Continuação 1: Mendonça de Barros e Resende acusados de improbidade
9 de dezembro de 1998, 23h00
11 – Portanto, o que se almeja nesse momento, em que pese serem inumeráveis as irregularidades perpetradas nesse processo de privatização como um todo, é a apuração dessas ilegalidades praticadas por agentes da administração, em especial pelo ex-Ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, André Lara Resende, José Pio Borges, que inquinaram de nulidade o conjunto de atos praticados, destinados à alienação do controle acionário das empresas do Sistema Telebrás, os quais são, por isso mesmo, insubsistentes.
12 – Ressalte-se aqui, que conforme se verifica da transcrição do depoimento do ex-Ministro das Comunicações Luiz Carlos Mendonça de Barros perante o Senado Federal, ora oferecida, e dos trechos abaixo colacionados, ele e o Sr. André Lara Resende são “réus confessos” acerca de todo o conteúdo ideológico existente nas fitas, posto que em NENHUM MOMENTO negaram ou tentaram elidir a prática de condução de todo o processo de privatização, atendo-se o primeiro a tentar invalidar o CONTEÚDO das gravações, entendendo haver sido vítima de um atentado a sua privacidade, seja como cidadão comum, seja como agente público. Vejamos:
Ministro Mendonça de Barros:
“O texto da Veja diz que houve favorecimento do Ministro das Comunicações e do Presidente do BNDES em torno de um dos consórcios que participou do leilão da Telebrás. Gostaria apenas, para me referir pela última vez à questão das fitas gravadas no BNDES, de afirmar que o diálogo trazido pela Veja implica um segundo nível de ilegalidade. Se o primeiro atinge o direito do cidadão à privacidade, o segundo atinge o direito da opinião pública a ser bem informada, a ser informada de maneira correta sobre os fatos. E o diálogo publicado na Veja, e constante das fitas, tem este segundo defeito: além de obtido ilegalmente na fonte original, ele foi editado de maneira clara a mostrar ou induzir o leitor ou o ouvinte a um tipo de conclusão que é absolutamente falsa.”
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) – Sr. Presidente, nobre Senador Antonio Carlos Magalhães, Srªs e Srs. Senadores, Sr. Ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, Sr. André Lara Resende, Presidente do BNDES.
Sr. Ministro, logo depois das eleições, quando nos encontramos, casualmente, no Aeroporto de Congonhas, V. Exª demonstrou o respeito que tinha por meu trabalho como Senador, e eu lhe transmiti que a confiança que o povo tinha em mim levava-me a, sempre, procurar cumprir o dever da melhor maneira possível – e, por vezes, eu teria até que estar indagando V. Exª sobre possíveis problemas. E hoje eu tenho que ser extremamente severo, em função do cumprimento do meu dever constitucional como Senador.
Que razão levou V. Exª a buscar que a Previ se associasse ao Banco Opportunity e não a qualquer outro grupo?
Que razão levou V. Exª a sensibilizar o Sr. Ricardo Sérgio, Diretor do Banco do Brasil, a dar fiança ao Banco Opportunity?
Por que V. Exª buscou trazer a Italia Telecom a juntar-se ao Banco Opportunity?
O que levou V. Exª a escolher como parceiro o Banco Opportunity, dentre tantas outras alternativas de grupos econômicos?
V. Exª já foi sócio de Pérsio Arida?
Quem era o outro sócio de Pérsio Arida nesse empreendimento?
Considera que, por agir de maneira “bem-intencionada”, pode violar a Constituição, a lei que define os crimes de improbidade administrativa e a lei de licitação?
Lembro aqui que o decreto que regulamenta as privatizações, os leilões, citado por V. Exª, não contradiz a Constituição e essas leis.
A lei de mercado se sobrepõe às leis do Estado de Direito?
Será que suas ações realmente representaram maior incentivo à competição?
Na conversa com o Presidente da República, V. Exª diz que bombardeou “um monte de loucuras” que seriam praticadas por um dos participantes do leilão. Que loucuras eram essas, que não estavam previstas no edital do leilão?
Com o Presidente do BNDES, Sr. André Lara Resende – por quem tenho também o maior respeito e consideração como economista -, V. Exª discutiu a ação de seus “inimigos”. Considera bombardeio a inimigos atitudes de estímulo à competição ou de destruição?
O que V. Exª quis dizer com – está hoje nas páginas de Carta Capital -: “O negócio tá na nossa mão, sabe por que Beto? Se controla o dinheiro, o consórcio. Se faz aqui esses “consórcios borocoxôs”, são todos feitos aqui”.
Esse diálogo que V. Exª teve com o seu irmão, José Roberto Mendonça de Barros, Secretário Executivo da Câmara de Comércio Exterior, também representa atitudes de estímulo à competição?
V. Exª combinou com o Presidente do BNDES, Sr. André Lara Resende, recorrer ao Presidente Fernando Henrique Cardoso no sentido de usar a “bomba atômica” para forçar a Previ a se associar ao Banco Opportunity. O que seria essa “bomba atômica”?
Ela foi efetivamente acionada? Ou não teria sido acionada simplesmente porque o Grupo Opportunity, logo antes, venceu o outro leilão? O que aconteceu de fato? Pode nos esclarecer o que é essa “bomba atômica”?
Continuando com as conversas divulgadas pela Carta Capital, V. Exª confirma que articulou, com o Presidente André Lara Resende, para que um grupo italiano se associasse ao Opportunity?
O que exatamente quis dizer ao Presidente André Lara Resende – aqui presente -, quando afirmou: “Temos que fazer os italianos na marra, que estão com o Opportunity”; “fala para o Pio que vamos fechar daquele jeito que só nós sabemos fazer”.
Considerando que o Opportunity tem como um dos seus sócios controladores Pérsio Arida, gostaria que confirmasse se, de fato, houve a sociedade entre V. Exª, André Lara Resende e Pérsio Arida.
Avalia que seu comportamento pode ser qualificado como baseado no princípio da impessoalidade, previsto na Constituição, como condutor dos leilões de privatização?
Concluindo, Sr. Presidente, esses são diálogos, para mim, estarrecedores. Não estou ambientado na realidade dos leilões de privatização, mas imaginava que não fosse assim. Eu imaginava que os gestores públicos caracterizassem a sua ação pela imparcialidade. Mas fico sabendo que ou estão a bombardear “inimigos” ou a montar “consórcios borocoxôs”.
V. Exª mencionou à imprensa que os brasileiros e nós, Senadores, só compreenderemos as suas ações quando todas as conversas com os potenciais compradores forem divulgadas. Poderá, então, divulgar o conteúdo completo dessas conversas para que possamos compreender melhor todas as suas ações e as intenções da equipe que conduziu o processo de privatização?
O SR. MINISTRO DAS COMUNICAÇÕES (Luiz Carlos Mendonça de Barros) – Com relação à primeira pergunta, não é verdade que eu coloquei a Previ, o Banco Opportunity e a Telecom Itália em contato. Isso foi feito privadamente entre eles. Só ficamos sabendo da formação do consórcio quando os italianos, os representantes da Telecom Itália procuraram-me para dizer que aquilo que tinha sido acertado previamente entre os três – Banco Opportunity, Telecom Itália e Previ, e que eles tinham reportado – estava sendo desmontado por exigências da Previ. Então, a minha primeira resposta foi não.
Com relação ao Ricardo Sérgio, no final da tarde, o Opportunity comunicou ao BNDES que não estava conseguindo a carta de fiança do Citibank, exatamente porque a Previ não se propunha a assinar o documento de consórcio oficialmente formado – e essa era uma das exigências do Citibank. Falei ao Ricardo Sérgio que – e, certamente, um bom pedaço desse nosso diálogo não está na matéria da Veja -, em função desse problema criado pela própria Previ, parecia-me absolutamente correto, para evitar que esse consórcio não conseguisse apresentar a carta de fiança em tempo hábil, que o Banco do Brasil desse a carta de fiança. Ele me falou: “Mas nós já demos a carta de fiança para o outro consórcio.” Ao que respondi: “Não há problema nenhum, porque, como são os dois consórcios no mesmo leilão, apenas um vai ganhar e, portanto, você não está duplicando a sua carta de fiança.” E o Banco do Brasil deu a carta de fiança.
(grifamos e ressaltamos)
13 – Do trecho acima transcrito deverão ser levados em consideração alguns aspectos que prima facie já seriam suficientes para caracterizar a prática compulsiva de atos improbos, bem como caracterizar a cumplicidade dos có-réus em todo o episódio.
14 – Por primeiro e principalmente verifica-se que, o Sr. ex-Ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros confessa que o inteiro teor ideológico contido nas fitas gravadas e divulgadas pela Revista Veja são de fato transcrições de diálogos concretamente ocorridos.
15 – Por segundo, note-se a promiscuidade de relacionamento e ações existentes entre o agente público responsável pela condução da mega – privatização com um dos concorrentes, basicamente o Banco Opportunity e o seu sócio Pérsio Arida.
16 – Por terceiro, evidenciou-se no depoimento do ex-Ministro ao Senado que o Sr. Ricardo Sérgio de Oliveira, ex- Diretor Internacional do Banco do Brasil, compactua dos esforços do agente público em “resolver” eventuais problemas de um dos concorrentes, justamente aquele com quem mantém seus relacionamentos promíscuos.
17 – E finalmente, note-se ainda Exmo. Sr. Procurador Federal que o agente público induz e o representante do Banco do Brasil aceita o fornecimento de garantias muito além do limite estabelecido, visando fraudar este mesmo limite, contando apenas com a possibilidade de não serem exigidas as duas cartas de fiança em virtude das regras do leilão e portanto, não ser descoberto tal procedimento.
Continua em Comunidade Jurídica.
Revista Consultor Jurídico, 10 de dezembro de 1998.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!