Reginaldo de Castro critica acordo multilateral
4 de setembro de 1998, 18h36
A Ordem dos Advogados do Brasil engajou-se no que se prenuncia ser a derradeira luta deste final de século: a guerra do capitalismo feroz contra os ideais humanos de liberdade, justiça e solidariedade. O presidente da OAB nacional, Reginaldo de Castro, criticou publicamente os termos do Acordo Multilateral sobre Investimentos (AMI), uma espécie de novo “manifesto capitalista mundial” que transfere a investidores transnacionais alguns direitos soberanos dos Estados-Nação.
“O mínimo que se pode dizer sobre o AMI é que vulnera a dignidade e a soberania dos povos, pretendendo impor a estes obrigações draconianas, avocando a si próprio as prerrogativas despóticas de um superpoder transnacional”, denunciou o presidente da OAB em pronunciamento feito no XV Seminário Roma-Brasília, realizado no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O acordo começou a ser negociado em 1995, no âmbito da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), reunindo os governos dos países centrais e dos países que eram considerados até pouco tempo atrás os mais promissores “mercados emergentes”, como México e Coréia do Sul. Em linhas gerais, o AMI pode ser descrito como uma carta dos direitos das empresas e investidores transnacionais diante os Estados nacionais. Para os críticos do tratado, isto representa uma capitulação incondicional dos governos nacionais diante do capital transnacional.
Os principais itens do acordo estabelecem
“o direito absoluto de investir sem nenhum tipo de restrição e a obrigação dos governos de garantir plena rentabilidade a esses investimentos”. Os termos do acordo foram denunciados em fevereiro pelo diretor do Public Citizen’s Global Watch (movimento de defesa do consumidor), Lori Wallach, em artigo publicado no “Le Monde Diplomatique”. O articulista afirmou que o texto do acordo vinha sendo negociado em segredo, até que movimentos americanos de defesa do consumidor obtiveram suas primeiras cópias e as divulgaram via Internet.
Lori Wallach afirma que o AMI já obteve consenso das 29 nações-membros da OCDE em torno de 90% de seu texto. A assinatura estaria dependendo da definição de alguns pormenores, como a relutância do governo norte-americano de abrir mão de seu poder de estabelecer sanções comerciais contra países que o incomodam. Os países europeus também querem manter a exceção cultural que lhes permite proteger suas indústrias cinematográficas e televisivas.
“O teor desse acordo repercute no âmbito da OAB, como expressão de arrogância absolutista que, sem dúvida, terá reflexos destrutivos em todo o esforço da humanidade no sentido de construir, em ambiente de solidariedade e boa-fé, blocos econômicos integrados sob normas jurídicas supranacionais” , afirmou Reginaldo de Castro. Ele classificou como deplorável declaração do diretor da Organização Mundial do Comércio (OMC), Renato Ruggiero, que descreveu o texto do AMI como sendo “a Constituição de uma economia unificada”.
“A OAB e a cidadania brasileira repudiam tal constituição e contra ela se insurgem”, declarou o presidente da Ordem, apoiando a mobilização de entidades e organizações não-governamentais (ONGs) para pressionar os governos e parlamentos a “que não se dobrem às imposições do AMI”. Estas entidades agendaram, para outubro próximo, um Encontro Internacional em Paris para elaborar e divulgar um Tratado dos Povos ou Tratado alternativo, no qual serão reafirmados os direitos básicos dos povos, em relação aos investidores e seus investimentos.
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