Opinião

A remuneração variável da força de vendas

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5 de agosto de 2021, 15h04

O pagamento de remuneração variável para os empregados que trabalham na força de vendas sempre foi um estímulo para manter uma equipe focada em resultados. Não por outro motivo, diversas empresas nacionais e multinacionais mantêm políticas de remuneração variável agressivas a fim de atrair e manter em seus quadros profissionais de qualidade e com alta capacidade negocial.

Empresas do ramo da tecnologia, por exemplo, razão do crescimento desenfreado da era digital e dos valores de seus produtos e serviços, costumam pagar importâncias vultuosas a título de remuneração variável, sem considerar a controvérsia do tema na esfera trabalhista. Quando se tem profissionais focados em vendas há logo uma presunção equivocada de pagamento de comissões.

Isso porque a Lei nº 3.207/1957, que infelizmente regulamenta de forma muito simplória as atividades dos empregados vendedores, viajantes ou pracistas, dispõe que o empregado vendedor terá direito a comissão combinada sobre as vendas que realizar. O texto dá margem à interpretação de que a venda de produtos ou serviços gera o direito ao recebimento imediato de comissões, quando muitas vezes o pagamento da parcela variável sequer considera uma venda isolada e percentual dos valores negociados.

É nesse cenário que uma política interna clara e objetiva sobre as regras para pagamento de parcela variável é extremamente essencial, notadamente para as multinacionais que utilizam políticas globais. Essas empresas muitas vezes estão em desacordo com a legislação local, sem dúvidas muito mais protetiva quando comparada às de outros países.

A comissão, considerando os termos da lei aqui citada e as disposições celetistas, é salário de forma variável, em que o pagamento ao empregado é feito de acordo com o percentual sobre as vendas estipulado com o empregador conforme determinação no contrato de trabalho ou política interna com regramentos específicos.

O denominado bônus, por sua vez, consiste em espécie de recompensa que a empresa coloca como meta, caso o empregado venha a alcançar certo nível de produção. O pagamento depende, portanto, de desempenho, comportamento ou produtividade individual do empregado, de acordo com os critérios específicos e pontuais estabelecidos, e não das vendas efetuadas dentro da jornada de trabalho cumprida.

Vale dizer que as comissões estão normalmente atreladas à simples venda ou promessa de compra e venda. Trata-se da realização de um negócio, mas cujos detalhes, administração de entrega, renegociações e outros pontos não interferem no percentual de ganho do empregado. O bônus, por outro lado, muitas vezes depende de objetivos financeiros complexos a serem atingidos e que vão além da venda ou promessa de compra e venda, mas de efetivo pagamento pelo cliente, por exemplo, sofrendo impacto de renegociações e descontos futuros, a depender do regramento previsto na política de remuneração variável.

Enquanto os valores de comissões são, portanto, previsíveis em razão da venda efetivada e do percentual ajustado, o valor de bonificação, ainda que considere a venda de produtos e serviços como uma de suas métricas, depende de um conjunto de fatores dentro de um período pré-estabelecido e de aspectos que muitas vezes fogem ao controle do empregado envolvido inicialmente no negócio.

É nesse ponto que a confusão entre comissão e bônus apresenta o maior risco, porque as comissões não admitem, por lei, que o pagamento ao empregado seja impactado por fatores considerados como risco do negócio. Em outras palavras, enquanto para o bônus é permitida a estipulação de regras mais complexas e o recebimento de valores a depender de questões para além do fechamento do negócio, para a comissão esse cenário é bastante limitado.

Assim, uma política que equivocadamente chame de comissão o que em realidade é bônus pode se ver absolutamente descaracterizada na Justiça do Trabalho.

É de suma importância, portanto, ter uma política de remuneração variável elaborada de forma cuidadosa e detalhada, deixando claro que, mesmo em se tratando de força de vendas, a parcela não pode ser confundida com comissões, sob pena de serem desconsiderados os gatilhos que reduziriam ou impediriam o pagamento sob determinados negócios.

Quando se trata de políticas importadas de matrizes estrangeiras, notadamente americana, não é incomum encontrar a tradução equivocada ou mesmo o uso de "comissão" quando não se pretende falar da verba tal qual a nossa Justiça do Trabalho está habituada a analisar, o que acaba atraindo para a política previsões legais específicas que não caberiam à hipótese e que majoram consideravelmente os pagamentos devidos.

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