O calidoscópio jurídico de Euclides da Cunha (4)
28 de agosto de 2009, 7h32

Os biógrafos são unânimes em traçar-lhe o perfil conturbado, o caráter histriônico, o gênio tempestuoso e intempestivo. Mais dramática ainda do que sua vida aventurosa e desventurada foi sua morte, à bala, em tiroteio com Dilermando de Assis, amante de sua mulher, Ana (Cunha e, depois, de Assis, pois que, com a morte de Euclides, veio a casar-se com Dilermando).
No centenário de seu falecimento, neste ano de 2009, foram publicadas algumas obras sobre o seu assassinato (e também sobre o processo da morte de Euclides Filho, que, anos depois de o pai tombar morto, tentou vingar-lhe a morte e, como o autor de Os sertões, foi abatido pelo exímio atirador que era Dilermando de Assis).

Seja como for, em uma série de artigos sobre aspectos jurídicos em Euclides da Cunha, não há como desprezar-se o fim trágico do autor, que redundou em processo judicial – do maior interesse jurídico, evidentemente. Mesmo assim, o assunto deve ser tratado com parcimônia, não como uma historinha policial para entreter o público, ou como gincana, em que os leitores decidem, sem conhecer as peças do processo, se Dilermando deve ser considerado culpado ou inocente… tal qual em programas interativos, em que o público vota no resultado (mais de uma vez, inclusive).
Interesse jurídico centenário
Descartado o interesse folhetinesco que a morte de Euclides da Cunha e de Euclides filho possa despertar, é curioso observar a riqueza de debates jurídicos que os processos vêm produzindo no centenário de morte do autor de Castro Alves e seu tempo.

A denúncia contra Dilermando de Assis (que, num primeiro momento, chegou a ser considerado culpado), o relatório do delegado que presidiu o inquérito policial, a pronúncia do réu, o libelo acusatório e a defesa do consagrado criminalista Evaristo de Moares integram a primeira parte do livro, antecedida pela rica apresentação da professora Walnice Galvão, explicando circunstâncias históricas da chamada “tragédia da Piedade” (nome do bairro em que moravam Ana e Dilermando quando ocorreu a morte de Euclides), além de aspectos biográficos e bibliográficos de Euclides.
A segunda parte da obra traz a corte de apelação, a primeira sentença absolutória, a apelação, o parecer do procurador geral da Justiça, o acórdão anulando o júri e a segunda sentença absolutória. Tudo temperado com depoimentos vários, de Ana, de Dilermando, de parentes e de testemunhas, além de fac-símiles de peças processuais. Uma aula de direito em forma de livro, enfim.

Além do processo contra Dilermando pela morte de Euclides, o livro traz também informações sobre o processo em que o militar é acusado pela morte do filho de Ana e Euclides da Cunha (em ambos os casos, vale lembrar, foi absolvido por legítima defesa).
Recheado com informações biográficas dos envolvidos, o livro traz importante debate doutrinário sobre o conceito de legítima defesa. E mais: atualiza a discussão acerca dos chamados crimes passionais, ainda tão frequentes. E a autora assume claramente posição de ataque contra o machismo ainda reinante em pleno século XXI, pois que, ainda hoje, se mata (supostamente) por amor.
É evidente que os fatos trágicos relacionados à morte de Euclides da Cunha não podem macular a importância de sua obra literária, histórica, geográfica… etc…. etc… etc… e também jurídica (como vimos, à farta, nos artigos anteriores desta série). Paralelamente ao interesse jurídico que os processos em que Dilermando de Assis figura como réu e Euclides pai e Euclides filho, como vítimas, vale a pena ler e reler a rica obra deste monstro sagrado das letras pátrias. Ser humano cheio de contradições e virtudes, escritor sem par na literatura universal, Euclides da Cunha merece mais do que nosso respeito, merece ser apreciado e estudado. A obra impressa toda é um primor de inteligência, ciência e arte.
Justiça seja feita!
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