Liberdade de expressão

EUA examinam legislação que proíbe termos depreciativos em marcas comerciais

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4 de outubro de 2016, 11h15

A Suprema Corte dos EUA irá decidir se a seção de uma lei federal que proíbe o registro de marcas comerciais com termos considerados depreciativos (ou pejorativos) é inconstitucional. Um tribunal de recursos já decidiu pela inconstitucionalidade, anulando uma decisão administrativa do Departamento de Marcas e Patentes dos EUA.

A corte vai examinar o caso de uma banda formada por asiáticos-americanos, que se dedica ao gênero musical “dance-rock”, que escolheu o nome “The Slants” e quer registrá-lo como marca comercial.

“Slant” é um termo usado pejorativamente pelos americanos para depreciar as pessoas de origem oriental, zombando de uma de suas características físicas. O termo deriva da expressão “slanted eyes”, que significa “olhos puxados” — uma expressão que, em português, não carrega a carga cultural que lhe foi imprimida nos EUA. Mas seria o mesmo que, no Brasil, uma banda se atribuísse o nome de “Os Mongolóides”.

A Seção 2(a) da “Lanham Trademark Act”, lei de marcas aprovada em 1946, proíbe o Departamento de Marcas e Patentes de registrar marcas escandalosas, imorais, enganosas ou depreciativas. Ou que usem termos pejorativos ou falsas sugestões de uma conexão com pessoas, vivas ou mortas, instituições, crenças, símbolos nacionais ou que signifique desrespeito ou infâmia.

Em sua decisão de 62 páginas (mais 48 de votos separados), o tribunal de recursos decidiu, por 9 votos a 3, que embora reconheça que o nome da banda é depreciativo para as pessoas de origem oriental e que não endossa a escolha desse nome, a Primeira Emenda da Constituição dos EUA, que garante aos cidadãos a liberdade de expressão, garante à banda o direito de usar esse nome e de registrá-lo.

Mas o tribunal simpatizou, de certa forma, com a escolha do nome da banda. “O líder da banda, Simon Shiao Tam, explicou, em sua petição, que escolheu o nome “Slants” exatamente porque esse é um termo depreciativo, com o qual os membros da banda tiveram que conviver em toda a sua infância e parte da adolescência”, diz o voto da maioria.

“Assim, o grupo decidiu resgatar e se apropriar desse estereótipo que marca as pessoas de origem oriental nos EUA. Ele diz que a banda busca inspiração, para escrever as letras de suas músicas, nos insultos que lhes foram dirigidos na infância e zomba das canções de ninar. Dois de seus álbuns foram rotulados de “O Álbum Amarelo” e “Olhos Puxados, Corações Puxados”.

Em sua petição, Tam argumentou que a banda “sente fortemente que os asiáticos devem se orgulhar de suas tradições culturais e não devem se sentir ofendidos por descrições estereotipadas”.

Para o tribunal, Simon Shiao Tam escolheu o nome “The Slants” para manifestar uma opinião sobre os problemas raciais e culturais do país. “Ao atribuir esse nome à banda, ele transmite mais sobre nossa sociedade do que muitos volumes de retórica claramente protegida pela Constituição. A banda levantou discussões culturais e políticas sobre raça e sociedade, que estão na essência da liberdade de expressão garantida pela Primeira Emenda”.

Segundo o tribunal de recursos, o governo não pode se recusar a registrar marcas com termos depreciativos, só porque desaprova as mensagens expressivas transmitidas pelas marcas.

“O governo não pode se recusar a registrar marcas porque conclui que seus termos poderão ofender a outros. A regulamentação governamental equivale à discriminação de pontos de vista (…) e, portanto, concluímos que essa prática é inconstitucional”, diz o voto da maioria.

Uma decisão favorável irá beneficiar o time de futebol americano “Redskins” (peles vermelhas) de Washington. Em 2014, o Departamento de Marcas e Patentes dos EUA cancelou quatro marcas dos “Redskins”, com o argumento de que depreciavam o povo nativo-americano do país. O Pro-Football Inc. pediu à Suprema Corte para juntar seu processo ao do “The Slants”.

O tribunal reconhece que haverá problemas com marcas pejorativas, cujos registros já foram pedidos e negados, como “Stop the Islamisation of America”, “The Christian Prostitute”, “Amishhomo” (que une o povo amish e homossexualidade), “Khoran for wine”, “Marriage is for Fags” e “N.I.G.G.A. Naturally Intelligent God Gifted Africans” (“nigga” é um termo pejorativo para definir pessoas negras, mas, nesse caso, foi utilizado como abreviação de “Africanos Naturalmente Inteligentes Abençoados Por Deus”).

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