Opinião

Os riscos remanescentes e a multa por compensação de tributos não homologada

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4 de junho de 2020, 12h13

Inicialmente, cumpre destacar a penalidade cuja constitucionalidade está sendo julgada pelo Supremo Tribunal Federal por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4905, a qual trata do Tema nº 736 de Repercussão Geral, e prevista pelo §17 do artigo 74 da Lei 9.430/1996. A multa isolada sob discussão é usualmente aplicada pela Receita Federal do Brasil por meio de autos de infração relacionados aos processos administrativos que tratam da não homologação ou da homologação parcial de declarações de compensação apresentados pelos contribuintes. 

É importante destacar que a penalidade em questão foi criada com o objetivo de desestimular os contribuintes a utilizar declarações de compensação em seus planejamentos tributários, com base em créditos cuja materialidade poderia ser considerada controversa pela Receita Federal, de modo que a alternativa mais conservadora para essa finalidade se tornou a apresentação de pedido de ressarcimento ou restituição, sem a realização da compensação de débitos, desde a revogação do parágrafo 15 do mesmo dispositivo legal, o qual previa a aplicação da multa isolada de 50% também aos casos do indeferimento desses pedidos.

Nesse contexto, é evidente o prejuízo aos contribuintes, que se veem obrigados a aguardar anos até a análise dos pedidos de ressarcimento ou restituição e, muitas vezes, outros anos até o efetivo recebimento dos valores pleiteados.

No último dia 17 de abril, foi iniciado o julgamento da mencionada ADI, oportunidade em que o ministro relator Edson Fachin proferiu voto favorável ao reconhecimento da inconstitucionalidade da multa em questão.

O julgamento havia sido interrompido devido a um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, que incluiu novamente o recurso extraordinário da União Federal na pauta de julgamento do último dia 8, quando proferiu voto-vista para acompanhar o relator, com a ressalva de que "é inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de pedido administrativo de ressarcimento ou de homologação de compensação tributária, por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária".

O voto-vista foi acompanhado pelos ministros Celso de Mello e Luís Fux, que apresentou destaques ao julgamento, de modo que o caso foi novamente retirado de pauta.

No entanto, o que se pretende destacar é que a provável declaração de inconstitucionalidade da penalidade em discussão não afasta completamente os riscos dos contribuintes ao utilizarem declarações de compensação de créditos cuja materialidade possa ser questionada pela RFB.

Isso porque os artigos 18 da Lei nº 10.833/2009 e 89, § 10, da Lei nº 8.212/1991 preveem a aplicação de uma multa isolada ainda mais grave, de 150% sobre o valor compensado, quando se comprove falsidade da declaração apresentada pelo contribuinte.

O conceito de falsidade é amplo e genérico, tendo sido mais recentemente interpretado pela 2ª Turma da Câmara Superior do CARF [1] da seguinte forma:

"Declaração falsa é aquela que, conscientemente, não corresponde à verdade. É diferente do erro, do mero engano, em que o agente insere informação inverídica, porém, pensando estar inserindo informação verdadeira. Informar em declaração entregue ao Fisco que detém um crédito passivo de restituição ou ressarcimento quando não tem o reconhecimento de que esse crédito é passível de restituição, configura efetivamente falsidade da declaração.

(…) a aplicação do § 10 do artigo 89 da Lei º 8.212/1991 não está condicionada à comprovação de evidente intuito de fraude ou de qualquer outro requisito previsto no § 1º do artigo 44 da Lei nº 9.430/1996".

Como é possível notar, a temerária manutenção da aplicação da multa isolada de 150% sem a necessidade de demonstração de dolo, fraude ou simulação, cumulada com a provável declaração de nulidade da multa isolada de 50% pelo STF, pode resultar num alargamento da aplicação da multa de 150% pela RFB.

É importante mencionar, ainda, o disposto na Instrução Normativa RFB nº 1.862/2018, que incluiu as declarações de compensação entre as hipóteses de responsabilidade tributária que pode ser imputada aos sócios e administradores.

Além disso, existem outras hipóteses para que uma compensação seja considerada não declarada, as quais estão sujeitas à aplicação de multa isolada de 75%, dispostas no § 12 do artigo 74 da Lei nº 9.430/1996. Da mesma forma que ocorre nos lançamentos de ofício, ambas as multas (75% e 150%) podem ser aumentadas pela metade, totalizando, respectivamente, 112,5% e 225% nos casos de não atendimento, pelo sujeito passivo, no prazo marcado, de intimação para prestar esclarecimentos ou para apresentar documentos ou arquivos magnéticos.

Dessa forma, os contribuintes devem manter a cautela ao utilizar declarações de compensação para utilizar créditos passíveis de controvérsia perante a RFB, ante a incerteza acerca do posicionamento a ser adotado pela RFB após a declaração de nulidade da multa isolada de 50%, a qual pode se tornar mais agressiva. 

Por fim, é evidente que existem diversos argumentos que podem ser utilizados para questionar a multa agravada dos artigos 18 da Lei nº 10.833/2009 e 89, §10, da Lei nº 8.212/1991, assim como a responsabilidade tributária prevista nos artigos 8º e seguintes da IN RFB nº 1.862/2018, de modo que a controvérsia deve evoluir no contencioso conforme a postura a ser adotada pela RFB no futuro.

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[1] Acórdão n.º 9202-008.521, julgado em 28/1/2020.

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