Opinião

Impactos de IRPJ e CSLL para contribuintes com prejuízos fiscais acumulados

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3 de agosto de 2021, 6h37

Como amplamente divulgado, o Supremo Tribunal Federal decidiu, em março de 2017, favoravelmente aos contribuintes com relação à tese da exclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) (RE nº 574.706-PR), fixando neste ano de 2021 que o ICMS a ser excluído é o destacado. Tais decisões, embora tenham pacificado a "tese do século", acabaram por iniciar uma série de outras questões jurídicas que têm impactos práticos relevantes. Entre elas, destacamos o tratamento a ser dado na apuração do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) quando o crédito assegurado pelo STF for reconhecido pelo contribuinte. Esse impacto na apuração do IRPJ e da CSLL varia de contribuinte para contribuinte em razão de sua opção e situação fiscal, sendo que, para os fins deste artigo, nos preocuparemos com aqueles contribuintes que carregam prejuízo fiscal e base negativa de CSLL acumulados.

Para os referidos contribuintes que historicamente apresentam uma situação deficitária fiscal, o oferecimento à tributação dos valores recuperados da PIS e da Cofins de acordo com a regra geral e usualmente aplicável à apuração do lucro tributável é muito questionável. Isso porque desrespeita principalmente o princípio constitucional da capacidade contributiva, além de não levar em conta a igualdade do ônus efetivo atribuído a tal contribuinte em comparação com os demais, bem como a justiça fiscal que deve permear toda e qualquer relação entre Fisco e contribuinte no contexto de equidade.

O reconhecimento do crédito recuperado corresponde, neste momento, a uma "correção" (ou, melhor dizendo, a uma neutralização) de parte das despesas pretéritas com PIS e com Cofins, agora reconhecidas como indevidas pelo STF. Tais despesas recuperadas, por sua vez, contribuíram, em períodos pretéritos, para formar o saldo acumulado de prejuízo fiscal e de base negativa de CSLL do contribuinte.

Caso, porém, o reconhecimento fiscal desse crédito venha a seguir a regra geral do regime de competência, nos estritos termos da lei e de procedimentos da Receita Federal do Brasil, o valor envolvido representaria uma receita tributável incluída na base do IRPJ e da CSLL neste momento, mas que não seria integralmente neutralizada pelo dito saldo de prejuízo fiscal e de base negativa que ajudaram a formar no passado, em razão da regra de compensação sujeita a trava de 30%. Tal situação levaria o contribuinte, então, a um desequilíbrio financeiro relevante e a um tratamento injusto fiscalmente. Esse tratamento injusto aplicável a contribuintes em situação deficitária fiscal foi confirmado por manifestação recente da Receita Federal do Brasil através da edição da Solução de Consulta nº 92, de 2021.

Todavia, diferentemente da posição fiscal acima, considerando princípios constitucionais tributários e a grande relevância do valor envolvido na recuperação de créditos, especialmente por estes englobarem diversos anos pretéritos, torna-se imprescindível um tratamento excepcional que autorize a recomposição dos saldos de prejuízos fiscais e de bases negativas de CSLL, de forma a neutralizar os impactos financeiros de IRPJ e CSLL decorrentes da recuperação do PIS e da Cofins neste momento. Em outras palavras, nos casos em que a dedução fiscal pretérita de valores indevidos de PIS e Cofins apenas aumentaram saldos de prejuízo fiscal e de base negativa da CSLL, quando do reconhecimento da recuperação do indébito, não deve haver qualquer desembolso financeiro de IRPJ e de CSLL decorrente dessa recuperação, pois tal situação demonstraria oneração relevante diferenciada dos demais contribuintes.

Esse ônus ainda se torna mais injusto quando imaginamos que a efetiva utilização integral dos saldos de prejuízo fiscal e de base negativa da CSLL possa nunca se materializar, de forma a demonstrar que o pagamento do IRPJ e da CSLL, quando do reconhecimento do crédito do PIS e da Cofins, não foi um mero descasamento temporal, mas, sim, um ônus adicional.

Existe ainda um aspecto operacional prático para implementar a ora defendida neutralidade para fins do IRPJ e da CSLL, já que o preenchimento das respectivas obrigações acessória (ECF, e-LALUR etc.) não permitem formalizar tal neutralização. Não cabendo aqui pensar em retificação de obrigações acessórias passadas, seja porque a decisão para a recuperação do crédito se deu neste momento, de forma que as obrigações acessórias pretéritas não merecem reparos, seja porque nem seria possível atingir anos mais antigos (superiores a cinco anos passados).

Assim, tendo em vista a posição da Receita Federal, para tentar alcançar a pretendida neutralidade, caberá ao contribuinte ingressar com uma medida judicial.

Por fim, registramos que o pleito de um tratamento excepcional para o valor do crédito do PIS e da Cofins ora recuperado guarda relação lógica, por exemplo, com o tratamento especial de Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) aplicado a "rendimentos recebidos acumuladamente" (RRA) de previdência complementar e de verbas trabalhistas, para o qual o Judiciário (e depois a própria Receita Federal) reconheceu que era incabível atribuir ônus adicional efetivo para a pessoa física que recebia diferenças de meses passados de forma acumulada (em comparação ao recebimento mês a mês de montante equivalente de tais diferenças).

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