Crime organizado

Crime organizado: soluções reais

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1 de dezembro de 1999, 23h00

Atualmente, muito se tem discutido sobre o problema da criminalidade no Brasil e especialmente no Rio de Janeiro, diante do recrudescimento e visibilidade do crime organizado, fruto espúrio do sistema econômico ganancioso que gera a injustiça social.

Várias soluções são apresentadas, algumas com grande estardalhaço nos meios de comunicação, como se houvesse uma “varinha mágica” que varresse anos e anos de equívocos históricos. Outras, balizadas pela seriedade, geralmente terminam isoladas, pela falta de esforços conjuntos e a descontinuidade comum em mudanças de governo.

Exalta-se a necessidade de uma alteração na legislação penal que lhe imprima maior rigor, mas esquece-se da importância de um programa sério que combata a fome, a ausência de educação básica e enfrente o problema da natalidade irresponsável. Uma simples mudança da lei não altera a realidade dos fatos. Neste momento de reformas constitucionais, a maior parte das propostas é casuística, podendo, com seus resultados de curto prazo, iludir e desviar a atenção dos grandes problemas inatacados.

É indispensável a estruturação dos órgãos incumbidos da segurança pública, da polícia ao Poder Judiciário.

Afirma-se que a introdução no sistema, em 1941, do inquérito policial – uma herança do império português e surgido sob inspiração da Inquisição – não vem funcionando a contento. De fato, na prática o sistema não é eficaz porque as provas orais colhidas no inquérito pela autoridade policial dificilmente são confirmadas em juízo, sob alegação de que houve arbitrariedade ou manipulação. Isto exige a repetição dos procedimentos, desperdiçando absurdamente o dinheiro público, gerando a lentidão e, conseqüentemente, a impunidade.

Uma pesquisa da Universidade de São Paulo, intitulada Índice de Segurança Pessoal e da Propriedade – Indicadores de crime e violência, comprova que quase a metade das ações penais que chegam a Juízo (sem mencionar os casos que não são sequer registrados) não é acolhida ou resulta, geralmente, em absolvição por insuficiência ou ilicitude das provas. A solução para este grave problema deveria passar pela criação dos Juizados de Instrução Criminal, à semelhança do que ocorre em quase todos os países desenvolvidos, como a França, a Itália e os EUA.

A proposta é simples. A apuração do crime e a formação da culpa se processam perante um magistrado, contando com a participação do Ministério Público e do advogado de defesa. Assim, se acaba com o inquérito policial e suas perniciosas implicações, como as alegações de violências e corrupção em delegacias. Haverá plantões judiciais e, ocorrendo o delito, tudo será encaminhado ao Juiz Instrutor para a tramitação processual.

Esta proposta já foi apresentada pelo grande jurista e estadista Vicente Raó. Segundo ele, “retira-se da polícia apenas a função que não é sua, de interrogar o acusado, tomar o depoimento das testemunhas, enfim, colher provas de valor legal”. Ainda de acordo com Raó, “mas conserva-se-lhe, porém, a função investigadora, que lhe é inerente, posta em harmonia e legalizada pela co-participação do juiz, sem o que os resultados das diligências não podem, nem devem, ter valor probatório”.

A pesquisa “O Perfil do Magistrado Brasileiro”, diagnóstico da Justiça desenvolvido pela Associação dos Magistrados Brasileiros e o Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, datada de 1996, entrevistou os juízes brasileiros e concluiu que cerca de 60% deles são favoráveis à criação do Juizado de Instrução e a esmagadora maioria é contra o inquérito policial.

No tocante às infrações penais de menor potencial ofensivo (ex: delitos de trânsito, contravenções, crimes com penas detentivas até dois anos), a Constituição já prevê a criação dos Juizados Especiais Criminais, de maneira que os Juizados de Instrução poderiam cuidar efetivamente das grandes causas que, na maioria das vezes, resultam em impunidade, por vários fatores (ex: insuficiência ou insegurança da prova da culpa).

O enorme desejo popular de acesso à Justiça não se resume às causas cíveis, mas envolve também as criminais. Ou se constrói uma Justiça democrática, com direitos iguais para todos – princípio que, na Itália, catapultou a Operação “Mãos limpas” – ou, mais uma vez, trilharemos o caminho inverso dos fatos históricos.

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