Justiça eletrônica

Temo que a informatização exclua o Amazonas

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26 de janeiro de 2009, 9h53

Com apenas seis meses de Superior Tribunal de Justiça, o ministro Mauro Campbell Marques diz estar perfeitamente adaptado à maratona de trabalho imposta aos integrantes do STJ. “A corte é o tribunal da cidadania, mas o cidadão não sabe que os ministros amanhecem e anoitecem no tribunal para fazer frente à avalanche de processos que recebem anualmente”, disse em entrevista publicada pela assessoria de imprensa do STJ no site do tribunal.

O STJ recebe, por ano, mais de 300 mil processos de todas as partes do país. Uma realidade que promete ser amenizada com a adoção de modernos procedimentos administrativos e processuais. Para Mauro Campbell, as perspectivas para 2009 são as melhores possíveis, sobretudo a partir do segundo trimestre, quando o tribunal sentirá com mais segurança os reflexos da Lei dos Recursos Repetitivos e da consolidação do processo eletrônico. “Certamente em 2009 poderemos debater as teses jurídicas com maior profundidade e qualificar ainda mais as discussões em torno de temas realmente relevantes”, ressalta o ministro.

Mauro Campbell não questiona a quantidade, mas os temas que envolvem milhares de processos que chegam ao STJ. Para ele, o STJ foi criado sim com a finalidade de receber milhares de processos por ano, mas processos que realmente devam chegar a um tribunal superior para que as teses jurídicas sejam exemplarmente discutidas e adotadas pela comunidade jurídica com a maior segurança possível. “A instância STJ deve ser usada com a prudência e com a responsabilidade que ela merece.”

Segundo Mauro Campbell, a determinação do STJ em garantir a segurança jurídica de suas decisões vem levando o poder público — União, estados e municípios — a profissionalizar cada vez mais a sua área jurídica, qualificando a advocacia pública e aprimorando os mecanismos de conciliação nos contenciosos administrativos. “Estamos vivenciando uma mudança extraordinária de comportamento. Não podemos mais sustentar posições jurídicas dissociadas da nossa realidade”, enfatiza.

Informatização e processo eletrônico

Mauro Campbell é defensor da informatização e do processo eletrônico, mas, como um legítimo “caboclo” amazonense, ele não esconde sua preocupação em relação à região amazônica, onde a internet ainda está longe do cotidiano das comunidades. Preocupação, aliás, que já foi devidamente manifestada ao presidente do STJ. “Dos 62 municípios amazonenses, a internet funciona precariamente apenas em Manaus e Parintins, nos demais ela sequer funciona. Temo que a informatização exclua essa parcela da população que, por menor que seja, é formada por cidadãos brasileiros”, alerta.

Segundo o ministro, que por três vezes foi procurador-geral do estado do Amazonas, apesar das sistemáticas ações ajuizadas pelos Ministérios Públicos estaduais, até hoje as empresas de telefonia que atuam na região não cumpriram o edital de privatização que determinou a realização de investimentos maciços nas áreas de difícil acesso, sobretudo na Amazônia. “A expectativa é que isso se resolva o mais brevemente possível, mas, infelizmente, o caboclo que reside no interior do estado ainda não tem acesso à rede mundial de computadores”, lamenta.

Julgamentos

O primeiro semestre de atividade de Mauro Campbell no STJ foi marcado por julgamentos importantes. Entre os julgamentos dos quais participou, o ministro destaca o que estabeleceu que a revalidação do diploma estrangeiro no país não é um procedimento automático e deve seguir o regramento estabelecido pelo Ministério da Educação do Brasil, o que fortaleceu a cidadania brasileira ao reiterar a jurisprudência da casa de que indenizações de tortura são imprescritíveis; e o que declarou que os dados sobre viagens de autoridades em aviões do poder público não são sigilosos, salvo em questões de segurança nacional.

Ele também destacou as várias vezes em que o STJ aplicou multa por litigância de má-fé para coibir processos meramente protelatórios e defendeu a aplicação rigorosa desse mecanismo sempre que a parte utilizar mal a instância superior. “O ideal é que isso não fosse necessário e que os advogados e o poder público agissem sempre eticamente e corretamente. Mas, se temos mecanismos, vamos usá-los sempre que for preciso.”

Para o ministro Mauro Campbell, a grande colaboração que juízes de todas as graduações podem prestar à cidadania brasileira é trabalhar muito, com dignidade, humildade e sensatez. “O cidadão não pode tomar o Judiciário e nós, juízes, como algozes ou como participantes de uma engrenagem capaz de fazer com que ele não receba o pão e a justiça. Ele tem que ver em nós a esperança de que seu pleito será julgado, ou contra ou favor, e que a decisão será efetivamente cumprida.”

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