Advogados destacam julgamentos criminais que ficaram para 2021
29 de dezembro de 2020, 19h16
O ano de 2020 nos tribunais brasileiros foi marcado pela inovação e reinvenção para que os trabalhos não fossem paralisados em meio à pandemia da Covid-19. Com julgamentos virtuais e por videoconferência, o Supremo Tribunal Federal deu andamento aos processos e julgamentos de importantes temas.
Alguns deles, de grande impacto, como regras trabalhistas em razão da pandemia, bloqueio do Whatsapp, verba proporcional para candidatos negros, incidências de ICMS, entre outros. Mas ficou para 2021 a análise de grandes temas do mundo criminal.
Especialistas apontam quais ações ficaram sem julgamento e podem ser decididas em 2021 pela Corte, dentre elas, importação de medicamentos sem registros, revista íntima em presídios e interceptação telefônica.
Importação de medicamentos
Está na pauta do dia 17 de março o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 979.962, que trata da pena para quem comete a importação de medicamentos sem registros, tipificada no artigo 273, §1º-B, I, do Código Penal. De acordo com David Metzker, advogado criminalista, sócio da Metzker Advocacia, o recurso discute a constitucionalidade da pena prevista no artigo 273 do Código Penal (10 a 15 anos de reclusão) para as pessoas que importam medicamentos sem registro sanitário. A matéria tem repercussão geral reconhecida e o relator é o ministro Roberto Barroso.
Para o advogado Willer Tomaz, sócio do escritório Willer Tomaz Advogados Associados, o julgamento é importantíssimo, pois trata da dosimetria da pena, de princípios como da reserva legal, da razoabilidade e da separação de poderes, além de poder refletir sobre outras matérias, tais como crimes ambientais.
"O STF então dirá, à luz do princípio da reserva legal, disposto no artigo 5º, inciso XXXIX, da CF/88, se pode o Poder Judiciário combinar duas normas distintas para criar uma terceira espécie normativa não prevista no ordenamento jurídico", destaca Tomaz.
Prisão temporária e crimes hediondos
Willer Tomaz avalia, ainda, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.109, que busca a declaração de inconstitucionalidade do artigo 1º. incisos I, II e III da Lei 7.960/89, e do artigo 2º, §4º, da Lei 8.072/90, que tratam da prisão temporária e dos crimes hediondos, respectivamente. A ação é de relatoria da ministra Carmem Lúcia.
O autor da ação afirma que a prisão temporária só é cabível quando realmente for demonstrada a sua imprescindibilidade, mediante cumulação das situações previstas nos incisos I, II e III, do artigo 1º da Lei 7.960/89, devendo ainda estarem presentes, no que couber, os requisitos autorizadores da prisão preventiva, previstos no Código de Processo Penal (CPP).
Para o advogado Willer Tomaz, a prisão temporária ou "prisão para averiguação" é, por si só, inconstitucional e deveria ser extirpada do mundo jurídico. "Mas eventual julgamento de procedência desta ação direta de inconstitucionalidade já significará um passo importante em direção à legalidade das prisões, colocando fim a infindáveis controvérsias no meio jurídico, dado que, como está, a prisão temporária não observa a garantia do devido processo legal, máxime porque a previsão legal excede os limites da razoabilidade, sendo uma medida desproporcional em relação aos fins pretendidos", destaca Tomaz.
Revista íntima em presídios
O advogado criminalista Leandro Pachani avalia o julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 959.620, de relatoria do ministro Edson Fachin, que discute se a revista íntima de visitantes que ingressam em estabelecimento prisional viola os princípios da dignidade da pessoa humana e da proteção à intimidade, à honra e à imagem do cidadão. Também está em discussão a licitude das provas obtidas mediante este procedimento.
Para Pachani, a revista íntima de visitantes nos estabelecimentos prisionais não somente se revelará inconstitucional, face o que dispõe o artigo 5º, inciso III, da Constituição Federal, como também está em desacordo com precedentes e normas internacionais sobre a questão, como a Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
"Ao ser utilizada, a revista vexatória acaba por agir como fator de inibição da visita em sistemas prisionais indo contra não só o que dispõe a Lei de Execução Penal, no seu artigo 41, X, como também ao que foi já reconhecido pela Corte Europeia de Direitos Humanos e pela Corte Interamericana. Consequência desta inconstitucionalidade, acredita-se que toda a prova colhida a partir desta inspeção seja classificada como prova ilícita", ressalta Pachani.
Direito ao esquecimento
David Metzker destaca como importante o julgamento do direito ao esquecimento que está pautado para ser votado no dia 3 de fevereiro. O Recurso Extraordinário (RE) 1.010.606, sob relatoria do ministro Dias Toffoli, tem repercussão geral reconhecida. O caso diz respeito a familiares da vítima de um crime praticado nos anos 1950 que questionam a utilização de imagens em programa televisivo.
Interceptação telefônica
O advogado criminalista João Paulo Boaventura, sócio do Boaventura Turbay Advogados, avalia como importante o julgamentos do Recurso Extraordinário (RE) 625.263, que trata da possibilidade de prorrogações sucessivas do prazo de autorização judicial para interceptação telefônica, que tem repercussão geral reconhecida. O relator é o ministro Gilmar Mendes.
A lei que disciplina a questão dá o prazo de 15 dias, renováveis por igual período, caso seja comprovada a necessidade. Mas o artigo 136 da Constituição Federal dá um prazo maior para a quebra de sigilo telefônico em caso de decretação de estado de defesa, cuja duração não será superior a 30 dias, podendo ser prorrogado uma vez.
Prova produzida no inquérito
Boaventura destaca, também, o Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1.042.075, que trata da aferição da licitude da prova produzida durante o inquérito policial relativa ao acesso, sem autorização judicial, a registros e informações contidos em aparelho de telefone celular, relacionados à conduta delitiva e hábeis a identificar o agente do crime. O recurso também tem repercussão geral reconhecida.
De relatoria do ministro Dias Toffoli, o processo discute se há ofensa da inviolabilidade do sigilo de dados e das comunicações telefônicas o acesso da autoridade policial, sem autorização judicial, à agenda telefônica e ao registro de chamadas em aparelho celular encontrado fortuitamente no local do crime.
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