De cada 10 leis dos municípios fluminenses, 8 são inconstitucionais
12 de dezembro de 2015, 7h44
Levantamento feito pelo Anuário da Justiça Rio de Janeiro 2016, lançado nesta quinta-feira, no Tribunal de Justiça daquele estado, revela que foram consideradas inconstitucionais 85 das leis que tiveram sua constitucionalidade questionada no Órgão Especial da corte. Leia abaixo reportagem sobre o Ranking de Inconstitucionalidade, publicado no Anuário:
Ranking de inconstitucionalidade | |||
---|---|---|---|
Unidade territorial | Julgadas no mérito |
Inconstitucionais | Constitucionais |
Município do Rio de Janeiro | 31 | 29 | 2 |
Volta Redonda | 25 | 21 | 4 |
Estado do Rio de Janeiro | 26 | 15 | 11 |
Barra do Piraí | 7 | 6 | 1 |
Itaguaí | 5 | 5 | 0 |
Barra Mansa, Niterói e Valença | 4 | 4 | 0 |
Cabo Frio | 3 | 2 | 1 |
Itaboraí, Nova Friburgo, Rio das Ostras, São Gonçalo, Cachoeiras de Macacu e Arraial do Cabo |
2 | 2 | 0 |
Araruama | 2 | 1 | 1 |
Angra dos Reis, Belford Roxo, Carmo, Cordeiro, Duque de Caxias, Japeri, Levy Gasparian, Macaé, Maricá, Paracambi, Paraíba do Sul, Petrópolis, Piraí, Resende, São Sebastião do Alto, Sapucaia e Teresópolis | 1 | 1 | 0 |
Duas Barras e Nilópolis | 1 | 0 | 1 |
Total | 142 | 120 | 22 |
Porcentagem | 100% | 85% | 15% |
Entre agosto de 2014 e julho de 2015, 142 leis dos municípios fluminenses e do estado do Rio tiveram sua constitucionalidade submetida ao exame do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Destas, 120 (85%) foram consideradas inconstitucionais. No total, 34 dos 92 municípios fluminenses, além do estado do Rio, tiveram leis questionadas do ponto de vista da constitucionalidade; 32 deles tiveram pelo menos uma lei reprovada.
O município do Rio de Janeiro, pelo segundo ano consecutivo, sagrou-se campeão de inconstitucionalidade, com 29 normas declaradas inconstitucionais. Em segundo lugar aparece Volta Redonda, com 21 leis reprovadas no teste de constitucionalidade, superando o próprio estado do Rio de Janeiro, que ficou em terceiro com 15. Os municípios de Duas Barras e Nilópolis tiveram uma lei questionada cada um, mas elas foram consideradas de acordo com a Constituição.
O estado teve o maior número de leis questionadas, com o total de 70 ações de inconstitucionalidade. Mas, em 11 delas, as ações foram julgadas improcedentes (ou seja, a lei é constitucional), 13 foram extintas sem julgamento de mérito e cinco tiveram liminares concedidas enquanto se aguarda o julgamento do mérito.
O número de leis irregulares poderia ser bem maior não fosse o fato de 28 leis nem sequer ter sido analisadas, pois os processos foram extintos sem julgamento de mérito – por perda de objeto ou por ilegitimidade dos proponentes da ação, na maioria dos casos.
A perda de objeto se dá, quase sempre, quando as leis questionadas são revogadas pelo próprio município antes mesmo do julgamento, uma vez que se constata sua inadequação com o texto da Constituição estadual ou federal. Mas a ação pode ser extinta também por ilegitimidade da parte autora ou por inadequação da via eleita. O estado do Rio de Janeiro foi o campeão nesse tipo de situação: 13 incidentes de inconstitucionalidade questionando leis estaduais foram extintos por uma das razões citadas. Outros 15 municípios também tiveram ações extintas.
Tampouco tiveram o mérito analisado 21 ações em que foram concedidas liminares suspendendo as leis arguidas de inconstitucionalidade. Em apenas um caso o pedido de liminar foi negado. O estado do Rio de Janeiro e o município de Volta Redonda tiveram cinco ações com concessão de liminar cada um, os municípios do Rio de Janeiro e de Itaguaí três e outros 11 municípios uma.
O que não falta aos legisladores municipais e estaduais é a intenção de fazer o bem a seus eleitores. Boa parte das leis consideradas ilegais se propõe a distribuir bondades como isenção de impostos, garantia de serviços públicos de qualidade para os cidadãos ou comodidades em estabelecimentos particulares para os consumidores. Neste último caso se encaixa a lei estadual que assegurava ao consumidor o direito de pagar o mesmo valor cobrado à vista para transações com cartão de crédito ou débito. Tudo bem, exceto o fato de que a matéria é de competência concorrente da União e dos estados. Pior ocorre no caso da lei do município do Rio de Janeiro que torna obrigatória a colocação de legendas nos filmes produzidos pela RioFilmes. Neste caso, a competência em matéria de cultura é da União e do estado, jamais do município.
INCIDENTES DE INCONSTITUCIONALIDADE | |
---|---|
Ações julgadas no mérito | 142 |
Ações extintas sem julgamento do mérito | 29 |
Ações com decisão liminar | 22 |
Total de ações analisadas | 193 |
Mais frequentes são os casos em que os legisladores invadem a competência dos prefeitos ou do governador, desrespeitando o princípio da separação dos poderes. Os vereadores de Barra do Piraí aprovaram lei de iniciativa parlamentar contra a prática do nepotismo no município, o que, em princípio, é muito louvável. O Órgão Especial derrubou-a, no entanto, pois cabe ao chefe do Executivo tomar a iniciativa de legislar nesse tipo de assunto.
O que cada um pode fazer nem sempre fica muito claro. O Órgão Especial declarou constitucional a Lei Estadual 6.434/2013, que estabelece sistema de cotas para o ingresso de negros, pardos e índios em escola técnica estadual, por entender que tal prática “não é estranha à Constituição, refletindo deveres extraídos dos princípios nela inseridos”. Mas considerou inconstitucional a Lei Estadual 6.740/2014, de iniciativa parlamentar, que previa a reserva de 20% das vagas a negros e índios em concursos públicos do Legislativo, Judiciário, Executivo, Ministério Público e Tribunal de Contas do estado. Em sua decisão, o Órgão Especial fez analogia com a Constituição Federal, que determina que “é de competência privativa do presidente da República legislar acerca de servidores públicos da União”. Por sua vez, a Lei Estadual 6.067/2011, de iniciativa do Executivo, que cria cotas para ingresso de servidores públicos no âmbito da administração pública direta e indireta, foi considerada constitucional.
Não são poucas as tentações a que os legisladores têm de resistir. Entre as normas consideradas inconstitucionais, nada menos que 13 tratam de interesses dos servidores públicos, grande parte delas com propostas para melhorar a remuneração deles. Duas dessas leis, dos municípios de Angra dos Reis e de Araruama, pretendiam transferir para os advogados os honorários sucumbenciais devidos ao município nas ações em que eles atuavam. Aplicou-se ao caso “entendimento consolidado pela Corte Suprema, bem como pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que os honorários advocatícios devidos aos procuradores municipais, por constituírem vantagem conferida indiscriminadamente a todos os integrantes da categoria, possuem natureza geral, razão pela qual se incluem no teto remuneratório constitucional, não fazendo jus à referida verba o advogado que atua como servidor público”.
Outra das ações envolvendo o serviço público dizia respeito a norma que garantia o direito de os servidores contarem com advogados contratados pelo poder público para se defender em ações movidas contra atos praticados no exercício da função. A lei foi considerada inconstitucional por simples vício de iniciativa. Caberia ao governador e não a um deputado estadual, como se deu no caso, propor a lei.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!