Monstro adormecido

Supremo inverte tendência sobre FDE

Autor

  • José Roberto R. Afonso

    é economista professor do IDP (Instituto Brasileiro de Ensino Desenvolvimento e Pesquisa) pesquisador do Capp/Universidade de Lisboa pós-doutorado pela Universidade de Lisboa doutor em economia pela Unicamp.

9 de março de 2010, 6h00

Muito se propõe, e há muito tempo, para alterar a tributação no País. No entanto, um dos aspectos mais relevante do sistema tributário e que raramente é objeto de qualquer proposição de mudança (na verdade, antes disso, nem mesmo é alvo de análises mais extensas e consistentes) é o Fundo de Participação dos Estados – o FPE. Pode-se dizer que é tratado como se fosse um tabu. Muda o comando do governo federal e mudam as propostas de reformas, quase sempre concentradas no imposto estadual sobre circulação de mercadorias e alguns serviços, mas sempre se procura evitar a menor menção, quanto mais esboço de mudança no FPE. Esse quadro pouco muda no Congresso Nacional, considerado como um tema intrinsecamente vinculado à chamada questão regional, que pautou a maior parte dos debates e decisões da Assembleia Constituinte em torno do capítulo tributário.

O temor de mudar o FPE é que venha a desperta anseios e interesses tão díspares e conflitantes dos governos estaduais, afinal o Brasil ainda é um dos países do mundo de mais profunda desigualdade econômica e social, entre regiões e entre famílias. Paradoxalmente, é justamente para encurtar essa distância que o FPE existe. Assim, a Constituição Federal, no inciso II do artigo 161, remete à lei complementar regular o FPE (como o congênere para Municípios – FPM ), “… especialmente sobre os critérios de rateio…, objetivando promover o equilíbrio sócio-econômico”. Em princípio, a matéria deveria ter sido revista depois de promulgada a nova Carta Magna – visto que o parágrafo único do artigo 39 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias determinava que o Congresso votasse tal lei em até um ano. Como não foram aprovados novos critérios de rateio naquele prazo, pouco depois foi editada uma Lei Complementar 62, de 28/12/1989,[1] com claro caráter transitório. O parágrafo 1º do artigo 12º estabeleceu que “os coeficientes individuais de participação dos Estados e do Distrito Federal no … FPE a serem aplicados até o exercício de 1991, inclusive, são os constantes do Anexo Único”. Ou seja, o rateio do FPE foi “congelado” em 27 cotas por uma medida confessadamente excepcional, tanto que tinha prazo para sua vigência. O problema é que nunca mais foi aprovada a nova lei complementar para ditar o rateio a partir do exercício de 1992 e o que era provisório se tornou permanente.

Passados mais de 20 anos, o Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade,[2] que é inconstitucional a aplicação de uma tabela rígida de rateio do FPE e que a vigente só poderá ser aplicada até o exercício de 2012. O ineditismo da decisão também envolveu o reconhecimento de que a mera e imediata suspensão dos rateios significaria deixar os Estados sem receber os repasses do FPE, até que o Congresso conseguisse aprovar uma lei de quórum qualificado, e isso implicaria em óbvios e graves danos às finanças dessa esfera de governo. Na prática, aquela Corte não apenas julgou inconstitucional parte da lei, mas condenou a omissão do legislador em ignorar e deixar de regulamentar um comando tão fundamental para a Federação. Ao limitar a vigência do atual rateio até 2012, o órgão máximo do Poder Judiciário considerou que cerca de três anos seria tempo mais do que suficiente para que a sistemática de partilha do FPE seja revista pelo Poder Legislativo.

Antes de entrar no mérito da ação, é interessante comentar o processo de julgamento, recorrendo a juristas que acompanham de perto o STF. Reportaram que raramente a Corte acolheu pedido em ação direta de inconstitucionalidade por omissão (um caso recente envolveu os critérios para a criação de novos municípios, previstos no parágrafo 4º do artigo18 da Constituição).[3] O mais relevante respeita a inovação na técnica de decisão, como foi relatado por assistente qualificado da Corte. “O Tribunal declara a inconstitucionalidade, mas mantém a vigência da Lei por dois exercícios financeiros. Foi preciso fazer isso porque, nesses casos de omissão parcial – ou seja, há lei, mas ela é insuficiente para cumprir o comando constitucional – a retirada da lei é mais prejudicial à ordem constitucional do que a sua manutenção. Imagine se, por exemplo, é apresentada uma ação por omissão parcial em relação ao salário mínimo, que claramente não cumpre os requisitos constitucionais. O Tribunal poderá dizer que há uma omissão inconstitucional, mas não poderá declarar a nulidade da lei e do valor do salário vigente, pois isso seria mais desastroso do que a manutenção do estado atual. Então, nesses casos, a única alternativa acaba sendo a manutenção da vigência da lei até que o legislador faça outra, cumprindo o mandamento constitucional.”

O julgamento sobre o FPE também foi emblemático pela dimensão do objeto da ação: talo fundo é formado por 21,5% do produto da arrecadação da União dos impostos de renda e sobre produtos industrializados, o que significou, no último ano de 2009, um repasse de R$ 45,3 bilhões, equivalente a 1,4% do PIB brasileiro.[4] Mesmo descontados uns quintos vinculados para o ensino básico, o montante líquido equivale a 13% de toda a receita tributária disponível do conjunto dos Estados brasileiros, ou 22% da receita deles no ICMS e quase o dobro que arrecadam de IPVA. Esses índices nacionais, porém, escondem uma importância relativa muito maior do FPE em relação àqueles estados menos desenvolvidos: assim, tal repasse equivale a cerca de um quarto da receita corrente dos Estados do Nordeste e 30% do Norte, sendo que, por unidade federada, responde por quase metade da mesma receita de estados como Roraima, Amapá e Acre; em torno de 40%, no Tocantins e Piauí; e mais de 30% no Maranhão, Paraíba, Alagoas e Sergipe. [5]

A base da decisão do STF foi muito simples: o rateio do FPE vem sendo feito sem critérios. Nem é preciso recorrer a análises jurídicas ou fiscais, basta a gramática para saber que uma tabela, com uma porcentagem fixa para cada unidade federada, que nunca muda, não se trata de um critério de rateio. Se esse havia, era político, na essência.

Aliás, vale recorrer aos anais parlamentares para ler na justificativa da proposição do projeto de lei complementar e também nos pronunciamentos durante as suas votações[6] que a citada tabela com coeficientes rígidos foi acordada entre os representantes dos Estados, reunidos no CONFAZ – Conselho de Política Fazendária (colegiado das respectivas Secretarias de Fazenda). Foram arbitrados, dentre outros aspectos, que 85% do Fundo caberiam aos estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, enquanto 15% ao Sul e Sudeste, [7] e que a cota-parte de São Paulo seria reduzida para 1% para elevação da cota de alguns dos outros (como Espírito Santo), relativamente ao que era aplicado até então.

As razões para tal arbitragem em 1989 remontam à Assembleia Constituinte. Quando instalada, o FPE recebia 14% da arrecadação do IR mais IPI. Na primeira fase dos trabalhos, a Subcomissão de Tributação elevou essa fatia para 18,5% e limitou o rateio apenas para as unidades com renda per capita inferior à média nacional.[8] Na fase seguinte, a comissão temática de Tributos, Orçamentos e Finanças acabou por aumentar novamente a repartição do fundo para 21,5% dos impostos mas eliminando qualquer restrição no rateio.[9] Nada mais mudou nas etapas seguintes e assim foi promulgado na Constituição de outubro de 1988. Portanto, a disputa regional determinou uma maior descentralização de recursos (depois atenuada pela política federal de explorar cada vez mais contribuições não compartilhadas) e balizou a cota que caberia àquelas 3 regiões (arredondando 18,5 por 21,5). [10]

Retrocedendo um pouco mais, menciona-se que o FPE foi criado pela reforma tributária de 1965, com autênticos critérios de rateio – ver arts. 88 a 90 da Lei nº 5.172, de 25/10/1966 (o Código Tributário Nacional) . O fundo era redividido segundo 3 parâmetros: superfície (5%), população (47,5%) e inverso da renda por habitante (47,5% do total). Algum redirecionamento já aparecia na concepção do fundo para beneficiar as unidades menos populosas e menos desenvolvidas (por acaso, dos governos mais fiéis à ditadura militar): por exemplo, nenhum estado contaria como tendo menos de 2% da população nacional (beneficiaria 15 estados hoje) e nenhum poderia ter mais que 10% (penalizaria os 2 maiores).[11] Nos anos 70, foi criada uma reserva para ratear 20% do FPE apenas entre os do Norte e Nordeste.[12]

Recuperar rapidamente esse passado pretende apenas para ilustrar como já se teve critérios de rateio no FPE. Os do CTN foram revogados pela Lei de 1989: é preciso ficar bem claro que a decisão do STF não levanta a menor hipótese de ressuscitar aqueles critérios, independente de suas fórmulas ou lógicas. Isto significa que o STF não escolheu entre este ou aquele rateio, sua decisão nada tem a ver com quanto cada estado recebia e nem implica em determinara quanto receberá no futuro. A decisão, que pode ser considera histórica, do STF é que foram omitidos os critérios e ficou só o rateio no FPE, arbitrado (politicamente) em torno de uma tabela rígida, que ignora as mudanças e as distâncias entre os Estados, logo, não atende ao preceito básico de reequilibrar as finanças e as condições de governabilidade entre seus governos.[13]

O FPE passou mais de duas décadas ignorando que as economias das diferentes regiões, Estados e localidades evoluíram de forma muito diferenciada, como é natural. Por exemplo, segundo o IBGE,[14] em 1985, só duas regiões (Sudeste e Sul) e seis estados (São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Rio Grande do Sul, Amazonas e Santa Catarina) tinham PIB per capita acima do nacional. Esse quadro mudou muito em 2007 (último ano para o qual o instituto publicou o PIB per capita), passando o Centro-Oeste a superar média nacional (enquanto o Nordeste ficou ainda mais distante)[15] e mudando o conjunto de estados: caiu Amazonas e subiu Mato Grosso, Paraná e Espírito Santo, sem contar que, na liderança do ranking do maior PIB per capita, passou para o Distrito Federal, com 2,8 vezes a média brasileira, superando de longe a São Paulo, há 1,56 vezes daquela média.

Como aqui ilustrado, a expansão da fronteira agrícola e dos serviços, desconcentração da indústria, várias mudanças ocorreram na economia e na sociedade e são ignorados pelo mecanismo que deveria fechar a equação fiscal, o FPE, de forma a redistribuir recursos para os governos que podem arrecadar menos que os demais. [16]

Como visto nesta brevíssima história do rateio do FPE, certa dose de arbitrariedade tem sido uma marca característica do rateio do FPE, desde seu desenho no auge da ditadura militar, até mesmo pós-redemocratização, se valendo da desproporção entre assentos no Congresso e divisão da população. Tal opinião não significa criticar o comando constitucional que corretamente atribui uma função redistributiva ao FPE, muito pelo contrário, só se defende que o ideal seria perseguir tal objetivo de diminuir a distância entre os desiguais segundo critérios que fossem eminentemente técnicos, consistentes e coerentes.

Esse contexto lembra a tradicional brincadeira de crianças que gritam: Estátua! Tal grito foi dado em 1989 e não mais foi suspenso, até que o STF gritasse mais alto e dissesse que rateio sem critério é inconstitucional, assim como o Congresso se omitir de regulamentar uma matéria que ele mesmo avocou a si, quando propôs e aprovou ao final da década passada a citada lei.

Novos critérios para o FPE devem ponderar o potencial e a efetiva arrecadação direta e as necessidades de cada ente federado. Isto significa ampliar o leque de trabalho, que não pode ficar restrito apenas a tais transferências, mas precisam considerar também receitas e gastos. O cenário político também mudará radicalmente em relação ao que tem vigorado nos últimos anos e décadas. Por força da decisão do STF, quisessem ou não, logo no início dos mandatos dos futuros Governadores (bem assim do futuro Presidente da República), eles precisarão negociar muito entre si, acordar e pressionar o Congresso para aprovar uma nova lei complementar (quorum qualificado). Se ponderados critérios técnicos, inevitavelmente isso deveria levar a se repensar junto também o ICMS.

Naquilo que todos sempre temeram tocar e por muito tempo, o STF foi muito corajoso, inverteu a tendências das iniciativas políticas, puxou o FPE para o centro do debate político e federativo. Há uma hipótese razoável que o acordo em torno dos novos critérios de rateio do FPE possam representar a ponta do barbante a ser puxado para desatar o nó que tem sido a tão embaralhada reforma tributária nos últimos tempos. Quem antes era supostamente contra mudanças, de repente precisará mais que nunca aprovar mudanças. Assim, a inédita decisão do STF pode forçar o avanço da reforma que todos sabem ser necessária mas muitos preferem se acomodar na omissão do que enfrentar a transformação.


[1] Ver: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp62.htm

[2] A matéria foi relatada pelo Presidente do STF Ministro Gilmar Mendes. O Ministro Marco Aurélio ficou vencido apenas em uma parte, não fundamental do julgamento. O art. 2º e o Anexo da LC 62/89 foram declarados inconstitucionais por omissão parcial, mas sem a pronúncia da nulidade, mantendo sua vigência por mais dois exercícios financeiros, começando do próximo (2011). A decisão do STF foi provocada por quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) ajuizadas pelos Estados do Rio Grande do Sul (ADI 875), de Mato Grosso e Goiás (ADI 1987), do Mato Grosso (ADI 3243) e de Mato Grosso do Sul (ADI 2727). Um resumo das ações foi divulgado no portal da Corte: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=120714

[3] A regulamentação dos novos Municípios foi objeto da ADI nº 3682. Foi mencionado, ainda, que outro seria o caso de Mandato de Injunção, tendo os mais recentes tratados do direito de greve dos servidores públicos (MI 708, art. 7º da const.) e da aposentadoria especial (MI 725, art. 40, § 4º) – aliás, este último com projeto de lei encaminhado ao Congresso recentemente.

[4] Desse total, 20% foram redirecionados diretamente aos fundos de financiamento do ensino básico, o chamado FUNDEB, conforme previsto em emenda constitucional recente. Líquido dessa vinculação, o montante repassado a título de FPE foi de R$ 36,2 bilhões. A STN divulgada dados detalhados sobre a formação do fundo e a entrega dos recursos em seu portal: http://www.tesouro.fazenda.gov.br/estados_municipios/transferencias_constitucionais.asp

[5] Dados da execução orçamentária por Estado, até 2008, são divulgados pela STN em: http://www.tesouro.fazenda.gov.br/estados_municipios/download/exec_orc_estados.xls

[6] Para resumir em uma só citação, vale a publicada por Firmo de Castro, deputado que foi autor do projeto que deu origem a LC 62/1989, no capítulo “Repartição da Receita Tributária Federal”, Relatório da Comissão Executiva da Reforma Fiscal, DBA Dorea Books, 1993, Volume II: “Distribuição regional e estadual dos recursos A função redistributiva do FPE se expressa na destinação, determinada pela Lei Complementar 62/89, de 85% dos seus recursos para os estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e Distrito Federal, conforme se observa na Tabela 2, que contém os coeficientes estaduais de participação fixados diretamente naquele diploma legal. Tal distribuição foi obtida a partir de ajustes introduzidos na repartição anteriormente feita com base na área, população e renda per capita das diferentes Unidades da Federação, após intensas negociações desenvolvidas no âmbito do Confaz, com vistas a uma maior desconcentração regional desse Fundo”. (p.594)

[7] Fizeram parte da mesma negociação entre Estados no CONFAZ o que veio a se transformar em outra mudança legislativa com impacto muito forte na divisão das receitas entre regiões e Estados: a aprovação pelo Senado Federal (Resolução nº 22, de 19/05/1989) de novas alíquotas interestaduais do ICMS estadual, que foram reduzidas, de forma diferenciada (discriminando entre transações dentro do Sudeste e Sul e aquelas realizadas entre este e as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste), de modo a beneficiar proporcionalmente mais os Estados das regiões então menos desenvolvidas. Ver resolução e matriz regional de alíquotas, respectivamente, em:
http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=132875
http://www.sebraemg.com.br/arquivos/parasuaempresa/icms_tabela/tabela.pdf?cod_areaconteudo=1074

[8] O anteprojeto da Subcomissão da Tributação, que elevava a fatia do FPE de 14% para 18,5% do IR/IPI e, o principal, restringia o seu rateio apenas “às unidades federadas cuja renda per capita seja inferior a média nacional” (artigo 21, parágrafo 4º) está disponível em: http://www.camara.gov.br/internet/constituicao20anos/DocumentosAvulsos/vol-150.pdf

[9] O primeiro substitutivo do relator da Comissão da Tributação, Orçamento e Finanças inicialmente, mantinha a partilha em apenas 18,5% mas mudava para apenas 20% a parcela do FPE que seria distribuída apenas aos Estados com renda per capita inferior a média nacional (artigo 21, parágrafo 2º) – nos mesmos moldes da reserva especial para Nortes e Nordeste então vigente. Ver: http://www.camara.gov.br/internet/constituicao20anos/DocumentosAvulsos/vol-142.pdf
Já no relatório final, mudou e subiu a partilha de IR/IPI para 21,5% e, ao mesmo tempo, desapareceu qualquer limitação ou vinculação do rateio em favor apenas de um grupo dos Estados brasileiros. Ver: http://www.camara.gov.br/internet/constituicao20anos/DocumentosAvulsos/vol-145.pdf

[10] Para uma análise das mudanças na tributação na primeira metade da Constituinte, ver deste autor e Fernando Rezende, “A Reforma Fiscal no Processo de Elaboração da Nova Constituição”, Texto para Discussão Interna 121, IPEA, Novembro de 1987: http://www.ipea.gov.br/pub/td/1987/td_0121.pdf

[11] O CTN compreendia duas tabelas com intervalos para calcular os dois fatores representativos: no caso da população, o piso era de 2% da população nacional e o teto de 10% (artigo 89); no caso do inverso da renda per capital, o piso era de 0,0045 da renda per capita nacional e o teto, de 2,5, com onze faixas intermediárias. Se a população era recenseada pelo IBGE, o PIB per capita era medido a cada 5 ou 10 anos pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

[12] Decreto-Lei 1.434 de 11/12/1975, destinou 20% do FPE para os estados do Nordeste e Norte, a partir de 1978, rateados entre si obedecendo aos mesmos critérios aplicados normalmente no Fundo.

[13] A mesma crítica ao abandono de critérios por um rateio rígido é tecida por Luiz Villela, no capítulo “Revisão dos Critérios de Rateio dos Fundos de Participação”, publicado no Relatório da Comissão Executiva da Reforma Fiscal, DBA Dorea Books, 1993, Volume II, do qual vale reproduzir uma citação longa mas muito didática sobre esta questão:
“… Bem ou mal, até então haviam critérios de rateio dinâmicos, que só eram distorcidos pelos coeficientes mínimos e máximos fixados e pela defasagem e questionável precisão dos dados relativos ao PIB a nível estadual. Mudanças na posição de um estado em relação aos demais eram periodicamente levadas em consideração, e os coeficientes, recalculados.
A partir de 1990, com a edição da Lei Complementar 62, de 28-12-89, foram simplesmente fixados os coeficientes de rateio para cada estado, de forma a transferir 85% do FPE às Unidades da Federação das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e 15% aos estados das regiões Sul e Sudeste. Trata-se de um critério de rateio estático que reforça ainda mais as distorções na distribuição do FPE, já existentes com o critério anterior.
Essa lei determina que o rateio, segundo coeficientes fixos, deveria vigorar até 1991; a partir de 1992, com base nos dados do Censo de 1990, uma lei específica deveria fixar novos critérios de distribuição do FPE. Com o atraso na realização do Censo, houve prorrogação do prazo de vigência dos coeficientes de rateio fixados pela citada lei complementar.
É importante ressaltar que, independentemente das informações a serem proporcionadas pelo Censo Demográfico realizado em 1991 e ainda em fase de tabulação, é fundamental o estabelecimento de novos e verdadeiros critérios de distribuição, e não somente a fixação em lei de novos coeficientes de rateio. Mais ainda, os novos critérios devem corrigir as distorções atualmente verificadas na distribuição do FPE, coadunando-se com os objetivos claramente estabelecidos na Constituição Federal.” (p.622)
“… Em resumo, as distorções na distribuição dos recursos do FPE entre os estados resultam de:
(a)  existência de coeficientes mínimos e máximos correspondentes à posição relativa da população e do inverso da renda per capita dos estados em relação à média nacional;
(b) prefixação rígida na distribuição de 85% ao NO, NE e CO, e de 15% ao S e SE;
(c)  utilização de dados de renda per capita estadual que só podem ser apurados, no mínimo, a cada cinco anos, ficando disponíveis com grande atraso, sem considerar a sua confiabilidade.” (p.624)

[14] O IBGE passou a calcular o PIB por Estado em caráter anual, no lugar da FGV (que calculava a cada 5 ou 10 anos), somente a partir de meados dos anos 80. Os dados primários do PIB per capita de 1985 e 2007 podem ser, respectivamente, obtidos nas seguintes páginas no portal do IBGE:
ftp://ftp.ibge.gov.br/Contas_Regionais/1985_a_2003/Especiais/Especiais.zip
ftp://ftp.ibge.gov.br/Contas_Regionais/Referencia2002/2003_2007/tab02.zip

[15] O PIB por nordestino, que estava a 48,5% do brasileiro em 1985, ficou um pouco mais distante em 2007: 46,7%. Na região, Sergipe ainda é o estado que apresenta o maior PIB per capita, porém, sofreu uma queda significativa no período, segundo o IBGE (de 93,1% para 60,2% da média nacional, no mesmo período). Não custa recordar que Isso não quer dizer que o PIB per capita do estado tenha diminuído entre estes dois anos; mas ele caiu relativamente à média nacional da renda per capita ( isto é, cresceu menos que a média nacional).

[16] À conclusão semelhante também chegou Sérgio Prado, Waldemir Quadros e Carlos Eduardo Cavalcanti, em “Partilha de Recursos na Federação Brasileira”, Editora FUNDAP/FAPESP/IPEA, São Paulo, 2003, do qual vale reproduzir o seguinte:
“O aspecto que mais se destaca, contudo, já apontado, é o enorme aumento das desigualdades horizontais, isto é, entre estados da mesma região, como resultado da distribuição do FPE…..
Os atuais critérios de rateio, além de serem fixos, isto é, além de não incorporarem nenhum componente dinâmico, foram estabelecidos a partir de ajustes feitos no percentual que, pelos critérios anteriores, caberia a cada estado….
Vale lembrar que a LC n. 62/89 determinou que o rateio segundo os coeficientes fixos vigoraria até 1991 e que, a partir de 1992, com base nos dados do Censo de 1990, uma lei específica estabeleceria novos critérios. Com o atraso do Censo, foi prorrogada a vigência dos referidos coeficientes, que até 1998 ainda permaneciam em vigor. Pode-se supor que essa prorrogação dos critérios de rateio fixados pela LC n. 62/89 decorra, sobretudo, de as diferentes partes interessadas estarem à espera de alguma reforma tributária.
Uma outra crítica ao FPE diz respeito a não incorporar, como um dos critérios de rateio, o esforço fiscal de cada estado.”

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