A relação de trabalho responsável
1 de novembro de 2020, 13h13
Os funcionários da empresa multinacional Amazon têm confrontado as práticas trabalhistas adotadas pela corporação alocando guilhotinas na frente da residência de Jeff Bezos, seu fundador, controlador e CEO, tido como a pessoa mais rica do mundo na atualidade. Trata-se do uso do símbolo mais contundente da Revolução Francesa, representando o repúdio às políticas trabalhistas da empresa — consideradas ambíguas — e às imensas desigualdades e injustiças causadas pelo sistema econômico vigente. Demandam, nesse sentido, melhores salários, saúde e segurança no trabalho, programas de diversidade mais efetivos, entre outras justas reivindicações.
Não é admissível que as empresas exerçam suas atividades distanciadas dos valores éticos essenciais à humanidade. Mostra-se reprovável e — sobretudo — condenável a atuação empresarial que enseja, direta ou indiretamente, a violação de Direitos Humanos. Em referido contexto insere-se o paradigma da relação de trabalho responsável.
Desde o despontar da civilização, o trabalho humano tem sido o grande fator de estabilidade e progresso da sociedade. O primado da dignidade humana exige, de modo basilar, a concepção da proteção do trabalho — do trabalho digno. A valorização do trabalho, como referência fundamental da sociedade contemporânea, demanda a plena efetivação dos mais elevados padrões internacionais de proteção ao trabalhador e repudia a revogação de direitos e a precarização.
O despertar efetivo da sociedade para a proteção dos direitos fundamentais no trabalho pode — e deve — ser influenciado pela relação de trabalho responsável, a qual corresponde ao vínculo ético-jurídico mantido entre a empresa socialmente responsável e o trabalhador, destinado a assegurar a dignidade do obreiro por meio da concretização dos direitos fundamentais no trabalho, resguardando, sempre, a humanização dos vínculos laborais e o comprometimento da corporação, de seus acionistas e de seus gestores com o desenvolvimento e a sustentabilidade da sociedade.
A materialização da relação de trabalho responsável promove a melhoria da vida das pessoas no exercício laboral, no qual direitos fundamentais dos trabalhadores necessitam ser protegidos e concretizados. Todo trabalhador tem direito ao trabalho, respeitando-se sua dignidade e seus direitos fundamentais declarados. Ante a progressividade exigida, enunciada sistemática deve dar-se, sempre, em busca dos mais elevados padrões de direitos trabalhistas — jamais admitindo a redução de direitos conquistados. Não se trata, pois, de paradigma estático, mas de um modelo dinâmico, evolutivo, que preconiza o avanço permanente da proteção ao trabalho.
A proposta da relação de trabalho responsável — em consonância com a Declaração dos Direitos e Princípios Fundamentais no Trabalho da Organização Internacional do Trabalho (OIT) — exige a plena efetivação da proteção social dos trabalhadores, a geração de oportunidades de trabalho, emprego e renda, o diálogo social e a equidade, a afirmação do trabalho seguro e saudável, a liberdade de associação e de organização sindical, o reconhecimento verdadeiro do direito de negociação coletiva, a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório, a abolição efetiva do trabalho infantil, a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação. Tutela e promove, assim, o trabalho produtivo e apropriadamente remunerado, executado em condições de liberdade, equidade e segurança, sem discriminação e apto para assegurar uma vida digna aos indivíduos que dele dependam.
Para além dos elementos definidos nos direitos fundamentais no trabalho, a relação de trabalho responsável propõe, complementarmente, que as práticas adotadas pelas corporações avancem em direção aos mais altos padrões de direitos trabalhistas reconhecidos e praticados internacionalmente. É inaceitável, sob qualquer perspectiva, que empresas busquem padrões de proteção trabalhista inferiores como diferencial competitivo para a definição do preço de seus produtos.
Na atualidade, cidadãos, consumidores, trabalhadores e governantes passaram a reivindicar, de modo inequívoco, o comprometimento efetivo das empresas com a sustentabilidade, com a ética, com a governança corporativa, com a equidade social e com as futuras gerações. Referida realidade decorre das exigências impostas por uma sociedade cada vez mais consciente e engajada. Uma nova postura empresarial, um novo comportamento passa, portanto, a ser demandado como expressão desse verdadeiro movimento de mudança. Somente se concretizados, os direitos fundamentais no trabalho serão instrumentos efetivos para a afirmação da dignidade do trabalhador — conquista inalienável da humanidade e anseio de toda a comunidade internacional.
A proteção ao trabalho apresenta-se, inelutavelmente, como alicerce fundamental de qualquer sociedade civilizada. A aplicação irrestrita dos direitos fundamentais no trabalho e dos elementos do trabalho decente é pressuposto primeiro para o verdadeiro reconhecimento da responsabilidade social empresarial, correspondendo ao paradigma da relação de trabalho responsável. Os atores sociais precisam ser sensibilizados para a nevrálgica e decisiva importância da questão trabalhista, a qual atinge a todos de modo absolutamente contundente.
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