Decisões conflitantes

STJ barrou uso de apólices da dívida pública desde 1999

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14 de março de 2002, 9h44

A autorização da 4ª Vara do Tribunal Regional Federal do Espírito Santo para o uso de apólices da dívida pública que abateria débitos previdenciários está suspensa, desde 1999, por determinação do Superior Tribunal de Justiça. Mesmo assim, juízes do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (RJ e ES) continuaram a validar as apólices em suas decisões.

O procedimento adotado pela primeira instância federal (ES) para a validação de apólices da dívida pública foi apontado como suspeito de irregularidades pela Corregedoria de Justiça do TRF da 2ª Região.

O entendimento do STJ adotado sobre os processos envolvendo o tema é o de não permitir a compensação tributária diante da possibilidade de lesão de difícil reparação aos cofres públicos.

Não há estimativa sobre os valores das apólices. Mas somente em um dos processos seria de aproximadamente R$ 1,3 bilhão (conforme pareceres e cálculos da Fundação Getúlio Vargas). Atualmente, a questão se encontra sob a análise do Ministério Público Federal, por determinação do ministro do STJ, Felix Fischer.

Em setembro de 1999, o ministro José Arnaldo da Fonseca, então no exercício da presidência do STJ, concedeu ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a suspensão dos efeitos da liminar determinada pelo juiz do TRF da 2ª Região, Ricardo Regueira.

A ordem judicial havia autorizado a compensação de contribuições previdenciárias em favor da Viação Joana D’Arc e outras 28 empresas com sede no Espírito Santo, cujos débitos com a autarquia federal alcançavam, à época, mais de R$ 30 milhões.

O posicionamento foi confirmado, posteriormente, pelo plenário do STJ, e por meio de uma decisão isolada do vice-presidente da Corte, ministro Nilson Naves.

Início da batalha judicial

A tramitação judicial em torno da matéria teve origem em 17 de maio de 1999, quando a Viação Joana D’Arc ingressou na Justiça Federal capixaba com uma ação ordinária a fim de obter a declaração do vencimento antecipado de apólices da dívida pública emitidas entre 1868 e 1913.

Depois, outras empresas ingressaram como autoras no processo, onde também se pedia a utilização dos títulos como moeda de privatização, garantia de outras dívidas para com a União e a transformação das apólices em precatórios.

No início de junho de 1999, o juiz da 4ª Vara Federal (ES), Antônio Ivan Athié, concedeu o pedido (antecipação de tutela) formulado pelas empresas capixabas, que tiveram assim as apólices da dívida pública validadas com maior rapidez, antes da decisão final da ação.

Para reverter este posicionamento, o INSS ingressou com um agravo de instrumento no TRF da 2ª Região. Em 30 de junho, o juiz Ney Fonseca, suspendeu os efeitos da decisão de primeira instância (4ª Vara). Em 13 de agosto de 1999, contudo, o juiz do TRF Ricardo Rigueira restabeleceu a tutela antecipada em favor das 29 empresas capixabas.

O INSS ajuizou, então, um pedido de suspensão de segurança no Superior Tribunal de Justiça (PET nº 1176). Em 24 de novembro, o presidente em exercício do STJ na oportunidade, ministro José Arnaldo da Fonseca, concedeu o pedido formulado pela autarquia federal e sustou os efeitos da tutela antecipada.

O ministro entendeu que a decisão da Justiça Federal capixaba poderia levar a outras ordens judiciais em detrimento do órgão público.

“Parece-me que os argumentos expendidos pelo requerente (INSS) demonstram, claramente, inclusive com a concessão de liminar favorecendo 29 empresas, que pretensões idênticas tendem a ser requeridas, o que causará ainda maior lesão à economia da autarquia”, afirmou à época José Arnaldo da Fonseca.

Apesar desta decisão do STJ, contrária à validação das apólices, pouco mais de um mês após, o juiz Antônio Ivan Athié recebeu um mandado de segurança e determinou (27/10/99), numa liminar, à superintendência do INSS no Espírito Santo, a concessão de certidões negativas às 29 empresas e, dois dias após, a exclusão das mesmas do Cadastro de Inadimplentes (Cadin).

O prazo fixado pelo juiz para as duas providências foi de vinte e quatro horas em sua decisão. Antônio Athié afirmou que os atos praticados pelas empresas enquanto a tutela antecipada estava em vigor não poderiam ser desconsiderados.

O órgão público resolveu, então, ingressar novamente no Superior Tribunal de Justiça. Desta vez por meio de uma reclamação (RCL nº 711), com pedido de liminar, alegando que o entendimento do juiz da 4ª Vara Federal (ES) representou uma insubordinação ao que fora determinado pelo STJ. Em 17 de novembro de 99, o presidente do Tribunal – Antônio de Pádua Ribeiro – concedeu a liminar ao INSS reconhecendo a desobediência do juiz à ordem anterior proferida pelo STJ.

O entendimento contrário do STJ à validação das apólices foi renovado em 20 de março de 2000, quando a Corte Especial rejeitou, por unanimidade, um recurso (agravo regimental) contra a decisão tomada pelo ministro José Arnaldo da Fonseca (PET nº 1176).

Entretanto, em 10 de maio de 2000, o juiz Antônio Ivan Athié proferiu a sentença da ação proposta pelas empresas capixabas em setembro do ano anterior. Confirmando a orientação adotada quando a tutela foi antecipada, o juiz da 4ª Vara Federal (ES) decidiu favoravelmente às autoras declarando a validade das respectivas apólices e a possibilidade da compensação de tributos, inclusive as contribuições previdenciárias.

Diante desta decisão, o INSS voltou a propor uma reclamação (06/07/00) junto ao STJ (RCL nº 804), com pedido de liminar. Esta solicitação foi atendida pelo vice-presidente da Corte, no exercício da presidência, ministro Nilson Naves, em 26 de julho de 2000.

Este foi o último posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça vedando o uso de apólices na compensação de débitos fiscais. As empresas capixabas ingressaram no STJ com um agravo regimental, em 2001. O recurso ainda será examinado na Corte.

Revista Consultor Jurídico, 14 de março de 2002.

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