Refis da Crise não

Lei 12.865 não respeita igualdade e capacidade contributiva

Autor

  • Pedro Benedito Maciel Neto

    é advogado pós-graduado em Processo Civil Filosofia Social e Planejamento Fiscal pela PUC-SP tendo cursado Economia Monetária no IE da Unicamp sócio da Maciel Neto Advocacia autor de Reflexões sobre o Estudo do Direito (ed. Komedi) conselheiro da Sanasa S.A ex-professor universitário ex-secretário municipal em Campinas e Sumaré.

29 de dezembro de 2013, 7h45

O excelente artigo do advogado Carlos Leduar de Mendonça Lopes, especialista em Direito Tributário e sócio-diretor do Escritório de Advocacia Carlos Leduar Lopes, publicado no Valor, me estimulou a fazer essas reflexões sobre a Lei 12.865, pois sendo o parcelamento da dívida tributária medida excepcional para casos excepcionais, ele deve ser orientado pelos princípios do artigo 37 da Constituição Federal (legalidade, igualdade, publicidade, impessoalidade e eficiência).

A boa doutrina ensina que o parcelamento fiscal é instrumento conservativo do crédito e autotutela do Fisco e, sobretudo, um meio ágil de arrecadação de débitos tributários. Esta atividade de arrecadação como todo ato administrativo tributário, deve ser realizada com observância do princípio da igualdade, já que a lei, no Estado de Direito, exige que todos sejam onerados com a mesma intensidade, para que haja tratamento igual a todos.

Se todos devem contribuir para o sustento dos gastos e investimentos públicos conforme sua capacidade econômica, é de justiça que o credor tributário, em casos de necessidade, suavize a ação arrecadatória adaptando-a as disponibilidades dos contribuintes, mas o faça de forma igualitária. Trata-se, por conseguinte, de flexibilizar as relações entre credor tributário e contribuintes em dificuldade transitória para o pagamento de tributo, mas sempre a bem do interesse público.

Mas há aspecto na Lei 12.865 que merece a nossa atenção, em defesa do Estado de Direito e dos interesses de nossos clientes.

Por quê? Bem, a Lei 12.865 abriu o prazo de adesão ao Refis da Crise, com as alterações introduzidas pela Portaria Conjunta PGFN/RFB 11, de 22 de novembro, para as instituições financeiras e sociedades seguradoras liquidarem passivos de PIS e Cofins gerados até 31 de dezembro de 2012 e para as multinacionais que atuam no país regularizarem seus débitos de Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e CSLL, com fato gerador até 31 de dezembro do ano passado, no prazo máximo de 15 anos, com redução de juros e multas de até 50%. Há ainda a possibilidade de o contribuinte quitar parte dos débitos com prejuízos fiscais e bases negativas. Nos casos de pagamento à vista, as duas modalidades contemplam remissão de juros e multas isoladas. O prazo de adesão termina no dia 31.

Mas onde está o problema se a mesma lei reabriu o parcelamento também para as outras atividades empresariais o prazo do Refis da Crise de 2009 (Lei 11.941)? Exatamente nesse ponto, pois ele só alcança raros casos de débitos vencidos até 30 de novembro de 2008: nunca parcelados, abarcando igualmente os débitos parcelados em outros programas — Refis 1, Paes e Paex. Aos excluídos, há expressa proibição de adesão. Por não haver estendido a flexibilidade nos pagamentos de débitos até dezembro de 2012, pouco ou nenhuma utilidade trouxe.

É sobre isso que quero refletir.

A Lei 12.865 que reabriu o prazo do Refis da Crise de 2009 observou o princípio da igualdade? Penso que não. Porque a Lei 11.941, Lei do Refis da Crise, não previa, como sanção, que os excluídos não poderiam participar de novos programas, e sabemos que estes princípios da generalidade e igualdade comportam, negativamente, a ausência de privilégios ou discrimines em matéria fiscal. O que proíbe os princípios da generalidade e da igualdade é o estabelecimento de benefícios fiscais que constituam autênticos privilégios, isto é, normas excepcionais não justificadas com atenção aos critérios constitucionais. Também a arrecadação é preordenada ao adimplemento da obrigação tributária e dirigida a assegurar o fluxo periódico e regular de recursos para que o Estado cumpra seus fins, necessitando de atual e segura capacidade contributiva dos contribuintes, de onde advirão esses pagamentos.

Por outro lado, proibir os excluídos de voltarem ao Refis da Crise constitui sanção tributária com aplicação retroativa, instituída ao arrepio do artigo 5º, incisos XXXVI, XXXIX e XL da Carta Magna, uma vez que a lei que instituiu o programa não previu, como sanção, que os devedores excluídos não poderiam, posteriormente, participar de novos parcelamentos. E há ainda o principio de que a exigência da lex praevia em harmonia com o artigo 5º da Constituição Federal, ao enunciar que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”, de inteira aplicação às sanções da ordem jurídica tributária.

Como o parcelamento está sujeito ao princípio da igualdade e da capacidade contributiva, estaria de acordo com a Constituição o Refis da Crise abrir prazo para as instituições financeiras e proibir, por meio de sanção inconstitucional, os excluídos de optarem pelo plano novamente, justamente aqueles que enfrentam maiores dificuldades financeiras? Tendo em vista que o princípio da capacidade contributiva desvela que todos contribuirão conforme sua força e poder econômico, haveria obediência ao princípio conceder às instituições financeiras e multinacionais brasileiras a possibilidade de parcelar seus débitos até dezembro de 2012, enquanto as outras atividades econômicas estão limitadas a parcelá-los só até dezembro de 2008? Estamos diante, em tese, de afronta ao principio da igualdade e isso merece nossa reflexão.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!