Opinião

Julgamento antecipado parcial do mérito é bom para o jurisdicionado e a cidadania 

Autor

  • Arthur Bobsin de Moraes

    é sócio da Cavallazzi Andrey Restanho & Araujo bacharel e mestre em Direito pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). Especialista em Direito Administrativo pela PUC-MG.

6 de outubro de 2020, 16h09

A ideia de trazer soluções efetivas para a morosidade na tramitação dos processos é antiga, mas, com a idealização da Emenda Constitucional nº 45/2004, e a inclusão do inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal, foi instituído o direito à duração razoável do processo no rol de garantias individuais.

É nessa mesma linha que o Direito Processual Civil precisa ser pensado. É preciso entender o Direito Processual Civil não só como técnicas abstratas, mas, sim, com aplicações práticas no dia a dia da atividade forense.

Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, essa situação de reforma e busca pela efetiva, e não apenas célere, decisão judicial e entrega da jurisdição também foi prestigiada, como por exemplo o artigo 4º, que determina, em conformidade com a Constituição Federal, que as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do processo, incluída a atividade satisfativa.

É justamente com essa intenção que o artigo 356 do Código de Processo Civil de 2015 inaugura relevante mudança, a possibilidade de fracionamento da sentença, quebrando um dogma secular da unicidade dos pronunciamentos judiciais — della unità e unicità della decisione —, tendo como expoente e defensor Giuseppe Chiovenda.

O instituto caminha ao lado das inovações principiológicas — princípios da cooperação, da primazia do julgamento do mérito, da vedação das decisões surpresas etc. — e das alterações das demais normas processuais, ambos alinhados com o processo civil constitucional.

Com base nessas pedras fundamentais, a obra — julgamento antecipado parcial do mérito — busca levar ao leitor as implicações práticas do instituto, estabelecendo como premissas iniciais — que demonstram como foi possível quebrar o dogma secular da unicidade — a possibilidade de separação entre Direito Material e Direito Processual Civil e o desenvolvimento de uma teoria autônoma da ação, percorrendo, além dos diplomas revogados (CPC/1939 e CPC/1973), a análise do próprio artigo 356 do CPC/2015.

É preciso colocar a lente da praticidade e analisar a aplicação do artigo 356 do CPC/2015 na vida do jurisdicionado e da advocacia, observando as questões polêmicas e diárias, decorrentes do julgamento antecipado parcial de mérito. Como proceder diante de uma situação em que é possível o julgamento antecipado parcial do mérito? É uma das questões que se pretende responder.

Alguns exemplos demonstram como o instituto cria situações de difícil resolução: 1) implicações na recorribilidade das decisões; 2) fundamentação da decisão que julga parcialmente o mérito; 3) impactos na execução de título extrajudicial e no cumprimento de sentença; 4) implicações na reconvenção; 5) como proceder diante de decisões interlocutórias não recorríveis; 6) discussão sobre a aplicação do artigo 356 como um dever ou como uma faculdade do magistrado; 7) necessidade de existência de honorários de sucumbência nas decisões parciais de mérito; 8) possibilidade de cisão do mérito pelos tribunais; 9) implicações na recorribilidade da decisão parcial de mérito adesivo; 10) qual a ingerência na ordem cronológica de julgamento; 11) julgamento antecipado parcial do mérito como acesso à justiça; e 12) necessidade de reexame necessário, entre outros.

Enfrentar os temas acima permite superar a falta de segurança jurídica no entendimento do julgamento antecipado parcial do mérito, pois aplicar o instituto sem analisar suas consequências poderá penalizar o jurisdicionado, que, por meio de seu constituinte, optar por cumular suas pretensões. Isso ocorre porque, caso o entendimento não seja sistemático e igual, afastar-se-ão os pedidos cumulados e o número de ações crescerá no Poder Judiciário. 

O momento processual em que a decisão for proferida não pode penalizar aquele que cumula suas pretensões.

A conclusão é que a tempestividade da tutela jurisdicional é um valor consagrado pela Constituição da República Federativa do Brasil e é dever do Poder Judiciário adotar os mecanismos instituídos pelo Poder Legislativo aptos a garantir o acesso à Justiça. É fundamental, não apenas o direito de provocar o acesso ao Judiciário, mas também (e mais importante ainda) o de obter em um prazo razoável uma tutela jurisdicional justa e efetiva.

O que se conclui ainda é que, mesmo com as contradições existentes entre o julgamento antecipado parcial do mérito e algumas implicações práticas no dia a dia decorrentes da imprecisão do legislador, esse instrumento possui todas as condições de garantir uma prestação jurisdicional que atenda aos anseios dos jurisdicionados e dos operadores do Direito.

Enfim, o julgamento antecipado parcial do mérito permitirá que o processo seja julgado em etapas, evitando que uma ação cumulada tenha de esperar toda a instrução probatória das demais ações. Ganha o jurisdicionado e ganha a cidadania. 

Aguardemos com esperança o posicionamento dos jurisdicionados e dos magistrados, na certeza de que a demora da efetiva tutela jurisdicional traz desarmonia ao sistema e deixa de cumprir com as garantias constitucionais da duração razoável do processo com a solução integral do mérito em um prazo justo, pois a demora compromete aquele que tem razão.

Autores

  • é advogado, mestrando em Direito pela UFSC, especialista em Direito Administrativo pela PUC-MG; presidente da Comissão da Jovem Advocacia da OAB-SC e membro do Instituto dos Advogados de Santa Catarina.

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