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Pagar imposto é uma forma clássica de sermos solidários

Autor

  • Roberto Pasqualin

    é advogado em São Paulo árbitro mediador consultor jurídico e presidente do Ibat (Instituto Brasileiro de Arbitragem tributária). Foi presidente e integra o Conselho Consultivo do Conima (Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem). É membro do Conselho Diretor do CBAr (Comitê Brasileiro de Arbitragem) e participa do Nupet (Núcleo Paulista de Estudos Tributários). Presidiu o Comitê de Legislação a Força Tarefa de Tributação e o Centro de Arbitragem da Amcham.

13 de junho de 2006, 12h17

Diante do mau uso que os governos fazem do dinheiro arrecadado e do péssimo retorno em serviços públicos que todos (não) recebemos, alguns leitores mostraram indignação em eu ter afirmado, na entrevista, que o cidadão brasileiro deveria gostar de pagar imposto. Há pelo menos duas razões para essa afirmação.

Por pior que seja, sabemos todos que o Estado tem o dever de fornecer à população serviços básicos (educação, saúde, segurança etc.), a que todos os cidadãos têm direito. O cidadão, por sua vez, tem o dever de fornecer ao Estado os recursos para isso. A arrecadação dos tributos é a maneira de custear o Estado para prestar esses serviços. Pagando impostos, o cidadão cumpre com a sua parte dentro desta engrenagem institucional. Se o Estado erra em não prestar os serviços, se a corrupção e a incompetência desviam os recursos arrecadados, nem por isso devemos nós errar também, não pagando os impostos. Cada um deve fazer a sua parte. Isso é dever. Que força teremos para reclamar, se não cumprirmos o nosso dever, se fizermos exatamente o que eles fazem ?

Há uma segunda razão, também simples de apreender. Pagar impostos é uma das formas de participar da construção da sociedade, do País. A participação das pessoas nessa construção dá a elas a dignidade de se reconhecerem cidadãos, cidadãos-contribuintes. O indivíduo que paga imposto entrega um pouco de sua riqueza ao Estado para que ele cuide dos que não podem pagar. Essa é a forma clássica de redistribuição da renda, a forma clássica de sermos solidários. Os que têm mais dão um pouco de si para aqueles que têm menos. Através dos impostos. Deveríamos nos sentir bem com isso. O cidadão que paga impostos deveria gostar disso, gostar de poder contribuir, de ser um cidadão-contribuinte.

Essa minha afirmação é fruto da convicção de que as pessoas querem evoluir, querem subir na vida, querem alcançar patamares sempre mais altos. Ao chegarem ao ponto de serem cidadãos-contribuintes, as pessoas evoluem para uma posição na sociedade em que podem dar mais do que precisam pedir, em que podem ajudar mais do que precisam ser ajudadas. A consciência dessa posição as leva ao dever de contribuir e à satisfação de cumprir com seu dever, com a sua parte nessa engrenagem social.

Utopia ? Idealismo ? Loucura ? Neste país em que o Estado está em frangalhos, em que as carências são cada vez maiores do que os recursos e os serviços, cada vez mais insuficientes, pode até mesmo parecer idéia de louco, utópico ou idealista. Mas as pessoas, no fundo, no seu íntimo, sabem que deve ser assim, sabem que assim é que deve ser, ainda que não acreditem que assim seja. Por isso estou convencido que é preciso mudar a mentalidade das pessoas, despertar a consciência delas para fazermos as mudanças profundas que este país precisa.

De um lado, e apenas para ficar no aspecto tributação, é necessário que se crie um sistema tributário justo, exato, simples, com menos burocracia, como está sendo discutido em várias instituições no país, algo como o que descrevi na entrevista ao ConJur. De outro, e principalmente, é preciso que haja mudança nas pessoas, para que as pessoas sintam satisfação, e não horror em cumprir seu dever. E para que as pessoas, com esse exemplo, produzam mudança nos governantes. Precisamos mudar os governantes, não apenas mudar de governantes. Para que os governantes, a exemplo dos cidadãos, também sejam pessoas que se satisfaçam em cumprir seu dever. Sem roubar. Sem mentir. Sem desviar o dinheiro que nós pagamos para servir a quem precisa.

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