Jornalista mostra versão dos militares da Guerrilha do Araguaia
9 de março de 2006, 13h18
O jornalista Hugo Studart lança, pela Geração Editorial, a obra A Lei da Selva, de 382 páginas, neste sábado (11/3), na Bienal do Livro em São Paulo. Studart passou oito anos se metendo com homens de quepe e arquivos inéditos da Guerrilha do Araguaia, para epigrafar na história do Brasil simplesmente algo a que jamais havíamos franqueado acesso: a versão dos militares sobre a Guerrilha. A Guerrilha durou entre 1972 e 1974. No conflito tombaram mortos 90 brasileiros, e ainda há 70 corpos desaparecidos na mata.
Em A Lei da Selva, Hugo Studart traz à luz detalhes sobre a mobilização das tropas, os combates, as prisões de guerrilheiros e as execuções de prisioneiros. Revela, ainda, a até agora secreta identidade dos comandantes militares em cada uma das três campanhas e também a cadeia de comando na fase em que o Exército recebeu ordens de não fazer prisioneiros. Relata também episódios polêmicos, que tanto as Forças Armadas quanto o PCdoB até hoje tentam esconder.
A revista Consultor Jurídico publica com exclusividade os trechos do livro que redesenha essa história, escrita (como diziam os assassinos do jornalista Apulcro de Castro, no século 19) “a punhal, cacete e bala”.
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RESUMO DO QUE FOI A GUERRILHA
Tanto os militares quanto o PC do B dividem a guerrilha em três campanhas distintas.[1] A primeira, iniciada em abril 1972, se deu quando as forças oficiais – Exército, Marinha e Aeronáutica – promoveram manobra de reconhecimento, integrada basicamente por conscritos, recrutas de 18 e 19 anos. Houve várias missões de reconhecimento, batizadas com nomes como Operação Peixe, Ouriço e Olho Vivo. Para os militares quase tudo deu errado. Mobilizaram 170 homens e foram embora em 40 dias. Os guerrilheiros comemoraram a vitória. Os militares, então, começaram a ocupar a região com operações de apoio social à população abandonada, enviando médicos, dentistas e sanitaristas. Batizaram essas ações de Operação Presença.
A segunda campanha, a Operação Papagaio, ocorreu entre setembro e outubro de 1972, quando o Exército voltou para realizar manobra de treinamento em campo de batalha real, desta vez com tropas profissionais – uma brigada de infantaria, forças especiais da Brigada Pára-quedista, um contingente de fuzileiros navais e uma Ala Numerada da Força Aérea. Nada menos que 3.260 homens combateram por 12 dias, todos regularmente fardados, na maior mobilização militar do País desde a II Guerra Mundial.
Nessas duas campanhas, 17 guerrilheiros morreram[2] e onze foram presos. Também morreram dois militares[3] e três moradores da região, nenhum desses em combate. Dois camponeses teriam cometido suicídio na prisão;[4] um terceiro teria sido executado pelos guerrilheiros, acusado de colaborar com o governo.[5]
Até esse ponto, os fatos teriam ocorrido dentro da normalidade de uma guerra convencional — até onde se pode considerar “normal” uma guerra fratricida e desproporcional em contingentes, humanos e materiais. Mas as Forças Armadas ainda combatiam com tropas fardadas. Enterravam nos cemitérios de Xambioá e Marabá os guerrilheiros que morriam em combate, ainda que sem identificação. Todos os prisioneiros dessas duas fases voltaram vivos para as cidades.
Deve-se registrar, contudo, excessos de ambos os lados. Da parte dos militares, prisões arbitrárias, espancamento de moradores, a morte de dois camponeses sob a custódia do Estado, como já dito, além da morte de quatro guerrilheiros que, a rigor, a tropa poderia, com algum empenho, capturar vivos e levar aos quartéis. Da parte dos guerrilheiros, justiçamentos. Um jovem camponês, de 17 anos, que guiou um grupo de militares ao esconderijo dos guerrilheiros, foi capturado, julgado por um Tribunal Revolucionário e executado a golpes de facões. Logo após a segunda campanha, teria havido a execução de mais três camponeses suspeitos de colaborar com o governo,[6] e de pelo menos um companheiro de guerrilha. Sobre essas duas campanhas, a historiografia disponível é rica em relatar e analisar os detalhes.
A partir daí, quase nada ficou registrado. Sabe-se que houve um período de 11 meses sem baixas entre os guerrilheiros, entre novembro de 1972 e outubro de 1973. Os guerrilheiros chamam esse período de “trégua”. As Forças Armadas, contudo, usaram o tempo para promover operações de reconhecimento e de assistência à população. Conseguiram infiltrar no convívio com os guerrilheiros 35 agentes secretos – soldados, cabos e sargentos de carreira, quase todos caboclos, cafuzos e mamelucos, gente vinda das camadas populares da sociedade, muitos deles conhecedores dos traquejos dos camponeses e moradores da floresta. Essa grande ação de espionagem e infiltração foi batizada de Operação Sucuri.
A terceira campanha, a Operação Marajoara, decidiu o episódio. A 7 de outubro de 1973, 750 membros das tropas especiais do Exército,[7] escalonados em três grupos de 250 homens, operando em rodízio, entraram na selva em trajes civis com a única missão de extirpar os guerrilheiros, com máximo rigor e precisão cirúrgica. Saíram de lá em fins de setembro de 1974, com a guerrilha completamente dizimada. Foi nesse período de um ano que teriam ocorrido violações sistemáticas dos Direitos Humanos e das Convenções de Genebra,[8] com tortura, decapitações e execução de prisioneiros. Jacob Gorender assim resume essa campanha:
“Duas derrotas anteriores deixaram evidente que a tática do Exército precisava mudar (…) Ao invés de conscritos bisonhos, agora vinham pára-quedistas em pequenos grupos, protegidos e coordenados, portando fuzis FAL e metralhadoras leves. (…) Cercados, colocados na defensiva, sem qualquer possibilidade de reposição de baixas (ao contrário do inimigo), os guerrilheiros iam sendo dizimados.”[9]
O DIA D
O Dia D foi marcado para 7 de outubro de 1973 – de acordo com o Dossiê Araguaia — e a partir de então, seguindo o jargão militar, todos os preparativos antes e os acontecimentos depois seriam chamados de D menos cinco, por exemplo, ou D mais três. Poucos fatos na história brasileira foram tão cobertos de sigilo quanto o desembarque no Araguaia nessa Terceira Campanha. O Dossiê revela que a operação teve início, na verdade, ao pôr-do-sol do dia D menos um, a 06 de outubro de 1973, quando três aviões C-115, os Buffalo, decolaram da Base Aérea do Galeão levando uma Companhia, com 110 homens, da Brigada de Pára-Quedistas. Desembarcaram em Xambioá. No Dia D menos quatro[10], já haviam partido da Base Aérea de Brasília partiram dois aviões C-47 do Correio Aéreo Nacional, levando um grupo de 48 agentes de informações, 24 em cada aeronave. Um grupo foi para Xambioá, o outro para Marabá. De Belém, 130 homens do Batalhão de Guerra na Selva partiram de caminhão rumo a Marabá. Teriam todos que estar a postos no Dia D.
“A chegada e o desembarque dessa tropa foram realizados de forma a não chamar a atenção da população local”, descreve o Dossiê Araguaia. A coordenação dessa pequena operação de desembarque no Araguaia coube ao brigadeiro Roberto Faria Lima, comandante do Comando Geral do Ar. Até então, os combates no Araguaia eram tão sigilosos que apenas no dia D menos dois, ou seja, véspera do desembarque das tropas, Faria Lima foi procurado pelo brigadeiro Newton Vassallo, chefe do CISA. Só então ficou sabendo que ainda havia uma guerrilha no Araguaia. Superior na hierarquia, duas patentes acima, Faria Lima se mostrou furioso com Vassallo[11] por não ter sido informado antes do problema. Vassallo explicou que, até aquele momento, o assunto estava exclusivamente com o ministro Araripe Macedo. Faria Lima aceitou levar tropas numa missão secreta, portanto, sem que qualquer registro oficial deixasse rastros para a história.
Ao chegarem em Marabá e Xambioá, já de madrugada, os grupos seguiram imediatamente para seus postos de combate transportados em cerca de 30 caminhões emprestados pelos governos de Goiás e do Pará. Nenhum veículo das Forças Armadas foi utilizado na área do conflito. A tropa de operações na selva posicionou-se nas imediações de Bacaba; os pára-quedistas ficaram perto de Xambioá. Ninguém poderia descer dos caminhões para que não fossem vistos pela população. Ninguém usava uniforme militar. Todos eles, sem exceção, portavam identidades falsas. Até os oficiais. E nem mesmo os oficiais superiores sabiam da verdadeira identidade dos soldados.
Antes de o sol nascer, agentes de informações que haviam trabalhado na Operação Sucuri foram incorporados a pequenos grupos, com seis ou sete militares. Cerca de 30 diferentes grupos foram organizados. Entraram imediatamente na mata. Haveria muito trabalho a partir da alvorada. Assim o Dossiê descreve o Dia D:
“No dia 7 de outubro de 1973 foi efetivamente iniciada a 3ª Fase de combate à guerrilha, que teve características totalmente diferentes das duas anteriores. A tropa penetrou na selva descaracterizada, passando a usar trajes civis; cada combatente adotou um codinome, tornando difícil e quase impossível uma identificação posterior através de nome, posto ou graduação. Com exceção do armamento, que era padronizado – e cada grupo possuía um grande poder de fogo – os equipamentos, tais como mochilas, etc, foram utilizados a critério de cada um, considerando que deveriam ser o mais confortável possível, de forma a enfrentar longas caminhadas através da selva”[12]
Quando o Dia D terminou, uma centena e meia de pessoas estava presa. O Exército havia feito um “arrastão”[13] com todos moradores da região suspeitos de colaborar com os guerrilheiros. Eles foram apontados pelos agentes da Operação Sucuri como amigos dos guerrilheiros, ou simplesmente fornecedores de suprimentos. Eram chamados de “apoio”. De início, alguns deles foram colocados em dois buracos cavados ainda nos tempos da Segunda Campanha dentro das bases de Bacaba e Xambioá. As valas tinham três metros de comprimento, dois de largura e três de profundidade. Não havia latrinas. Nem telhado para proteger os ocupantes do sol da Amazônia – ou da chuva. Os buracos foram fechados por grades de ferro. Quase totalidade, contudo, foi mantida fora dos buracos. Todos eles sofreram fortes pressões psicológicas; alguns levaram surras – mas não tortura, algo muito mais grave. Assim relata o Dossiê Araguaia:
“A primeira ação nessa 3ª Fase foi desencadeada no próprio dia 7 de outubro, com a prisão de 160 moradores da região que funcionavam ou eram suspeitos de funcionar como rede de apoio dos guerrilheiros. Essa ação teve como objetivo, além de retirar o apoio da Guerrilha, deixar claro a essas pessoas de que lado estavam a Lei e a Ordem”[14]
“Na reeducação dessas pessoas teve que ser empregado algum rigor, uma vez que o caboclo daquela região só conhecia uma lei: a lei do mais forte. Mesmo porque não havia tempo de usar a psicologia. O Exército queria fazer entender quem, a partir daquele momento, estava mandando. Após, todos os detidos foram liberados e passaram a temer mais ao Exército do que aos guerrilheiros”[15]
Primeiros Combates… e o Comandante Perde o Filho
O primeiro homem a morrer na Terceira Campanha, em 13 de outubro de 1973, foi o guerrilheiro André Grabois, o Zé Carlos, comandante do Destacamento A e filho do comandante-em-chefe Maurício Grabois. Tombou aos 27 anos, em combate com a equipe do Dr. Asdrúbal.[16] Tombaram juntos outros três guerrilheiros, o estudante João Gualberto Calatroni, o Zebão, o estudante Divino Ferreira de Souza, o Nunes, e o camponês Antônio Alfredo Lima.
Três semanas antes do início da Terceira Campanha, José Carlos havia liderado um ataque ao posto da Polícia Militar do Pará na Transamazônica. Os guerrilheiros tocaram fogo no telhado de palha do posto, prenderam os policiais e foram embora com fuzis, munição e roupas. A ação repercutiu na região. Nas primeiras horas do Dia D, Exército já estava engajado na caçada ao grupo de Zé Carlos.[17] Seis dias depois, em 13 de outubro, o grupo estava no sítio do camponês Antônio Alfredo, colaborador dos guerrilheiros. Mataram dois porcos a tiros. A equipe do Dr. Asdrúbal estava por perto. É Asdrúbal quem relata:
“Estávamos quase desistindo de procurá-los. Mas aí escutamos tiros, a menos de 300 metros, e fomos atrás, até enxergamos. (…) Tinham caçado dois porcos, fizeram lá um caçuá grande, para carregar, e estavam senhores da situação. Eu puxava o corpo, rastejando. O cara que estava de costas pra mim, que era o Zé Carlos, estava sentando num toco, com o gorro da PM na cabeça (…) Quando eles ficaram em linha, não dava mais pra rastejar. O Zé Carlos, sentado, estava com um fuzil apoiado nas pernas. Eu me levantei. Ele me olhou. Eu gritei: ‘Fica quieto’. Ele tentou pegar a arma. Um deles atirou. E atirou em mim. Aí pronto. Foi aquele tiroteio desgraçado. Um deles, o João Araguaia, fugiu. O soldado devia ter atirado, mas não atirou. Eu gritava: ‘Atira, desgraçado, atira!’. E o cara não atirou. Ele tremia”.[18]
O grupo foi enterrado à beira da rodovia Transamazônica, nas imediações da base militar de Bacaba – ano e meio depois, teriam sido todos eles exumados para cremação, conforme detalharei adiante. Assim Velho Mário registra em seu Diário a morte, que para ele, seria terrível, a mais dolorosa de todas, a do próprio filho:
“30/10 – Novo acesso de malária e más notícias do DA (para mim particularmente terríveis) deixaram-me em estado de não poder escrever coisa alguma. Hoje, livre do ataque de impaludismo e, em parte, refeito do choque emocional, disponho-me a relatar o sucedido com um grupo de combatentes daquele D. No dia 26, chegaram Joca e Ari, depois de caminharem 12 dias, gastos na ida e na volta, até o ponto com os mensageiros do DA. Jo. relatou que vieram ao local do encontro Piauí e Antonio. O VC daquela unidade guerrilheira contou o seguinte: no dia 13, um grupo chefiado por ZC, composto por Nunes, João, Zebão e Alfredo, dirigiu-se a um depósito para apanhar farinha. No dia anterior, Alfredo e outros combatentes insistiram junto ao C para se matar 3 porcos do D, que estavam numa capoeira abandonada. ZC repeliu com energia a proposta, dizendo que ela afetava a segurança e que “não se devia morrer pela boca”. Por isso, só iriam buscar farinha. No entanto, no meio do caminho, sob pressão de alguns combatentes, deixou-se convencer de apanhar os porcos. E o grupo enveredou capoeira adentro. Então, foram cometidas uma série de facilidades: os porcos foram mortos a tiros, acendeu-se o fogo, não se deu importância ao helicóptero que sobrevoava o local e permaneceu-se demasiado tempo na capoeira. Ainda estavam os guerrilheiros dedicados à tarefa de tratar os porcos quando foram surpreendidos pelo inimigo. João procurou fugir ao ouvir descargas de metralhadora. Mas obteve êxito. Foi ele que relatou o ocorrido. Em sua opinião, os outros 4 combatentes, que não apareceram no acampamento, foram mortos. Assim, o DA foi duramente golpeado. Perdeu seu comandante, homem capaz e um dos mais puros revolucionários. Estava ligado ao P desde os 16 anos e ainda podia dar muito à revolução. Era excelente comandante. O primeiro erro que, no entanto, cometeu, lhe foi fatal. Tinha 27 anos e seu verdadeiro nome era André Grabois. Nunes era a terceira pessoa do D. tinha raras qualidades de combatente e destacava-se por seu espírito combativo. Seu nome era Divino Ferreira de Souza. Tinha 31 anos. Zebão, jovem espirituoso, incorporou-se à guerrilha aos 19 anos e agora tinha 23. Era um guerrilheiro exemplar. Alfredo, que não conheci, era elemento recrutado entre a população local. Eficiente, calmo e corajoso, constituía a melhor aquisição das FF GG entre os camponeses”[19]
Em 24 de outubro de 1973, a equipe de Dr. Asdrúbal conseguiria um novo troféu: a guerrilheira Maria Lúcia de Souza, a Sônia, uma das mais conhecidas do Araguaia. Sua morte, envolta em heroísmo e violência,[20] povoa ainda hoje o imaginário dos guerrilheiros, dos moradores da região e, principalmente, dos militares. Para os comandantes militares, o ato de Sônia, logo na seqüência da reação de Zé Carlos, seria usado como justificativa definitiva para a violência utilizada na repressão aos guerrilheiros do Araguaia. Sobre a morte de Sônia, o ex-ministro do regime militar e ex-senador Jarbas Passarinho disse que “o episódio prova a radicalização e a total inexistência de escrúpulos de ambos os lados”.[21]
O corpo de Sônia foi deixado insepulto no local em que morreu. Ela não foi enterrada pela equipe que a abateu, pois, segundo alegam, era mais urgente salvar a vida do oficial que estava gravemente ferido, o Dr. Asdrúbal, que estava inconsciente, perdendo muito sangue por conta de um tiro que lhe esfacelara o rosto. Ou seja, os militares preferiram usar as energias para salvar a vida do companheiro ainda vivo do que perder tempo com uma inimiga já morta. Até aí, trata-se de um ato sensato. Mas Sônia também não foi enterrada pela equipe que desceu a fim de fotografá-la para reconhecimento posterior em Brasília. Ano e meio antes, o guerrilheiro Osvaldão, tal qual o rei Creonte do mito grego de Édipo,[22] havia proibido o sepultamento do cabo Rosa, sob pena de execução sumária de quem o desobedecesse.[23] Mas Osvaldão, de acordo com os próprios militares, era um terrorista, um bárbaro, um bandido. Já os militares representavam a lei e a ordem — e estavam no Araguaia tentando fazer valer a ordem estabelecida.
Portanto, ao abandonar o corpo de Sônia insepulto, eles estavam cometendo um ato que resultava numa inversão de seus próprios valores – e nesse caso, pouco importa os valores de Osvaldão e dos demais guerrilheiros. O direito natural a um sepultamento honrado é um fator que está impregnado nas raízes helênicas do imaginário ocidental. A importância capital do culto e do respeito pelos mortos está bem ilustrado desde os primórdios da civilização grega, na figura principal da Ilíada, Aquiles, o herói maior dentre os grandes heróis, é portador de uma mácula terrível, a de ter ultrajado o cadáver de Heitor.[24] O culto pelos mortos implica no respeito pelo corpo — e o contrário disso é a profanação.
Os rituais fúnebres sempre foram uma questão essencial no imaginário dos povos. A rede simbólica das mais diversas sociedades sempre institui, cada um a seu modo e em seu próprio tempo, os rituais de culto aos mortos, assim com a defesa intransigente do direito a um sepultamento digno. Mais do que um rito instituído pelo imaginário social, trata-se de um direito universal humanitário. O direito ao sepultamento encontra-se inclusive no Código Penal Brasileiro, que prevê os crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos, tais como violação de sepultura, vilipêndio de cadáver, destruição, subtração ou ocultação de cadáver.[25] Enfim, aquele ato de deixar o corpo de Sônia insepulto seria o primeiro ato indiscutivelmente condenável dos militares no Araguaia, prenúncio do que ainda estava por vir.
Os guerrilheiros perderiam um terceiro homem naqueles primeiros dias. Paulo, codinome de um membro do Destacamento A, desertou. Ele usava uma identidade falsa, com o nome de João Carlos Borgeth. Nem mesmo os próprios companheiros de guerrilha sabiam seu verdadeiro nome. Formara um casal com a Maria Célia Corrêa, a Rosa,[26] que permaneceu na área após sua fuga, foi aprisionada pelos militares e, antes de ser executada, contou que estava no Araguaia para acompanhar o homem que amava.[27] Três décadas depois, os militantes do PC do B ainda acreditam que Paulo fosse espião, infiltrado pelos militares. No início, os próprios militares achavam que ele tivesse sido justiçado pelos guerrilheiros. Em setembro de 2004, um dos militares que ajudaram a elaborar o Dossiê Araguaia descobriu que Paulo estava vivo, trabalhava como acupunturista em Niterói (RJ) e que seu nome verdadeiro é João Carlos Campos Wisnesky.[28] Velho Mário descreveu a deserção de Paulo, numa anotação do Diário de 11 de outubro de 1973:
11/10 – Os mensageiros que trouxeram a informação sobre a ação militar do DA, foram também portadores de uma notícia má. No próprio dia 24, Paulo, que ficara com os demais combatentes que não participaram da ação, fugiu. E fugiu em péssima hora. Esse indivíduo, verdadeiro crápula, que causara os maiores aborrecimentos ao DA, parecia ter se aquietado, embora não merecesse a menor confiança. As suas possibilidades de sair da região são mínimas e acabará caindo em mãos do Exército ou da Polícia. Preso pelo inimigo, Paulo representa um perigo para o DA, pois é covarde e conhece camponeses amigos nossos. Conhece igualmente certas áreas, onde os combatentes costumam circular ou acampar. Na certa, se a reação o pegar, dirá tudo o que sabe. Estou torcendo para que não o prendam. Mais tarde, as FF GG ajustarão contas com esse traidor. Não fosse a ameaça de delação, a fuga desse pusilânime alivia o DA de pesada carga”[29]
Terceirização da Luta: 10 mil por Cabeça
Àquela altura, meados de novembro de 1973, havia 38 guerrilheiros em condições de combate. Nos dias subseqüentes, mais quatro deles seriam abatidos. Arildo Valadão, o Ari, do Destacamento C foi o primeiro[30]. Pode-se dizer que tenha sido a primeira vítima da aliança entre militares e os jagunços. Os GAD deram certo, e os militares foram muito auxiliados pelos moradores da região na caçada aos guerrilheiros. Havia guias remunerados. Não pegavam em armas, apenas guiavam. Havia também os mateiros. Esses andavam armados e iam à frente das patrulhas, como guias. Ganhavam por isso. Os guerrilheiros chamavam os dois grupos – tanto os guias quanto os mateiros – de “bate-paus”.
As novas táticas criadas e recriadas pelos militares não ficariam por aí. A idéia seguinte a ser adotada seria a terceirização da caçada aos guerrilheiros. Convocaram então os “bate paus” para fazer o serviço. Entrariam sozinhos mata adentro caçando guerrilheiros à velha moda dos jagunços. A tática foi concebida dentro de uma equipe de informações que atuava em Xambioá. Os militares espalhavam na região que estavam pagando por cabeça de guerrilheiro. A primeira idéia é que cada guerrilheiro vivo valeria 5 mil cruzeiros e cada morto valeria 10 mil. Com um pouco mais dava para comprar um Fusca zero quilômetros.[31]
Mas depois se criou uma nova tabela de preços para os mortos, em função da hierarquia. Osvaldão, Dina e os membros da Comissão Militar, como Mauricio Grabois e Ângelo Arroyo, valiam 10 mil cruzeiros cada. Os comandantes e subcomandantes de destacamento valiam 5 mil cruzeiros cada, quantia suficiente para comprar um sítio de 50 hectares na região. Os demais valiam 1 mil ou 2 mil cruzeiros, dependendo do caso. E a idéia de um prêmio por prisioneiros foi esquecida. Quando os militares começaram a oferecer dinheiro “por cabeça”, estariam se referindo à unidade de guerrilheiro.
Mas na área sul do Araguaia, a sudoeste da Serra das Andorinhas, os militares recrutaram uma tribo inteira de índios suruís. Eles tinham por hábito milenar cortar as cabeças dos inimigos. Certo dia, em fins de novembro, um mateiro, caboclo que morava perto da reserva suruí, apareceu com uma sacola diante de uma equipe de pára-quedistas que tomava café da manhã num acampamento perto de Xambioá. O mateiro então perguntou aos militares quanto estavam pagando por cabeça de “povo da mata”.[32] Um deles respondeu o valor. Então ele abriu a boca da sacola, sacudiu-a e de dentro caiu uma cabeça humana entre os pratos dos soldados. Era a cabeça de Arildo Valadão. O Dossiê registra sua morte como tendo sido a 26 de novembro de 1973.
Romualdo Pessoa Campos Filho também registra o episódio, através da narrativa de um morador da região, cuja identidade o pesquisador manteve oculta:
“O Ari foi morto e quem cortou a cabeça dele foi um guia… eles criavam uma equipe de guias, que se chamavam zebras e eles foi quem faturaram o Ari”.[33]
Dois soldados que na época serviram na região, Domingos Barros de Almeida e Adolfo da Cruz Rosa[34], igualmente relataram o episódio ao jornal O Liberal, de Belém.[35] O ex-soldado Domingos relata:
“Uma das equipes entrou numa trilha e deu de cara com o Ary e o Daniel na direção contrária. Aí derrubaram o Ary. O morador chegou para ele e disse: “Tu vele dois milhões. (…) Tinha que identificar o cara, pra isso a cabeça ia para a base, Xambioá ou Bacaba. Como eram muitos dias de caminhada e a cabeça estava apodrecendo, eles pararam, fizeram uma fogueira e aferventaram na panela deles. Botaram meio quilo de sal, pra chegar na base”.
Na mesma entrevista, o ex-soldado Adolfo Cruz Rosa acrescenta:
“Quando o mateiro entrava na mata com a gente, já tinha a proposta. Se o primeiro tiro fosse dele, ele levava a recompensa”.
Os militares poderiam ter parado ali mesmo. Poderiam, por exemplo, não pagar. Ou até mesmo pagar, mas deixando claro que não era para decapitar os guerrilheiros. No entanto, preferiram aquiescer com a prática. Pagaram o preço estipulado — 1 mil cruzeiros, era o que valia a vida de Ari — sem questionar o método utilizado. Afinal, como rege o maquiavelismo vulgar, os fins justificam os meios. Ademais, os bárbaros não eram eles, e sim os outros — e aqueles terroristas que matavam adolescentes inocentes a golpes de facão, que se virassem sozinhos para escapar daquela escória dos homens desalmados da floresta, aqueles jagunços que degolavam sem vacilo em troca de dinheiro. A partir de então, a idéia de cortar cabeças disseminou-se entre os “bate-paus”. Levar só a cabeça como prova do serviço era mais fácil do que levar o corpo inteiro. Seis cabeças de guerrilheiros, talvez sete, chegaram em sacolas a Marabá ou Xambioá. [36]
Ressalto, contudo, que de acordo com o relato dos militares, essas decapitações não teriam chegado ao conhecimento dos comandantes em Brasília. A decisão de recrutar jagunços teria sido tomada pelas próprias equipes de inteligência na selva, que tinham independência operacional impar naquele momento. O dinheiro pago pelas cabeças, por sua vez, vinha das verbas secretas distribuídas entre as equipes. Não havia verba reservada para cobrir o valor de cada cabeça; para cada uma que aparecia, era preciso fazer uma coleta de dinheiro entre os chefes da inteligência para honrar os compromissos com os bate-paus. Romualdo Pessoa observa:
“É certo, no entanto, que tamanho terrorismo surtiu o efeito de criar pânico na população. Incentivou a ‘deduragem’ e, o mais grave, criou imunidade para jagunços que se tornaram bate-paus e guias do exército (…) Conta-se que esses bate-paus faziam parte do trabalho sujo que alguns soldados se recusavam a fazer, como a degola dos guerrilheiros”.[37]
[1] Os militares usam o termo “fase”. O PC do B prefere “campanha”.
[2] Há suspeitas de que quatro deles teriam sido executados depois de capturados. In: Elio Gaspari. A Ditadura Escancarada – As Ilusões Armadas. São Paulo: Companhia das Letras, 2002, p. 424.
[3] Em 8 de maio de 1972 morreu o cabo do Exército Odílio Cruz Rosa, em combate com o Destacamento B da Guerrilha, comandado por Osvaldo Orlando da Costa, codinome Osvaldão. Foi a primeira vítima da guerrilha. A 30 de setembro de 1972 morreu o sargento Mário Ibrahim da Silva. Os episódios serão narrados no Capítulo 3.
[4] Vale atentar que a versão do suicídio dos camponeses é questionada pela sociedade civil até os dias de hoje, eis que tal versão foi usada para muitas mortes suspeitas de presos durante o regime militar. O exemplo mais representativo, ainda hoje tema polêmico, foi a morte do jornalista Vladimir Herzog, em 1975, nas dependências de um quartel do Exército, em São Paulo. Os militares apresentaram a versão de que o jornalista se enforcou.
[5] O comandante Maurício Grabois descreve os “justiçamentos” em seu diário, apreendido pelas Forças Armadas. O tema será analisado em detalhes adiante.
[6] Nesse caso, todos os três seriam de fato colaboradores, dois deles conhecidos pistoleiros de aluguel, apontados pelos moradores da região como responsáveis por mortes de posseiros a mando de latifundiários.
[7] A Aeronáutica participou dessa fase com apoio aéreo e agentes de informações. A Marinha só participou da Segunda Campanha, com um destacamento de fuzileiros navais.
[8] Ressalve-se que a Convenção não abrange as chamadas guerras não-regulares; e que a Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes só foi assinada em 1984. In: Legislação sobre Direitos Humanos. Compilação organizada para a LTr Editora por HB Textos. São Paulo: LTr, 1999.
[9] Jacob Gorender. Combate nas Trevas. 5a ed., São Paulo: Ática, 1999, p. 237.
[10] Em 03 de outubro de 1973.
[11] Faria Lima era tenente-brigadeiro (quatro estrelas), último posto na carreira. Vassallo era brigadeiro-do-ar (duas estrelas).
[12] in Dossiê Araguaia, Op. cit..
[13] Esse foi o termo utilizado na ocasião.
[14] in Dossiê Araguaia, Op. cit
[15] Idem ,ibidem.
[16] No episódio, formada por dez homens, oito militares e dois guias da região.
[17] Naquele mesmo dia, orientadas pelos agentes da Operação Sucuri, as tropas chegaram ao sítio do camponês Antônio Alfredo, colaborador do Destacamento A.
[18] Maklouf Carvalho, Op. Cit., pág. 139.
[19] in: Diário do Velho Mário, Op. cit., pág. 108.
[20] Conforme o relatada em detalhes no Capítulo 2 desta pesquisa, Sônia reagiu à ordem de prisão do Dr. Asdrúbal, foi ferida e ainda assim atirou, acertando o rosto de Asdrúbal e de outro oficial que vinha atrás, o Dr. Curió. Apanhada pelos sargentos Cid e J. Peter, quando lhe perguntaram o nome, respondeu: “Guerrilheiro não tem nome”. Seu discurso revolucionário na hora da morte ecoa até hoje no imaginário dos militantes do PC do B e dos moradores da região.
[21] Em reportagem de Luis Maklouf Carvalho, publicada no jornal Movimento, de 17 de julho de 1978. In: Maklouf, O Coronel Rompe o Silêncio. Op. cit., pág. 166.
[22] Conforme já narrado anteriormente, na tragédia Édipo Rei, de Sófocles, Creonte, rei de Tebas, havia proibido o sepultamento de Polinice, seu sobrinho, morto em combate pelo poder, sob pena de morte para os desobedientes. Antígona, irmã de Polinice, resolve desafiar o édito e realiza os ritos fúnebres, justificando seu procedimento como sendo ditado pelas leis soberanas dos deuses – ou seja, pelas leis naturais. Creonte, irredutível em seu direito positivo, condena a sobrinha a ser sepultada viva em uma caverna subterrânea. In: Thomas Bulfinch. Mitologia – Histórias de Deuses e Heróis. Tradução de David Jardim Júnior. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002, 2ª ed., págs. 216-219.
[23] Conforme relatado no capítulo sobre a Primeira Campanha, o cabo Odílio Cruz Rosa foi abatido com um tiro no dia 6 de maio de 1972, enquanto bebia água em um rio. A equipe de militares fugiu pela selva, abandonando o corpo no local. O guerrilheiro Osvaldão, então, mandou avisar, através de camponeses, que não autorizava ninguém a retirar o corpo. Foi preciso organizar uma expedição especial parra resgatar o corpo do cabo, encontrado uma semana depois de sua morte, já em adiantado estado de decomposição.
[24]Durante o duelo entre os heróis, Heitor tinha proposto a Aquiles que aquele que matasse o adversário devolvesse o cadáver aos seus companheiros, o que Aquiles não acata de forma alguma. Então ainda ferido, Heitor suplica a Aquiles que não deixe que os cães o dilacerem e que envie o seu corpo a Tróia para que possa ter um funeral digno. No momento em que Aquiles vai matar Heitor, este suplica mais uma vez que entregue o seu corpo a Príamo, rei de Tróia, seu pai. Aquiles recusa e Heitor prediz-lhe a sua morte eminente (Aquiles será morto por uma flecha de Paris). E então, esquecendo o código de honra dos guerreiros e todas as normas da cavalaria, Aquiles ultraja grosseiramente o cadáver de Heitor. Perfurou-lhe os tendões dos pés, entre o tornozelo e o calcanhar, trespassou-os com uma tira, amarrrou-a no carro de combate e atiçou os cavalos a correrem, arrastando o cadáver de Heitor por três vezes em torno de Tróia. Homero. A Ilíada, Canto XXII. In: Thomas Bulfinch, op. cit., pág.262-265.
[25] Artigos 209 a 212 do Código Penal Brasileiro. In: Justino Adriano Farias da Silva. Tratado de Direito Funerário. São Paulo: Método Editora, 2000, Volume 2, pág. 716-717.
[26] O relatório da Marinha informa que seu nome correto seria Maria Célia Costa e que teria matado, a golpes de facão, o guerrilheiro Antônio de Pádua Costa. Segundo o Dossiê, foi morta em janeiro de 1974. Os próprios militares autores do Dossiê avaliam ser inverossímil a história de que Rosa teria justiçado um companheiro a golpes de facão. Avaliam que os oficiais da Marinha teriam misturado várias histórias.
[27] Adiante, há um relato sobre sua execução.
[28] Alguns militares não descartam a possibilidade de Paulo ter sido um informante cooptado pelo governo. Afinal, coincidentemente, ele desertou na véspera da Terceira Campanha. Mas nenhum dos militares que entrevistei tem qualquer informação precisa sobre o assunto. Ou seja, nenhum dos militares sabe se Paulo pertencia a alguma rede de informantes. Ou se apenas desertou.
[29] in: Diário do Velho Mário, Op. cit., pág. 107.
[30] A 19 nov. 1973, de acordo com o Dossiê.
[31] Volkswagen 1.300, o Beetle, como o automóvel é chamado na Europa e nos Estados Unidos. Na época, um Fusca novo custava 13 mil cruzeiros. Hoje, o automóvel mais popular é o Fiat Mille, que custa cerca de 20 mil reais.
[32] No início da campanha, os guerrilheiros eram chamados de “paulistas” pelos moradores da região. Àquela altura, conforme a narrativa, já estavam sendo chamados de “povo da mata”, como eles gostavam se ser reconhecidos, até por aqueles estabelecidos que os caçavam.
[33] Apud: Campos Filho, op. cit., pág. 149. Narrativa oral de J.A. (iniciais). Tais Morais e Eumano Silva registram igualmente a decapitação de Arildo. Apuraram junto a moradores da região que teria sido apanhado por uma patrulha formada por cinco militares e três mateiros, entre eles o camponês Sinézio Martins Ribeiro. A cabeça de Arildo teria sido recebida em Xambioá por um militar de codinome Dr. Cezar. Op.Cit., págs. 462 et 463.
[34] Este, irmão do cabo Rosa, morto na Primeira Campanha.
[35] ALMEIDA, Jaqueline. “Ossada dos guerrilheiros virou pó”. Belém: O Liberal, 22 mai. 2005, pág. 8.
[36] A ex-guerrilheira Criméia Almeida levanta a hipótese das decaptações terem começado antes, ainda na Segunda Campanha. Ela relata ter assistido a slides com cabeças cortadas durante sessões de interrogatório na prisão do Pelotão de Investigações Criminais (PIC), em Brasília. Eis seu relato: “Sobre as cabeças cortadas que eu vi em slides. Foi em abril de 1973, pois eu já tinha voltado para o PIC. Havia quase diariamente uma sessão de tortura que se chamava ‘cineminha’. Eu ficava numa sala na penumbra e eram projetados slides de mortos e de sacos de onde eram tiradas pelos cabelos cabeças cortadas com bastante sangue coagulado no pescoço, formando uma imensa gota espessa. Aparecia também as pernas dos soldados que as seguravam (digo soldados porque estavam de calça verde-oliva e coturnos). Pareciam lugares descampados em plena mata. Não sei quantas cabeças me foram mostradas porque essas sessões de ‘cineminha’ se repetiam com freqüência e numa própria sessão os slides se repetiam. Nessas sessões, um militar se sentava de frente para mim, de costas para a tela e anotava as minhas expressões faciais, suponho, e me mandava olhar para a tela sempre que eu desviava os olhos. Foi uma das cenas mais chocantes de tortura que eu vivenciei, se é que dá para classificar tortura em mais ou menos chocante”. Narrativa oral em 08 nov. 2005.
[37] Romualdo Campos Filho, op. cit., pág. 148.
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