Opinião

A transferência do Estado ao empresário quanto às responsabilidades sociais

Autor

  • Carla Benedetti

    é sócia da Benedetti Advocacia mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP associada ao IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário) coordenadora da pós-graduação em Direito Previdenciário do Estratégia Concursos

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26 de outubro de 2020, 13h34

A alíquota SAT (Seguro de Acidentes de Trabalho) e o GILLRAT (Grau de Risco de Incidências de Incapacidade Laborativa decorrentes dos Riscos Ambientais do Trabalho) apuram as alíquotas de contribuições devidas pelas empresas ao INSS, a depender da atividade econômica desempenhada, e que são, respectivamente, destinadas ao financiamento da aposentadoria especial e dos benefícios por incapacidade decorrentes de acidentes de trabalho e de doenças profissionais.  

A alíquota SAT é definida pela Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), que se orienta conforme o grau de risco de ocorrência de acidentes de trabalho ou doença ocupacional em cada atividade econômica.   

Já o Fator Acidentário de Prevenção (FAP) apresenta um índice, variável entre 0,5 a 2, que, ao ser aplicado pelo GILLRAT, que se pontua como 1%, 2% ou 3%, da tarifação, dado o risco da atividade econômica desempenhada, incidentes sobre a folha de salário das empresas, expressa um valor que tributa em maior quantidade, proporcionalmente, aquele que mais possa ter onerado os cofres da Previdência.  

Em regra, a empresa que não cuida dos empregados e não faz um planejamento e gerenciamento de risco, zelando pelo ambiente de trabalho, para que haja menor número de acidentes de trabalho, deve contribuir em maior medida para a Previdência Social; por outro lado, aquele que demonstra maior cuidado diminui seu passivo previdenciário. 

Embora a equação apresentada pareça adequada, ocorre que muitas empresas são oneradas injustamente, tendo em vista que quando da aplicação do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP), utilizado para se identificar quais doenças e acidentes estão relacionados com a prática de uma determinada atividade profissional, cruzando-se a informação do Código Nacional de Atividade Econômica (CNAE) com o Classificação Internacional da Doença (CID), o nexo estabelecido se mostra equivocado.  

O NTEP torna-se aplicável quando da existência de significância estatística da associação entre CID e CNAE, em se tratando de doenças infecciosas e parasitárias relacionadas com o trabalho. Ocorre que tais associações nem sempre correspondem a um cenário lógico e, nesse contexto, a empresa acaba por assumir uma responsabilidade por um benefício de incapacidade que não possui natureza profissional, e, sim, previdenciária. Tem-se como exemplo o trabalhador da construção civil que, ao desenvolver dependência química pelo uso de álcool, tem-se que o benefício previdenciário é relacionado ao trabalho, por meio da aplicação da NTEP. Todavia, há outras situações ocorridas na vida do trabalhador que podem ter desencadeado a doença, ou esta já estar presente antes mesmo da contratação, para tanto, nem sempre se mostra razoável esse tipo de enquadramento. 

Diante do contexto, por vezes o empresário é onerado de forma injusta pelo Estado, sendo responsabilidade do INSS, e não do empresário, em custear o benefício por incapacidade decorrente das enfermidades apresentadas.

A medicina não é uma ciência exata, e epidemiologicamente nem sempre há nexo causal em tais enquadramentos. Mera presunção de nexo causal, como é realizado no NTEP, não deveria ser aceita, por isso o trabalho do advogado em defender e impugnar valores de FAP que estão onerando em demasia o empresário.  

Ademais, razoável seria que o Estado se obrigasse a apresentar e fornecer provas quanto à ocorrência dos níveis de acidentalidade, não transferindo este ônus ao empregador. E, muito embora o médico perito não esteja obrigado a enquadrar o possível acidente de trabalho ou doença profissional baseado em NTEP, esta, por muitas vezes, acaba por ser a única ferramenta que dispõe para tomada de decisão.   

Infelizmente, não se constata que o emprego do NTEP tenha sido utilizado para cuidar da saúde e da segurança do trabalhador, tendo em vista que é possível se aplicar, por meio de critérios mais individualizados, métodos que seriam mais eficazes quanto a este objetivo. Observa-se, nesse sentido, que o sistema criado pelo Estado possui como intuito aumentar a arrecadação e, dessa forma, transfere-se ao empresário a obrigação quanto ao cumprimento das responsabilidades sociais. 

Autores

  • é advogada, mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP, associada ao IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), coordenadora da pós-graduação em Direito Previdenciário e Direito do Trabalho do IDCC (Instituto de Direito Constitucional e Cidadania) e da pós-graduação em Direito Previdenciário do Estratégia Concursos.

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