Primeira Leitura: desafio de Ciro à Justiça Eleitoral é estratégico.
29 de junho de 2002, 7h07
Jogo de azar
A aposta de Ciro Gomes (PPS), que desafiou a Justiça Eleitoral ao falar no programa do PTB, é perigosa, mas escorada em uma estratégia bem calculada.
É a aposta de quem vê Garotinho (PSB) com falta de ar eleitoral e tem a certeza de que há uma nítida tendência à polarização entre Lula (PT) e Serra (PSDB). Sua meta: ser o outro lado da polarização com Serra. Ou Lula.
Com espaço
Admitindo-se que Garotinho está mesmo sem fôlego, dos três candidatos que restam é Ciro quem tem menos peias eleitorais. O PT e Lula passam o tempo a se justificar, a reboque das cobranças do “deus mercado”; precisam antecipar explicações e propostas, falam de “ruptura” com um modelo sem dizer qual é o modelo novo. Mas Lula é o legítimo herdeiro do descontentamento com o governo.
Do outro lado
Por mais que se diga candidato da “mudança com segurança”, da “continuidade sem continuísmo”, José Serra tem de carregar acertos e erros do governo FHC – a quem serviu – e será sempre visto pelo eleitor como o candidato da situação. Mas o governo não é, ao contrário do que pensam os mais apressados, um anátema.
Franco-atirador
Nesse ambiente um tanto engessado por onde transitam as candidaturas Lula e Serra, Ciro é um, vá lá, livre-pensador que se comporta como um franco-atirador. Se as âncoras das investigações de Santo André pesarem na candidatura Lula, Ciro vai se apresentar como a “oposição segura” ao governo.
Fadiga de material
Se o candidato tucano patinar contra Lula, por causa da fadiga de material dos oito anos de FHC no Planalto, Ciro pode-se apresentar como o candidato do mercado contra o medo provocado pelo PT.
Xadrez eleitoral
Ciro só participa desse xadrez eleitoral se amealhar as intenções de voto do efeito TV da pré-campanha. Ele precisa mostrar que está no páreo, que pode disputar com Serra sem que o eleitor tema desperdiçar o voto.
Não é por outro motivo que o candidato do PPS se esforça na tentativa de mostrar que os personagens da polarização da eleição de outubro próximo ainda não foram definidos.
Para valer
Zerado o efeito TV, Lula, Serra e Ciro ficam mais expostos à impressão que causarem no eleitor a partir do início da campanha de rua, dia 6 de julho.
Na babel eleitoral
Com mais ou menos tempo de horário eleitoral, mas com todos os candidatos falando ao mesmo tempo no rádio e na televisão, o eleitor vai começar a dizer se há espaço na atual polarização, entre Lula e Serra, para o estilo franco-atirador de Ciro. E se esse estilo tem conteúdo, é confiável ou não passa de pirotecnia eleitoral.
Assim falou… George W. Bush
“Eu nunca descarto a via militar. Todas as opções estão disponíveis.”
Do presidente dos EUA, em entrevista, quando perguntado se a doutrina americana contra o terror – ataques militares – se aplicava ao presidente da Autoridade Palestina, Yasser Arafat. Mais tarde, a Casa Branca afirmou que Bush se expressou mal.
Tudo é história
O lapso de Bush, quando falou que não descartava uma eventual ação militar contra os palestinos, tem origem definida. Afinal, os falcões têm a hegemonia da política externa em seu governo, onde, mesmo que pareça insólito, o general da reserva Colin Powell, o secretário de Estado, atua no papel de pomba.
Entre os falcões que rodeiam o presidente americano brilha o subsecretário de Defesa, Paul Wolfowitz. Braço-direito de Dick Cheney quando o hoje vice-presidente comandava o Pentágono no governo de Bush, pai, Wolfowitz é um intelectual da guerra, um ex-democrata que se bandeou para o outro lado. Na época da Guerra Fria, combateu os conceitos estratégicos que, segundo ele, implicassem em uma equivalência moral entre americanos e soviéticos.
Hoje, é um fervoroso defensor do escudo antimísseis cuja construção enterra o Tratado Antimísseis Balísticos entre Washington e Moscou, de 1972 – um dos pilares do desarmamento mundial.
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