Tratamento isonômico

Multa do artigo 475-J exige intimação do advogado

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1 de março de 2009, 7h14

Artigo 475-J do Código de Processo Civil — Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no artigo 614, inciso II, desta lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação”.

Não obstante a intenção do legislador em proporcionar maior celeridade à prestação jurisdicional executiva com a criação da multa do artigo 475-J do Código de Processo Civil, melhor sorte não lhe assistiu na redação do mencionado dispositivo legal, eis que sua forma dispositiva abre margem para um sem número de interpretações e aplicações por nossos tribunais nacionais, o que faz necessária uma ponderação de valores sobre o equilíbrio entre os princípios da segurança jurídica e da celeridade processual, analisando ainda se eventual desarmonia não poderia infringir o princípio da isonomia, todos esses princípios já inseridos no rol dos direitos e garantias fundamentais do artigo 5º de nossa Constituição Federal.

Antes de adentrarmos no mérito do termo a quo para a aplicação ou não da multa em comento, interessante trazer à baila as definições dos princípios constitucionais invocados.

Conforme conceituação do eminente ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça José Augusto Delgado [1], “a segurança jurídica, em um conceito genérico, é a garantia assegurada pela Constituição Federal ao jurisdicionado para que uma determinada situação concreta de direito não seja alterada, especialmente quando sobre ela exista pronunciamento judicial”.

Em relação ao o princípio da celeridade processual, por meio de perfunctória análise do artigo 5º da Constituição Federal, pode-se afirmar que a todos são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, uma vez que a morosidade na entrega da prestação jurisdicional pode equivaler à ineficácia ou inutilidade do próprio provimento.

Já o princípio da isonomia se caracteriza pela igualdade atribuída a todas as pessoas, perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, no plano processual, significa que o juiz deve dispensar tratamento idêntico às partes da relação processual, de modo a conferir eficácia ao disposto no artigo 5º, caput, da Constituição Federal.

Partindo de uma premissa maior, que no caso em comento é a Constituição Federal, se faz necessário um atingimento de equilíbrio entre a aplicação do princípio da celeridade processual e o princípio da segurança jurídica, de modo que se consiga alcançar celeridade e efetividade na prestação jurisdicional sem que se crie uma insegurança jurídica na interpretação de uma regra estritamente processual, qual seja o momento inicial para a contagem do prazo do artigo 475-J do CPC.

Ressalvados os casos previstos em lei, v.g., os prazos diferenciados para os entes públicos e autarquias, a aplicação da codificação processual deve ser aplicada de forma isonômica entre os litigantes no meio jurídico, o que me parece não ocorrer atualmente no que se refere à aplicabilidade da multa constante no bojo do artigo 475-J.

Não obstante decisão já emanada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial 954.859 (2007⁄0119225-2) no qual expôs entendimento de que independe de citação pessoal ou intimação do advogado para o início da contagem do prazo de quinze dias para pagamento de condenação por quantia certa, cabendo ao vencido cumprir espontaneamente a obrigação, não nos paira qualquer dúvida que tal decisão possui caráter orientador e não vinculante.

Caso assim não fosse a divergência de decisões e interpretações no que tange ao dies a quo não continuaria ocorrendo em nossos tribunais estaduais.

Analisando recentes decisões emanadas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo já encontramos julgados nos quais prevalece o entendimento da necessária intimação do advogado da parte, não deixando assim de aplicar o princípio da celeridade processual bem como prestigiando o princípio da efetividade do processo, conforme se depreende da leitura do julgamento do agravo de instrumento 1.184.073-0/4 julgado em 15/01/09 e do agravo de instrumento 1.215.632-0/9 julgado em 28/01/09.

De outra banda, o mesmo Tribunal decidiu pela desnecessidade da intimação do advogado conforme se vê no julgamento do agravo de instrumento 7.303.984.600 de 26/01/09.

Dessa forma entendo que há atingimento nuclear ao princípio da isonomia, pois uma matéria de ordem processual vem sendo aplicada de forma diferenciada para casos análogos.

Urge nos dias atuas a necessidade de medidas inovadoras e eficazes que visem uma maior efetividade na prestação jurisdicional, como é caso do artigo 475-J do Código de Processo Civil, todavia, devido a sua redação dúbia, sua forma de aplicação vem sendo muito debatida em nossos Tribunais, bem como por nossa doutrina.

Nessa seara defendemos o entendimento que o início do prazo deve se dar somente a partir da intimação do advogado da parte seja da publicação do trânsito em julgado da decisão, seja da publicação “cumpra-se o acórdão/decisão”, uma vez que nenhum óbice ou retardamento processual resultaria de tais situações.

Acreditamos que esse entendimento não está à margem do espírito da nova legislação, eis que visa instituir celeridade dentro de uma segurança jurídica, oferecendo assim tratamento isonômico neste tipo de situação processual, o que deve ser sempre almejado por todos aqueles que operam no meio jurídico.

Referência

[1] DELGADO, José Augusto. O princípio da segurança jurídica. Supremacia Constitucional. Palestra proferida no XXI Congresso Brasileiro de Direito Constitucional – “O Direito Constitucional do Século XXI”, em 21 de maio de 2005. Disponível aqui. Acesso em: 19 fev. 2009.

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