Opinião

Às vezes, a melhor defesa das empresas contra o Estado é o contra-ataque

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21 de outubro de 2020, 9h33

A empresa Magazine Luiza está sendo alvo de um processo instaurado pela Defensoria Pública da União, ou seja, pelo Estado, que pede sua condenação em R$ 10 milhões por causa da implementação de um programa de trainee destinado exclusivamente para negros.

O valor foi pedido a título de indenização por danos morais coletivos, pelo que o defensor público classificou como "marketing de lacração", que estaria, na sua interpretação, "violando direitos de milhões de trabalhadores, em função de discriminação por motivo de raça ou cor, inviabilizando o acesso ao mercado de trabalho" — como se, dentro do nosso contexto histórico sociocultural econômico, fosse possível haver um racismo reverso.

Ocorre que o Brasil é hoje um Estado com princípios, valores e diretrizes constitucionais democráticos, mas nem sempre foi assim… O passado escravagista da história nacional deixou, como sequela, um racismo estrutural arraigado na estrutura socioeconômica do povo, e é isso o que se pretende corrigir para que, então, se possa falar em tratamento igualitário.

É dentro desse contexto histórico que a Constituição Federal (datada de 1988) estabeleceu, entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: "Construir uma sociedade livre, justa e solidária; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais", bem como definiu, como princípio da igualdade, o tratamento isonômico, pela aplicação da equidade, que vem a ser: "Tratar os iguais igualmente e os desiguais na medida de sua desigualdade" — justamente considerando as pessoas que foram colocadas em situação diferente, nesse caso os negros.

Por isso, o protagonismo da iniciativa privada que, espontaneamente, dispõe-se a implementar medidas no sentido de nos redimirmos, enquanto sociedade, desse triste passado diante da população negra, jamais deve ser inibido, mas, sim, celebrado pelo Estado, já que, em conformidade com as suas diretrizes constitucionais, colabora com o seu efetivo processo de Justiça de transição reparativa.

Nessa linha de raciocínio, pode-se concluir que, se o Estado estivesse desenvolvendo políticas públicas eficientes e capazes de alcançar os seus objetivos, a empresa privada não estaria se vendo na necessidade de desenvolver um processo seletivo diferenciado para que negros conseguissem ocupar cargos de liderança, porque eles já estariam, naturalmente, competindo em pé de igualdade com os demais candidatos.

Assim, através da reconvenção, pode-se discutir, judicialmente, a possibilidade de condenação do próprio Estado como responsável pelo que acusa à Magazine Luiza, comprovando-se diante do juiz que sua omissão é a verdadeira culpada por essa sociedade tão desigual, injusta e preconceituosa, cabendo, portanto, ao Estado indenizar a empresa, inclusive, pelos prejuízos causados em decorrência de sua litigância de má fé.

Reconvenção é o instrumento jurídico por meio do qual um processo judicial movido contra alguém pode ser rebatido a quem o moveu. Em dito popular, é como se "a magia virasse contra o feiticeiro" para que, assim, este possa ser condenado pelo que acusou ao outro.

Esse recurso de defesa processual serve como um verdadeiro contra-ataque a quem, injustamente, estiver acusando o outro de uma culpa que, na verdade, é sua.

Portanto, quando o Estado não respeitar os princípios da livre iniciativa e da intervenção mínima estatal, colocando em risco a liberdade de autogestão empresarial, através da abertura de um processo judicial interventivo nas suas atividades, é preciso avaliar se na defesa, junto à contestação, cabe também reconvenção.

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