Opinião

Principais novidades trazidas pela Lei do Superendividamento

Autor

  • Marcos Roberto Hasse

    é proprietário da Hasse Advocacia e Consultoria pós-graduado em Direito Tributário e Processual Tributário pela Universidade da Região de Joinville (Univille) ex-professor na Universidade Regional de Jaraguá do Sul (Unerj) professor na Católica de Santa Catarina e conselheiro OAB-SC.

26 de agosto de 2021, 6h03

Após vários anos de tramitação, em 2 de julho deste ano foi sancionada a Lei nº 14.181, mais conhecida como Lei do Superendividamento.

A referida lei altera o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso, tendo o intuito de aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispõe sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento.

Tal regramento se tornou necessário, com o crescente aumento do endividamento da população com o passar dos anos.

Conforme informações extraídas do SCR (instrumento de registro gerido pelo Banco Central e alimentado mensalmente pelas instituições financeiras) relativas ao período de junho de 2016 a dezembro de 2019, verificou-se que, de um total de 85,3 milhões de consumidores, 4,6 milhões estavam em situação de endividamento de risco no último mês do período de referência. Logo, a nova lei é um avanço na proteção do consumidor.

Mas o que preciso saber sobre essa nova lei?

Aplicação: A lei do superendividamento se aplica a quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada.

No entanto, excluem-se do processo de repactuação as dívidas, ainda que decorrentes de relações de consumo, oriundas de contratos celebrados dolosamente sem o propósito de realizar pagamento, bem como as dívidas provenientes de contratos de crédito com garantia real, de financiamentos imobiliários e de crédito rural.

Público alvo: Pode se beneficiar da referida lei o consumidor pessoa natural, de boa-fé, que tiver a impossibilidade evidente de pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial.

Mínimo existencial: É o conjunto básico de direitos fundamentais que assegura a cada pessoa uma vida digna, como saúde, alimentação e educação. Portanto, aquele que não tenha condições por si só ou por sua família de sustentar-se deverá receber auxílio do Estado e da sociedade.

Prevenção ao superendividamento: A nova lei trouxe alterações ao CDC, no intuito de conscientizar o consumidor brasileiro quanto à saúde financeira. Para tanto:

Estipula que sejam realizadas ações direcionadas à educação financeira e ambiental, assim como, para prevenção e tratamento do superendividamento como forma de evitar a exclusão social do consumidor;

Proíbe propagandas de empréstimos com a promessa de não ser necessária avaliação da situação financeira do consumidor;

Proíbe o assédio ou a pressão sobre consumidor para contratar o fornecimento de produto, serviço ou crédito, principalmente em caso de idosos, analfabetos, doentes ou em estado de vulnerabilidade;

Determina que as instituições e empresas que vendem a prazo informem ao consumidor o custo efetivo total, a taxa mensal efetiva de juros e os encargos por atraso, o total de prestações e o direito de antecipar o pagamento da dívida ou parcelamento sem novos encargos, assim como informar a soma total a pagar, com e sem financiamento;

Acrescentou o parágrafo 3º ao artigo 96 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003), dispondo que "não constitui crime a negativa de crédito motivada por superendividamento do idoso";

Entre outros.

Combate ao superendividamento: Nos casos em que o consumidor já se encontre em situação de superendividamento, a nova lei traz uma série de dispositivos que:

Determina a instituição de mecanismos de prevenção e tratamento extrajudicial e judicial do superendividamento e de proteção do consumidor pessoa natural;

Estabelece a instituição de núcleos de conciliação e mediação de conflitos oriundos de superendividamento;

Estipula que, antes de ir à Justiça, os consumidores terão direito a uma fase de conciliação com os órgãos de defesa do consumidor, como Procon e defensorias públicas. Este atendimento não será obrigatório. Todo e qualquer acordo deverá respeitar o "mínimo existencial".

Torna nula as cláusulas contratuais que estabeleçam prazos de carência em caso de impontualidade, que impeçam o restabelecimento integral dos direitos do consumidor após o adimplemento ou realização de acordo, entre outras.

Se o consumidor contestar compra realizada com cartão de crédito ou similar, a instituição só poderá proceder a cobrança, quando for solucionada a controvérsia;

Entre outros.

Vigência: A lei entrou em vigor em 2 de julho, sendo que a validade dos negócios e demais atos jurídicos de crédito em curso constituídos antes da entrada em vigor obedece ao disposto em lei anterior.

Porém, os efeitos produzidos após a entrada em vigor da lei subordinam-se ao que a mesma dispõe.

Assim, deve-se ter em mente que a Lei do Superendividamento traz vários benefícios ao consumidor, assim como alguns malefícios.

Por um lado, tem o intuito de garantir que os consumidores só efetuem negócios claros, com plena ciência das taxas e juros pagos, assim como ajudar aqueles que já se encontram nessa situação a pagarem seus débitos, sem prejuízo à sua subsistência.

Porém, tal situação provavelmente dificultará que os consumidores adquiram produtos ou serviços a prazo, visto que a tendência é que as empresas realizem uma análise de crédito criteriosa para tanto.

Por fim, a expectativa agora é a criação dos mecanismos e núcleos de conciliação previstos na referida lei, assim como de que forma estes funcionarão de fato.

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