Flexibilização da LEP

TRT-4 vê vínculo de emprego de trabalhador que cumpria pena no regime semiaberto

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15 de novembro de 2019, 7h56

A regra prevista parágrafo 2° do artigo 28 da Lei de Execução Penal (LEP), de que o trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), deve ser aplicada de maneira restritiva; ou seja, apenas ao trabalhador apenado que esteja cumprindo pena privativa de liberdade no regime fechado. Assim, é possível reconhecer vínculo de emprego em relação ao labor prestado por preso submetido ao regime semiaberto.

Com este fundamento, 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) reconheceu o vínculo de emprego entre um trabalhador que cumpria pena no regime semiaberto e trabalhava em um minimercado. A decisão reformou a sentença do juízo da 3ª Vara do Trabalho de Santa Cruz do Sul.

O trabalhador ajuizou o processo requerendo, entre outros pedidos, o vínculo de emprego de setembro de 2011 a novembro de 2015. O objetivo do reconhecimento da relação de emprego seria o de garantir os direitos previstos na legislação trabalhista, como décimo terceiro salário, aviso-prévio, férias, Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, entre outros.

No primeiro grau, a sentença observou que a LEP retira os direitos trabalhistas do apenado, já que ele não possui liberdade para a formação do contrato. Contudo, a decisão reconheceu a existência da relação de emprego a partir de janeiro de 2013, quando houve anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) do trabalhador. “Uma vez registrado o contrato de emprego, a exceção legal deixa de estar caracterizada”, escreveu na sentença a juíza do trabalho Luciana Bohm Stahnke.

O caso chegou ao segundo grau por meio da interposição de recurso ordinário (RO) pelo autor do processo e pelo minimercado, a parte ré. A empresa contestou a existência do vínculo empregatício, alegando que a assinatura na CTPS não altera a condição do apenado. O trabalhador, por outro lado, pediu que fosse reconhecida a relação de emprego, inclusive no período anterior à assinatura da CTPS, quando já atuava no minimercado.

Aplicação restritiva da regra
Ao analisar o caso, o relator do acórdão, desembargador André Reverbel Fernandes, ressaltou que o dispositivo da LEP deve ser interpretado a partir do artigo 5º, inciso XIII, da Constituição Federal, que assegura o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão; e do artigo 6º, que garante a todos o direito ao trabalho digno sem qualquer exceção. O magistrado esclareceu que a regra que retira dos presos a proteção da legislação trabalhista deve ser aplicada de maneira restritiva; ou seja, apenas ao trabalhador apenado que esteja cumprindo pena privativa de liberdade no regime fechado, pois nessa situação está ausente qualquer elemento de vontade.

"De outra parte, considera-se possível reconhecer a existência de vínculo de emprego em relação ao labor prestado pelo preso submetido ao regime semiaberto, uma vez que nesta etapa de cumprimento de pena a execução de trabalho passa a ser realizada, em regra, em ambiente externo ao sistema prisional (…). Tem-se que nesta última hipótese o trabalho prestado ocorre sob as mesmas condições em que efetuado pelos demais trabalhadores", observou o relator.

O desembargador ressaltou que o trabalhador já cumpria pena no regime semiaberto durante todo o período em que atuou na empresa, e que seu trabalho era realizado fora da prisão. Além disso, acrescentou que não foram respeitados os requisitos previstos na LEP e no Protocolo de Ação Conjunta (PAC), firmado junto à Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe), para utilização de mão-de-obra carcerária. Dentre esses requisitos, está a previsão de jornada de trabalho de seis a oito horas por dia. Contrariamente, as informações do processo revelam que o expediente do autor era superior a 10 horas diárias.

O acórdão conclui que o objetivo da empresa era a “obtenção de lucro por meio da exploração do trabalhador sem a necessidade de pagamento de quaisquer direitos trabalhistas, em evidente fraude à CLT”. Com esses fundamentos, a decisão reconheceu o vínculo de emprego do trabalhador com o minimercado no período de setembro de 2011 a novembro de 2015.

A decisão da 4ª Turma, tomada na sessão do dia 18 de setembro, foi unânime. Também participaram do julgamento os desembargadores João Paulo Lucena e Ana Luiza Heineck Kruse. As partes não interpuseram recurso contra a decisão. (Com informações da assessoria de Imprensa do TRT-RS)

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Reclamatória 0020527-13.2016.5.04.0733 (VT Santa Cruz do Sul-RS)

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