Opinião

A importância do afeto para o Direito de Família

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1 de fevereiro de 2021, 21h56

Além de abordar aspectos patrimoniais, o Direito de Família é fortemente marcado por controvérsias em que o afeto é o ponto central. Assim, o jurista, mesmo não tendo formação acadêmica no assunto, precisa conhecer alguns aspectos da Psicologia, o que não é tarefa simples. Conceitos como abandono afetivo e parentesco por socioafetividade exigem uma análise mais abrangente, pois estão ligados à família, que é a base da sociedade, e interferem diretamente na vida de crianças e adolescentes.

No tocante ao abandono afetivo, deve-se enfatizar a relevância e representatividade das emoções na construção da personalidade do indivíduo. Algumas discussões trazidas por Vygotsky, psicólogo russo, alinhadas com o pensamento do filósofo holandês Espinosa, destacam o importante papel das emoções nessa construção. É sabido que a afetividade impulsiona indivíduos a se transformarem ou a se capacitarem para as várias nuances da vida em sociedade e auxilia no desenvolvimento de competências pessoais para ações mais efetivas junto as situações diversas.

Tendo em vista que crianças e adolescentes são seres humanos ainda em formação, fica fácil entender os motivos que levaram a Constituição de 1988 a assegurar a eles ampla proteção, instituindo o dever dos pais, da sociedade e do Estado de protegerem esses menores de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

A vinculação afetiva a uma figura, seja materna ou paterna, causa na criança ou no adolescente a sensação de pertencimento, proteção e amor, por isso sua importância. Estudos mostram os impactos negativos à personalidade desses menores quando ocorre o chamado abandono afetivo, que é o comportamento de um ou ambos os genitores de negar ao filho todo o cuidado emocional que ele precisa receber. Trata-se de uma verdadeira violência gerada pelo abandono, uma crueldade em não oferecer afeto.

Entendido como um comportamento omisso, o abandono afetivo é, na prática, uma ação inversa à que se espera justamente de quem deveria garantir a segurança emocional da criança ou do adolescente. Tal conduta, se prejudicar o desenvolvimento psicossocial da vítima, pode dar ensejo à condenação judicial do genitor a prestar uma compensação pelo dano moral causado.

Por outro lado, no parentesco por socioafetividade o viés psicológico tem caráter elogiável, pois a figura de pai ou mãe é reconhecida a uma pessoa que não tem vínculo biológico ou por adoção. Trata-se de aplicação de um entendimento popular de que "pai não é quem gera, mas, sim, quem cria". O laço sanguíneo de um homem ou de uma mulher com sua prole não assegura, por si só, que venha acompanhado de afeto. Age de forma mais relevante na vida dos menores quem efetivamente se comporta como pai ou mãe.

A socioafetividade ocorre, por exemplo, quando um padrasto passa a ver o enteado como um verdadeiro filho, fazendo por este o que se espera de um pai. O vínculo criado é tão forte que é possível que se reconheça juridicamente essa paternidade.

O afeto também está presente em outras situações abarcadas pelo Direito de Família, mas os exemplos apresentados já mostram a amplitude de efeitos que podem ser gerados, como uma condenação por danos morais ou o surgimento de mais uma forma de parentesco. A relevância do maior conhecimento de temas ligados à psicologia é inegável e desafia o jurista a buscar informações até mesmo fora de sua área de formação acadêmica.

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