Segunda Leitura

Risco tem papel ativo no sucesso do profissional do Direito

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

24 de julho de 2016, 8h00

Spacca
A busca do sucesso profissional, evidentemente não apenas na área do Direito, é uma aspiração comum. Negá-la pode ter duas razões, medo de enfrentar novos desafios ou simplesmente não tentar alcançá-lo para não precisar justificar eventual fracasso.

Na verdade, qualquer tentativa de crescimento pessoal e/ou profissional tira-nos da zona de conforto e coloca-nos em situação de risco. Isto é inevitável na longa caminhada que, em qualquer profissão jurídica, leva ao sucesso. No entanto, a maioria das pessoas, por medo do incerto, recusa-se a assumir qualquer tipo de risco e optam por algo menor, com menos oportunidades.

Como alerta Talita Abrantes, “O primeiro passo para conquistar o sucesso é defini-lo. É saber o que você quer para sua vida. Em outros termos, delimitar suas metas e objetivos de curto, médio e longo prazo”.[i] Os que se formam em Direito têm diante de si vários caminhos e a escolha já é o primeiro risco. Mas, regra geral, os estudantes de Direito focam suas aspirações em três opções: advocacia, concurso público ou magistério superior.

Advogar exige aprovação no exame de ordem e colocação profissional. Concurso, seja para qual for o cargo, exige renúncia e dedicação por três a seis anos até a possível aprovação. O magistério superior exige ingresso em um curso de mestrado e dois anos de dedicação absoluta, além de um investimento elevado se a universidade não for pública ou se não houver bolsa.

Mas, no pacote, está implícito que mesmo sendo grande o interesse e a entrega pessoal, em nenhum deles há garantia absoluta de sucesso. É o risco. Faz parte do jogo. Para Jorge Paulo Lemann o maior risco é não arriscar, e “o planejamento funciona justamente com a ideia de ter um Plano B, uma saída de emergência que funcione como alternativa para resultados não tão bons”.[ii]

O risco pode ser previsível ou imprevisível. Para o primeiro (previsível) a solução é um bom planejamento. Ele não assegura 100% de que será alcançado o objetivo, mas reduz ao mínimo a possibilidade de fracasso. Para o segundo (imprevisível) não há o que fazer, está dentro do imponderável. Por exemplo, após anos de estudo e alcançar-se a aprovação em um concurso público, o estado suspende as nomeações por falta de verba para pagar novos funcionários.

Vejamos como assumir e enfrentar os riscos nas três vertentes profissionais mais procuradas.

Se a escolha foi advogar, apresentam-se duas hipóteses: abrir o próprio escritório (maior risco) ou ingressar em um escritório como empregado (risco menor). Cada um avaliará qual situação mais lhe convém.

Mas o planejamento, que é inevitável, recomenda que se tenha um mínimo de vivência na área, que se tenha atuado em um escritório, mesmo que tenha sido como estagiário. É preciso ter ciência de como os trabalhos se desenvolvem, não só com o cliente, mas também na administração interna e na área judicial.

É preciso, também, ter uma estrutura mínima de trabalho. Por falta de dinheiro, às vezes é necessário dividir despesas, inclusive secretária e estagiário, com terceiros. Nisto não há nenhum problema. Porém, que confiança inspirará um advogado que não tem a mínima estrutura profissional, usa um celular e atende em casa? Dificilmente alguém lhe entregará uma causa mais relevante.

É preciso planejar a área de atuação, usando dados estatísticos da própria OAB (p. ex., população e número de advogados) e acompanhar os rumos da economia (p. ex., lendo jornais econômicos). Vejamos dois exemplos. Um positivo foi o crescimento do agronegócio, pois abriu oportunidades de especialização a muitos advogados. Um negativo pode ser a área de acidentes do trabalho, que no passado deu ganhos enormes a muito advogados, mas que, com o tempo, foi diminuindo de importância.

Atualizar-se sempre é essencial. Por exemplo, estudar o novo Código de Processo Civil, em cursos ou com grupos particulares, é obrigatório, a omissão é um suicídio profissional. O mestrado, além do alargamento de conhecimentos jurídicos, colabora para a imagem do profissional, gera segurança àqueles que pretendem contratar o advogado.

O concurso reclama anos de estudo e, ainda assim, não há certeza total do sucesso. Nunca é bom apostar em uma só carreira. Por vezes a felicidade está em outra, para a qual as portas se abrem. E nada impede que, conquistada uma função pública, se faça outro concurso para a da vocação.

Concursos hoje exigem planejamento. Há cursos para tudo, exame oral simulado e até coaching, orientando como se proceder nas mínimas coisas, inclusive psicologicamente. Evidentemente, tudo isto é pago e quem dispõe de dinheiro sai em vantagem. Mas nada impede que uma pessoa menos afortunada divida as despesas com colegas de estudo, inteire-se das novidades, assista a vídeos gratuitos na internet. Ao contrário do que se pensa, a maioria dos aprovados não é oriunda de classes sociais mais favorecidas. Estas pessoas, criadas no conforto e distantes da realidade da vida, não raramente acomodam-se e não avançam profissionalmente.

O magistério superior na área do Direito vem despertando interesse cada vez maior, principalmente entre as mulheres. Mas para tornar-se professor é preciso ter mestrado. E aí se exige planejamento e este vem desde o curso de graduação. Os exames exigem conhecimento de outro idioma, em alguns o inglês é obrigatório (v.g., FGV e PUC-PR). Durante o curso, a participação em projetos ou grupos de pesquisa, atividades complementares, ajuda na avaliação quando do concurso de ingresso.

E se o projeto de vida for só este, com exclusividade, ao mestrado deve seguir o doutorado. Fazê-lo em universidade diversa da que se fez o mestrado é bom para conhecer outros professores, diferentes métodos de ensino, visões do Direito e bibliografia diversas.

Ainda, no magistério as relações pessoais também são decisivas. Todos os títulos possíveis podem ceder diante de alguém amigo dos examinadores ou de quem decide. Isto é errado, mas é assim. O que se tem a fazer, então, é procurar ter amigos e todos os títulos do mundo e quando se tiver o poder de decidir não se deixar levar pelas recomendações.

Porém, muitas vezes os planos não se consumam, mesmo que tenha sido dada, a eles, a máxima dedicação. Seja qual for a profissão escolhida, o sucesso não veio. A advocacia não deu certo, a aprovação no concurso público não aconteceu e o exercício do magistério superior só foi possível em uma pequena Faculdade de Direito, com rendimentos equivalentes a pouco mais que dois salários mínimos.

Muito embora grande a decepção, é necessário saber lidar com a frustração. O insucesso faz parte da vida. Lamentar-se de nada adiantará e ainda fará com que as coisas fiquem piores. O caminho é pensar que nada foi inútil. O aprendizado em uma área com certeza auxiliará em outra.

Exemplificando, a advocacia dará a experiência necessária para o bom exercício de uma função pública. Os estudos para o concurso auxiliarão no magistério superior, unindo a prática à teoria. A base cultural adquirida com o mestrado auxiliará na advocacia. São linhas paralelas que se completam.

Finalmente, seja qual for a profissão, será ótimo ter um amigo sincero que aponte erros e deficiências. Poucos gostam de receber críticas, mas elas, quando sinceras, ajudam-nos a corrigir falhas. Assim, quando o alerta vier de alguém em quem se confia e de quem se gosta, a reação deve ser proativa (muito obrigado) e não reativa (já fiz isto e de nada adiantou).

De tudo o que foi dito, fácil é ver que em nossa vida profissional o risco será uma companhia permanente. Mas, sem ele, a vida pode tornar-se uma enfadonha rotina que nos empobrece o espírito e, muitas vezes, o bolso.

Autores

  • Brave

    é desembargador federal aposentado do TRF da 4ª Região, onde foi corregedor e presidente. Mestre e doutor em Direito pela UFPR, pós-doutor pela Faculdade de Saúde Pública da USP, é professor de Direito Ambiental no mestrado e doutorado da PUC-PR. Presidente da International Association for Courts Administration (IACA), com sede em Arlington (EUA). É vice-presidente do Ibrajus.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!