No dia 25 de janeiro, o Brasil publicou a Portaria nº 652/2021 para tratar da restri
O próprio Brasil também tem sido alvo de medidas semelhantes em outras nações. Em razão do descontrole da doença em nosso território e das mutações identificadas no Amazonas, o ingresso de brasileiros está proibido em ao menos 30 países.
Apesar disso, não há consenso entre pesquisadores sobre a eficácia sanitária dessas
Se a eficácia das medidas é ponto controverso, o agravamento das situações dramáticas de alguns imigrantes não é, especialmente quanto aos refugiados, categoria especial de imigrantes que se caracterizam pela impossibilidade de permanecer em seus países de origem em razão de perseguições injustas ou de graves e generalizadas violações de direitos humanos. Nesses casos, migrar é uma necessidade. Por isso, o Direito Internacional estabeleceu regras especiais para a proteção dessas pessoas, tendo como pilar básico o princípio do non-refoulement: a proibição da devolução do refugiado a um país onde possa estar em risco.
Mas as restrições implementadas pelo governo brasileiro não atentam à peculiar situação dos refugiados. Ao contrário: discriminam venezuelanos, violam a Constituição Federal e contrariam disposições expressas de textos legais acerca da temática.
A Portaria nº 652/2021 segue restringindo a entrada de indivíduos não nacionais por meios terrestres ou pelo transporte aquaviário, com algumas poucas exceções. Nenhuma delas, contudo, aplica-se aos venezuelanos, cujo ingresso no país está proibido desde o início da pandemia.
Desde 2018, o Brasil tem sido um dos principais destinos da diáspora venezuelana, o maior êxodo latino-americano da história. Mais de 45 mil venezuelanos já foram reconhecidos como refugiados por aqui, em razão das graves violações de direitos humanos em seu país de origem. Outros cem mil aguardam resposta às suas solicitações de refúgio. E os venezuelanos, importante ressaltar, são considerados
Apesar disso, as medidas de restrição de fronteiras implementadas pelo Brasil são especialmente restritivas para os venezuelanos. Ao contrário dos casos do Reino Unido e da África do Sul, sequer há na Venezuela circunstâncias objetivas capazes de justificar a restrição. Trata-se, portanto, de discriminação indevida, que fere o mandamento de igualdade previsto no artigo 5º da Constituição Federal.
Ainda que se afirme que os dados sobre a pandemia na Venezuela não são confiáveis, as sanções previstas na portaria também não condizem com as normas de proteção dos refugiados. Segundo o texto, se alguém tentar entrar no Brasil sem observar as restrições, poderá sofrer com responsabilização civil, administrativa e penal, repatriação ou deportação imediatas e inabilitação de pedido de refúgio. Não obstante, a Lei 9.474/1997 estabelece claramente que o ingresso irregular no território nacional não constitui impedimento para a solicitação de refúgio.
O princípio basilar da dignidade da pessoa humana também veda a expulsão dos venezuelanos e a inabilitação do pedido de refúgio pelo ingresso durante a pandemia. Trata-se, portanto, de mais uma medida do governo federal em descompasso com os direitos humanos e que pode, inclusive, ensejar a responsabilização
A vida em tempos de pandemia é desafiadora para todos. Para alguns, no entanto, o desafio é maior do que para outros. Os refugiados venezuelanos enfrentam, além dos riscos trazidos pela doença, o recrudescimento das medidas restritivas à circulação internacional de pessoas e, no caso brasileiro, a xenofobia numa política oficial, travestida de medida de combate à pandemia.
[1] Conforme SHOI, Shi et.al. Travel restrictions and SARS-CoV-2 transmission: an effective distance approach to estimate impact. Disponível em: https://www.who.int/
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