Parquet bipolar

Eleição expõe fraturas do Ministério Público paulista

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23 de março de 2006, 17h15

Ocorre no próximo sábado (25/3), entre 8h e 17h, a eleição para o novo procurador-geral de Justiça de São Paulo. Votam 1.694 membros do MP paulista. São 1.492 promotores e 202 procuradores.

A eleição assinala, ou até mais que isso, epigrafa, a volta daquela bipolaridade de gume afiado que todos supunham enterrada no “decorum” do Parquet paulista: a disputa entre facções simpáticas ao tucanato e as antigas trupes fleuro-quercistas — que nos anos 80 e 90 chegaram ao poder, sob os governadores Orestes Quércia e Fleury Filho, levando a pecha de “A República dos Promotores”.

Concorrem ao cargo os procuradores Luis Daniel Pereira Cintra (www.luisdaniel.com.br), Carlos Henrique Mund, René Pereira de Carvalho e Rodrigo César Rebello Pinho (www.rodrigopinho.com.br) — atual ocupante do cargo, tido e havido como favorito na disputa.

Os detratores de Rodrigo Pinho, na campanha, o apontam como um real, porém inautêntico, herdeiro do tucanato — já que Pinho sempre foi a menina dos olhos do ex-procurador-geral de Justiça, Luiz Antônio Guimarães Marrey, hoje secretário de Negócios Jurídicos do prefeito paulista José Serra. Se real, por que inautêntico? Porque, para manter sua independência, Pinho não teve a mínima paúra de denunciar aquela sim autêntica menina dos olhos do tucanato, o secretário de segurança Saulo Abreu, por abuso de autoridade.

Essas consubstanciais críticas a Rodrigo Pinho param na esfera da simpatia política e, deveras, fica por aí. Já não se pode dizer o mesmo dos candidatos mais aguçados, Luis Daniel Pereira Cintra e Carlos Henrique Mund. Contra estes, alguns fatos pontuais chegam a causar um singular estupor.

Vejamos o caso de um candidato até que bem fortinho nessa campanha, Carlos Henrique Mund. Assim como o outro candidato de fôlego, Luis Daniel Pereira Cintra, é apontado pelos seus pares como um filistino e ativo membro da Associação Paulista do MP — tida como herdeira presuntiva daquela linhagem dos procuradores-engavetadores pemedebistas, que sob Quércia e Fleury não pestanejavam em procrastinar quaisquer investigações do MP que ralassem, mesmo levemente, os calcanhares do Palácio dos Bandeirantes.

Tanto que, quando governador, Mario Covas não nomeou o procurador-geral mais votado, Emannuel Burle Fillho, por sabê-lo herdeiro desses corifeus. Quem levou foi Luiz Marrey, pai espiritual de Rodrigo Pinho.

O candidato Carlos Henrique Mund é deveras polêmico. Como Fleury Filho, também é procurador oriundo das hostes da PM. Foi bombeiro. A revista Consultor Jurídico foi buscar na crônica do massacre do Carandiru aquela que é tida como a peça mais controvertida produzida por um procurador: o parecer de Carlos Henrique Mund ao recurso interposto pela defesa do mandante do massacre, o coronel Ubiratan Guimarães.

À página 19 de sua manifestação, o procurador que foi corregedor do MP escreveu o seguinte: “a operação não foi desastrosa sob o aspecto de planejamento militar, foi um sucesso, haja vista que não houve sequer uma baixa fatal por parte dos componentes da PM”. Já à página 41 do mesmo libelo, ele prossegue “a operação militar foi perfeita, e essa avaliação foi feita pela autoridade competente, qual seja o Comando-Geral da PM”. Basta dizer que tais linhas foram usadas pelo advogado Vicente Cassione, do coronel Ubiratan Guimarães, para livrá-lo da pena de meio século que lhe fora outorgada em primeira instância.

Se o outro candidato, Luis Daniel, não é polêmico nesse grau, conseguiu produzir uma curiosa ruga em sua carreira que agora aflora, é óbvio, na campanha: ano passado, enquanto diretor da Escola Superior do MP paulista, convidou 50 membros do MP para um “tudo-pago” em Angra dos Reis, em que se discutiria “Fraudes em Seguros”. Detalhe: Luis Daniel, um ex-assessor do procurador-geral predileto de Fleury Filho, o dr. Burle, só não avisou ao promotor que não lia jornais que o patrocinador da viagem mirífica era a Federação Nacional das Seguradoras, então famosa em meter os pés pelas mãos numa fraude que até pela federal Agência Brasileira de Inteligência, a Abin, teve de ser apurada.

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