Opinião

Em tempos de instabilidade, Justiça tem papel crucial na credibilidade do país

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21 de junho de 2019, 6h17

O permanente clima de instabilidade vem afetando toda a sociedade na medida em que mudanças drásticas de posicionamento se impõem em todas as esferas sociais. Como se trata de poder independente, mas jamais alheio, o Judiciário vem se apresentando com decisões de preocupante e inédito combate às positivações legislativas, tornando-se também protagonista nas epifanias posturais que afetam nosso país.

Se antes contávamos com sólidos posicionamentos e união nos tribunais superiores, hoje nos deparamos com constantes mudanças jurisprudenciais, muitas vezes dentro de uma mesma corte, traduzindo insegurança jurídica e imprevisibilidade que afetam não somente o deslinde processual, mas — principalmente — a possibilidade de investimentos, indispensáveis à retomada do crescimento.

É este o caso do acórdão exarado nos autos do Recurso Especial 1.700.487/MT, que considerou válida cláusula de plano de recuperação judicial que prevê a supressão de garantias reais e fidejussórias, aprovada em assembleia geral de credores, sem qualquer ressalva. Isso atinge os credores em sua totalidade, inclusive os ausentes e os que não votaram favoravelmente à aprovação do plano.

Consolidou-se entendimento de que, restando expresso no plano, independentemente de anuência do credor, restarão suprimidas as garantias concedidas aos credores. Em outras palavras, permite-se nova flexibilização às elásticas características da recuperação judicial, cujo entendimento jurisprudencial já havia subjugado previsões inequívocas do legislador, como — por exemplo — o stay period (período de suspensão das execuções movidas em face do recuperando), previsto em lei como não maior do que 180 dias, hoje prorrogado sem limitações.

O acórdão segue à contramão da fundamentação de outro acórdão exarado em recurso repetitivo, do Superior Tribunal de Justiça, de força vinculante, que consolidou posicionamento favorável ao prosseguimento de execuções ajuizadas em face de terceiros devedores, solidários ou co-obrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória (REsp 1.333.349/SP). Neste caso, o relator fundamentou que “a novação decorrente do plano de recuperação traz, como regra, a manutenção das garantias, as quais só serão suprimidas ou substituídas “mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia”.

Com a decisão do Recurso Especial 1.700.487/MT, observa-se contrafluxo aos positivos acenos aos credores que consolidam suas operações com garantias, tornando a corte a se posicionar de maneira paternal aos devedores.

Em que pese se tratar de importante instituto à recuperação econômica de empresas, especialmente contextualizado em período de esforços para retomada econômica, há que se considerar outros fatores quando da cristalização de entendimentos pelas cortes superiores. Se é verdade que precisamos viabilizar a retomada de empresas, também o é a necessidade de atrair investimentos. O alongamento de disposições antes sólidas gera insegurança jurídica, repelindo novos e necessários aportes a um país que se mostra excessivamente benevolente aos devedores.

O Poder Judiciário, em momentos de instabilidade, tem crucial papel no firmamento da credibilidade do país. Há que se pesarem os momentos ideais para alterações jurisprudenciais que venham a afetar a ordem econômica. A situação nacional pede cautela, conservadorismo e estabilidade.

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