.

Já na segunda situação, instituído de forma compulsória, como política de redução de custos, deixando de oferecer sua estrutura, ainda que de forma parcial (alguns dias na semana), tende a ser responsável pelos custos com ferramentas de trabalho (celular, notebook etc.), nos termos da previsão do artigo 2º da CLT.

Nesse trilhar, levando-se em consideração a importância do empregador em prezar pela ergonomia e condições favoráveis ao exercício das atividades laborais por seus empregados, não restam dúvidas de que a pandemia trouxe uma nova realidade, obrigando aos empregadores uma nova visão estratégica de seus negócios, sendo a aplicação do teletrabalho, como gênero, e home office, como espécie, as opções mais acertadas, remanescendo discussão acerca da responsabilidade pelos custos experimentados pelo empregado para o exercício de suas atividades fora do estabelecimento do empregador e seus limites.

Diante dos esclarecimentos e elementos acima, em especial pela previsão contida no artigo 2º da CLT, no artigo 75-E da CLT, na Lei 13.467/017, NR 17 e Lei 8.213/91, e, levando-se em consideração a analogia à legislação vigente acerca do teletrabalho, o raciocínio lógico pende para a obrigatoriedade pelo fornecimento, manutenção e troca de todo equipamento que possa ser considerado como ferramenta essencial para o trabalho ao empregado.

 

[1] "As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito".

[2] "Avaliar a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, cabe ao empregador realizar a análise ergonômica do trabalho, devendo a mesma abordar, no mínimo, as condições de trabalho, conforme estabelecido na própria Norma Regulamentadora".

[3] "São direitos dos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança"

[4] "Artigo 157 — Cabe às empresas: I – cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho II – instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais".   

Autores

  • é advogado atuante na área trabalhista e sócio da Advocacia Castro Neves Dal Mas coordenando a Unidade de Campinas, possui especialização em Direito e Processo do Trabalho pela PUC Campinas e atualmente MBA em Gestão e Business pela FGV.

  • é advogado atuante nas áreas trabalhista e empresarial e sócio da Advocacia Castro Neves Dal Mas coordenando a Unidade de Campinas. Possui especialização em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Cândido Mendes e MBA em Direito Empresarial pela FGV.

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