Segunda leitura

Direito, política, jovens e o futuro do Brasil

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

14 de junho de 2020, 10h56

O Direito estimula os jovens ao estudo das regras de convivência social, da oratória e da negociação. Inequivocamente, leva mais às discussões, inconformismo e reivindicações do que o estudo dos cursos das ciências exatas, por exemplo, a engenharia.

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Não por acaso, inúmeros personagens da história do Brasil eram graduados em Direito. A maioria dos presidentes da República, nada menos do que 19 em um total de 36, eram profissionais do Direito. Portanto, o mundo político brasileiro é pleno de pessoas da área jurídica.

E isto não se dá apenas na chefia do Poder Executivo federal. As pessoas que exercem posições políticas no Poder Executivo (prefeitos, governadores, secretários, presidentes de órgãos administrativos e outros) ou no Poder Legislativo (vereadores, senadores, deputados estaduais e federais) são, na sua maioria, da área jurídica.

Porém, nas Faculdades de Direito, os estudantes muitas vezes são aconselhados a desistir de tal projeto e optar por carreiras mais seguras, como as do Poder Judiciário, Ministério Público e outras. Na família, receberão pouco apoio, por vezes até ameaças de serem boicotados nas suas pretensões.

Essa má vontade geral contra os políticos ou, de forma genérica, contra a política, tem como resultado direto piorar a qualidade de nossos representantes. E o que a maioria das pessoas não percebe é que eles são o nosso retrato, nós é que os elegemos, nós é que os colocamos lá.

Não é justo, nem mesmo como brincadeira, que se dirija a alguém que manifesta interesse em ingressar na política com frases ofensivas. Tal postura infeliz só fará com que os bons desanimem e os maus se apoderem do poder público.

Portanto, quem deseja o melhor  para si e os seus descendentes, para sua cidade, estado ou para o Brasil, deve, como primeiro passo, escolher bons candidatos. Sempre pensando no interesse público e não nas vantagens que dele poderá obter, se acaso for eleito.

A segunda coisa a ser feita é estimular os jovens a participar da política. Mas aí é preciso mostrar as coisas boas que poderão fazer e as dificuldades que terão que enfrentar. Não estimular de uma maneira idílica, como fazem alguns pais que, ao invés de educar, exageram na proteção dos filhos, a ponto de deixá-los fora do mundo real.

Alguns terão dificuldades e logo desistirão. Acostumados a tudo receber e por nada lutar, policiados dia e noite, afastados das ruas e do transporte coletivo, são levados a crer que a vida será uma sucessão de braços abertos, beijinhos e chocolate Lindt. E não será. Os pais devem mostrar a realidade, as coisas boas e as ruins, a maldade humana e como esquivar-se dela.

Se não estiverem preparados, os jovens, assim que derem o primeiro passo na política e tiverem uma decepção, sairão apressadamente,  proclamando a todos que não se prestam a bandalheiras. Resultado: não resolverão nada, não ajudarão a si próprios, a sociedade ou o país.

É preciso respeitar os bons políticos, os que se dedicam realmente ao propósito de melhorar as coisas. Muitos generalizam, atacando os políticos em geral. É um erro.

A vivência por um ano e quatro meses em Brasília, em permanente contato com o Congresso, permitiu-me conhecer muita gente boa. Realmente, muitos querem o melhor para o Brasil e para isto se esforçam. É a eles que me refiro. Com os outros, creio que não devemos perder tempo.

Com relação aos realmente bem-intencionados, observo que eles também enfrentam dificuldades. Surgem todo tipo de pessoas e de interesses. Como reagir ao receber do colega que tanto admirava um pedido ilegal; como dizer a um parente que não pode dar um cargo em comissão ao seu filho que é totalmente favorável ao ócio, seja criativo, como sugere Domenico de Masi, ou mesmo sem qualquer criatividade; como negar ao amigo do pai, que o ajudou na campanha, proteção em um processo licitatório.

Ademais, fazer aprovar um projeto de lei não é uma coisa simples. É preciso ter o apoio dos colegas de partido, enfrentar os que se opõem à iniciativa, obter aprovação nas comissões do órgão legislativo e, por fim, não haver veto da chefia do Poder Executivo.

Assim, apoiar os bons com mensagens nas redes sociais, defendê-los quando atacados, prestigiá-los nas suas iniciativas e nos eventos públicos, é uma maneira de elevar o nível da política e dos políticos.

Da mesma forma, jamais transmitir a terceiros notícias flagrantemente falsas. Tolos as encaminham e depois afirmam saber que não eram verdadeiras. Não percebem que ao agir desta maneira estão colaborando para a divulgação, fazendo exatamente o que pretendiam os criadores das malsinadas fake news.

O Ministério Público e o Poder Judiciário têm um papel essencial neste posicionamento, deles se exigindo decisões com maturidade e visão de conjunto.

Desse modo, dar andamento a acusações destituídas de provas, ocasionando o massacre de um bom político na mídia, pode ser decisivo para levá-lo a retirar-se da vida pública. Dar seguimento a uma ação de improbidade administrativa, porque uma verba insignificante foi aplicada de forma equivocada, sem gerar prejuízo à administração, submetendo-o a uma ação de dez ou mais anos de duração, talvez seja o mais forte desestímulo a quem quer fazer o bem.

Poucos percebem, mas ao contrário do que era comum no passado, atualmente pouco se faz de concreto para que os jovens assumam, com retidão e competência, o futuro do Brasil. As futuras gerações só costumam ser lembradas quando se fala no direito que possuem de gozar um sadio meio ambiente.

É preciso mais. É preciso orientá-las e estimulá-las a assumir posições políticas e bem exercê-las. Mas isto não ocorrerá por milagre. É uma luta diária, contínua, à qual todos são chamados, especialmente os professores.

Autores

  • é ex-secretário Nacional de Justiça no Ministério da Justiça e Segurança Pública, professor de Direito Ambiental e de Políticas Públicas e Direito Constitucional à Segurança Pública na PUCPR e desembargador federal aposentado do TRF-4, onde foi corregedor e presidente. Pós-doutor pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e mestre e doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Foi presidente da International Association for Courts Administration (Iaca), da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibraju).

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