Ordem no Judiciário

Ao proibir o nepotismo, CNJ firmou sua competência

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28 de setembro de 2005, 15h55

Depois de decidir que os parentes de juízes que ocupam cargos na Justiça do Trabalho, nomeados entre 1988 e 1996, devem ser exonerados, o Conselho Nacional de Justiça quer ampliar o alcance da decisão. “A idéia é proibir até mesmo que parentes de magistrados sejam contratados por empresas que prestam serviços aos tribunais”, afirma o conselheiro Paulo Luiz Neto Lôbo.

Indicado pela Ordem dos Advogados do Brasil para representar a categoria, Lôbo foi quem provocou a análise da questão do nepotismo no CNJ. Em entrevista à revista Consultor Jurídico, em Florianópolis, onde é feita a XIX Conferência Nacional dos Advogados, Paulo Lôbo também falou das principais decisões tomadas até agora pelo órgão e da confusão em relação às suas atribuições.

“A maior parte das reclamações contesta decisões de juízes e o CNJ pode apenas analisar o aspecto disciplinar, como o tempo razoável de tramitação dos processos”, afirmou conselheiro.

Leia a entrevista

ConJur — O Conselho Nacional de Justiça deu nesta terça-feira (27/9) um importante passo para se firmar como órgão disciplinador do Judiciário, não?

Paulo Lôbo — Sim. Decidimos que não precisamos de lei para proibir o nepotismo. Basta regulamentar diretamente a Constituição, que determina que a Administração Pública tem de observar os princípios da moralidade e da impessoalidade. E ficou esclarecido que o CNJ tem competência para isso e sua decisão se sobrepõe às decisões do Tribunal de Constas da União, por exemplo. Os conselheiros vencidos entendiam que o Conselho não deveria regulamentar a matéria, que só poderia ser regulamentada por lei. O importante é que já há um consenso de que a regra deve alcançar até o terceiro grau.

ConJur — Até onde é possível cercar o nepotismo?

Paulo Lôbo — Numa linha queremos proibir até bisneto e bisavô. Noutra até sobrinho e tio. E na linha por afinidade o ideal é alcançar genro, nora, entre outros, porque a criatividade brasileira pra imoralidade é impressionante. Nós também vamos vedar o nepotismo cruzado, que é um juiz, desembargador ou ministro não nomear parente consigo, no seu gabinete, mas colocá-lo no gabinete do colega. Vamos fechar essa porta e atacar essa prática também de forma indireta, que é utilização de empresas que prestam serviços ao Poder Judiciário para empregar parentes de magistrados.

ConJur — Isso tudo já é consenso? Falta apenas regulamentar?

Paulo Lôbo — Sim. Agora isso será detalhado na regulamentação que faremos a partir da próxima sessão, marcada para 18 de outubro. Ficou designado um relator, que é o doutor. Douglas [Alencar Rodrigues, representante da Justiça do Trabalho, do TRT da 10ª Região], que foi quem iniciou o voto divergente que terminou sendo majoritário.

ConJur — Mas como fiscalizar os parentes de juízes contratados por empresas prestadoras de serviços à Justiça?

Paulo Lôbo — Na minha proposta esse ponto tem uma regulamentação mais refinada para que o CNJ tenha o controle de todos esses cargos. Todos os tribunais do Brasil deverão encaminhar ao Conselho uma relação dos ocupantes dos cargos com as suas relações de parentesco e os funcionários de empresas prestadoras de serviços. Com isso, será feito o cruzamento dos dados para coibir a prática do nepotismo.

ConJur — O CNJ fez um levantamento da situação nos tribunais?

Paulo Lôbo — Foi feito um levantamento das normas, da regulamentação interna. A mais antiga regra anti-nepotismo é do STF, que data da década de 70. Já existe uma lei federal que príbe o nepotismo em todo o Judiciário Federal. A nossa intenção é estender isso aos Tribunais estaduais, que é onde estão os principais problemas.

ConJur — A primeira decisão do CNJ, que determinou que a regra que proibiu as férias nos tribunais era auto-aplicável, foi desrespeitada porque diversos tribunais entraram de férias. Como o senhor vê isso?

Paulo Lôbo — O Conselho aceitou a justificativa dos tribunais que não cumpriram a orientação exatamente porque era apenas uma orientação. Agora, foi editada uma resolução sobre isso. Assim, o que antes era um entendimento, agora é um ato regulamentar. Ou seja, a partir de janeiro não se tolerará mais justificativa para as férias coletivas. Há inclusive uma proposta tramitando no Conselho para estender esta regra para os tribunais superiores e o STF, para que eles também funcionem ininterruptamente.

ConJur — O Conselho já recebeu muita coisa que não é de sua competência?

Paulo Lôbo — Essas reclamações são compreensíveis porque a população tomou conhecimento do CNJ, um órgão que antes não existia. A maioria das reclamações é porque o cidadão não está satisfeito com a decisão que o juiz tomou, inclusive reclamações encaminhadas por advogados. Mas o Conselho não tem competência para isso. A competência do Conselho é administrativa, do desempenho do Poder Judiciário, da gestão e de matérias disciplinares. Mas nos casos de atraso injustificado na tramitação dos processos, por exemplo, o Conselho pode agir porque aí entra na esfera disciplinar. Aliás, no site do CNJ vão ser publicadas todas as representações arquivadas com a devida fundamentação dos motivos que levaram ao arquivamento.

ConJur — Há reclamações graves?

Paulo Lôbo — Há vários casos sérios no Conselho. Representações de desembargador contra desembargador e situações muito sérias de juízes.

ConJur — Quais são os casos?

Paulo Lôbo — Pode-se chamar de casos de fratura exposta. O conselho adotou em princípio o critério supletivo para não impedir o funcionamento nas corregedorias dos tribunais, mas as corregedorias dos tribunais estão sob o acompanhamento do Conselho.

ConJur — Até que ponto o Conselho pode punir um juiz?

Paulo Lôbo — O Conselho poderá suspendê-lo, advertí-lo, cassar sua aposentadoria eventualmente e determinar que ele fique em indisponibilidade. O que não pode é exonerar o juiz, porque a Constituição não previu essa hipótese e daí exoneração tem de ser aplicada pelo tribunal.

ConJur — Além de proibir o nepotismo e as férias coletivas, a outra decisão de peso do CNJ foi regulamentar a promoção de juízes.

Paulo Lôbo — Exatamente, porque isso era feito antes como uma ação entre amigos. O desembargador escolhia quem ele quisesse. E isso criava uma situação de subserviência para o juiz que desejava ser promovido. Os critérios agora são objetivos, nós fizemos a regulamentação geral e agora o voto de escolha tem de ser aberto e bem fundamentado. Cada tribunal terá de dizer quais os critérios objetivos de produtividade, presteza, participação e capacitação para a promoção de um juiz.

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