AP 470

Supremo só deve condenar quem tiver provas contra si

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13 de agosto de 2012, 14h27

De acordo com a Constituição brasileira, nos termos do artigo 5º, que abre a relação dos Direitos e Garantias Fundamentais, diz seu inciso LIV que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” e, consoante estabelece o inciso LV, “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Por seu turno, o inciso LVII do mesmo artigo estatui que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. É certo e induvidoso que o Direito nacional consagra, portanto, e de modo enfático, o princípio universalmente aceito entre os povos civilizados, de que as pessoas são consideradas inocentes até prova em contrário e não o inverso disto, isto é, não se aceita a idéia de que as pessoas sejam consideradas culpadas até prova em contrário.

Note-se que esta não é uma simples regra, mas, como dito, um princípio, ou seja, um mandamento nuclear do sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas e serve de critério para exata compreensão e inteligência delas, porque lhes define a lógica e a racionalidade. Donde, sabidamente, violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado, porque representa subversão de seus valores fundamentais.

Cumpre realçar que a inocência até prova em contrário, é não só um princípio constitucional brasileiro, mas se insere entre os denominados princípios gerais de Direito, ou seja, comuns aos povos civilizados, corporificando-se, como disse Eduardo Garcia de Enterría, em "uma condensação dos grandes valores jurídicos materiais que constituem o substractum do ordenamento e da experiência reiterada da vida jurídica”.

O princípio de que ora se cogita, encareça-se, demanda que a condenação de alguém esteja fundada em prova. Evidentemente, pois, não em presunção, pressuposições, suspeitas, meras ilações, ainda que compreensíveis, pois isto implicaria derrogar uma das maiores conquistas do Direito no mundo civilizado e instaurar uma terrível insegurança social.

Tudo o que se vem de dizer obviamente está suscitado pelo recente julgamento em curso no Supremo Tribunal Federal, pois o que todo o meio jurídico espera da Suprema Corte é que se existirem provas contra os acusados ou contra tal ou qual deles sejam ou seja condenado e que, inversamente, absolva aqueles contra os quais não existam verdadeiramente provas. Os ministros do Supremo Tribunal, de acordo com o artigo 101 da Constituição são escolhidos entre cidadãos de "notável saber jurídico e ilibada reputação”. Nisto, a Lei Magna, como é óbvio, quis conferir a todos os jurisdicionados a segurança de que sua sorte estaria nas mãos de magistrados de sólido conhecimento e de equilíbrio e imparcialidade incensuráveis. Assim, é natural, é compreensível, que se espere desta Corte aquilo mesmo que se veio de dizer. Logo, ninguém deve imaginar que o vozerio da imprensa, claramente direcionado para a condenação dos denunciados pela Procuradoria, é suficiente para manipular os ministros ou que bastaria para absolvê-los se outro fosse seu rumo.

Seria ingênuo e até desrespeitoso para com o Poder Judiciário supor que os juízes da Suprema Corte aceitariam se desqualificar, perdendo crédito junto ao meio jurídico, se decidissem questões penais de supina importância de maneira a agradar os meios de comunicação e não de maneira a aplicar a Justiça. É o caso, pois, de repetir: tudo o que se pode desejar é que o mais alto Tribunal do País condene quem tiver que condenar, uma vez realmente provada a ilicitude em que tenham incorrido e que absolva quem não deva ter seu nome incluído no rol dos culpados. Não importa se um, muitos ou todos.

Diante da majestade do Poder Judiciário não há e não podem existir partidos políticos, simpatias ou antipatias ideológicas ou pessoais. Tudo tem que se resumir a uma questão muitas vezes difícil de desatar, mas simples em sua concepção: imparcialidade absoluta, independência completa de tudo que seja alheio à prova dos autos. A venda nos olhos, a balança equilibrada e a espada na mão simbolizam perfeitamente a Justiça a que todos os cidadãos têm Direito.

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