O credo jurídico-político do jurista cearense Clóvis Beviláqua
2 de novembro de 2014, 7h01

O jurista cearense Clóvis Beviláqua redigiu um pequeno excerto, datado de 3 de abril de 1932, denominando-o de meu credo jurídico-político, insistindo em sua conhecida crença no direito, na liberdade, na moral, na justiça, na democracia e no patriotismo. Clóvis entendia o patriotismo como “forma social de amor (…) forma irresistível e incomensurável”[2].
O texto é minimalista, não passa de uma lauda. No entanto, é também substancialmente significativo e emblemático, por conta dos valores que evoca e que defende. Trata-se de um texto quase esquecido, que corre o risco de cair no oblivion, justificativa dessa retomada do assunto.
Para Clóvis, o “direito é organização a vida social, a garantia das necessidades individuais”[3]. Citando o Novo Testamento (Atos, 17:28): “Porque nele vivemos e nos movemos e existimos”, no latim da vulgata, in eo vivimus et sumus, Clóvis qualificou a sociedade no direito, nele existindo. A liberdade, objeto da crença do jurista cearense, é vivificada com “marca da civilização”[4]; a moral, ganha o sentido de “utilidade de cada um e de todos transformada em Justiça e caridade”[5].
O jurista cearense também insistiu na crença na democracia, “criação mais perfeita do direito político”[6]. Nesse sentido, a democracia, observou, “permite à liberdade a dilatação máxima dentro do justo e do honesto, e corresponde ao ideal da sociedade politicamente organizada”[7].
Trata-se, enfim, de um pequeno excerto, que suscita alguma reflexão, e muito estímulo, propícios a uma época sedenta de valores. Segue o texto:
MEU CREDO JURÍDICO-POLÍTICO (1932)
Clóvis BeviláquaCreio no direito, porque é organização da vida social, a garantia das atividades individuais. Necessidades da coexistência, fora das suas normas não se compreende a vida em sociedade. In eo vivimus et sumus.
Creio na liberdade, porque a marca da civilização, do ponto de vista jurídico-político, se exprime por sucessivas emancipações dos indivíduos, das classes, dos povos, da inteligência, o que demonstra ser ela altíssimo ideal, a que somos impelidos por uma força imanente nos agrupamentos humanos: a aspiração do melhor que a coletividade obtém estimulando as energias psíquicas do indivíduo. Mas a liberdade há de ser disciplinada pelo direito para não perturbar a paz social, que por sua vez assegura a expansão da liberdade.
Creio na moral, porque é a utilidade de cada um e de todos transformada em Justiça e caridade, expunge a alma das inclinações inferiores, promove a perfeição dos espíritos, a resistência do caráter, a bondade dos corações.
Creio na justiça, porque é o direito iluminado pela moral – protegendo os bons e úteis contra os maus e nocivos, para facilitar o multifário desenvolvimento da vida social.
Creio na democracia, porque é criação mais perfeita do direito político, em matéria de forma de governo. Permite à liberdade a dilatação máxima dentro do justo e do honesto, e corresponde ao ideal da sociedade politicamente organizada, com extrair das aspirações mais generalizadas de um povo determinado o sistema de normas que o dirija.
Creio mais nos milagres do patriotismo, porque o patriotismo é forma social do amor, e como tal, é força irresistível e incomensurável; aos fracos dá alento, aos dúbios decisão, aos descrentes fé, aos fortes ilumina, a todos une num feixe indestrutível, quando é preciso agir ou resistir; não pede inspiração do ódio e não mede sacrifício para alcançar o bem comum.
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