Transações imobiliárias - burocracia não significa segurança
27 de agosto de 1997, 0h00
Ninguém mais que um advogado repudia a burocracia que envolve as aquisições imobiliárias. Amealhar toda a documentação exigida em cada operação é uma maratona exaustiva e deprimente, especialmente porque boa parte da papelada revela-se inútil diante da razão pela qual foi solicitada: a de dar segurança aos cidadãos que negociam um imóvel.
Ninguém mais que um advogado exige o cumprimento dessa burocracia, exatamente porque é sua obrigação profissional defender a segurança das partes que representa. Todas as exigências e todos os procedimentos devem ser cumpridos, para não se dar margem a alegações de falhas procedimentais – mesmo sabendo-se que, na prática, tudo que se consegue é uma falsa segurança.
“Esse é um grande conflito que vivem os advogados que atuam na área do Direito Imobiliário”, afirma o advogado Marcelo Terra, sócio do escritório Duarte Garcia, Caselli Guimarães e Terra Advogados. A parafernália de documentos é muito grande e inclui papéis sem valor real para a operação imobiliária, como as certidões forenses, diz o advogado.
Nesse ponto, as operações “imobiliárias” são o oposto das “mobiliárias”, em que vultosos patrimônios são alienados, às vezes, por telefone, sem exigências de certidões dos distribuidores forenses, sem anuência de cônjuges, sem qualquer complicação.
Para Marcelo Terra, os advogados devem cooperar com os poderes constituídos pela busca de um equilíbrio maior entre a burocracia e a segurança, cujos parâmetros são muito díspares hoje em dia: a burocracia é exageradamente grande e a segurança é pouca, declara o advogado.
Ele acha que os principais enfoques na busca do equilíbrio entre “segurança e burocracia” são estes:
1. Aprimorar conhecimentos dos profissionais que atuam na área (advogados, juízes, promotores, registradores, notários e empresários), através da inclusão de matérias de direito registral e direito notarial nos cursos de graduação e pós graduação e da realização de eventos que ensinem e divulguem essas matérias;
2. Regionalizar a legislação, para que os Estados disponham de meios técnicos próprios, visando, inclusive, a implantação do sistema de cadastro imobiliário;
3. Aprofundar estudos sobre “boa fé”, “terceiro registrário”, “aparência registral”, “legitimação registral”, “fé pública registral”, “publicidade registral em confronto com a publicidade processual” e tantos outros institutos que permitam o aperfeiçoamento do Direito Civil, bastante abandonado nas últimas décadas;
4. Desenvolver estudos sobre o “seguro voluntário de título aquisitivo” – esse instituto não resolverá, por si só, o problema documental, apenas o deslocará para o âmbito da seguradora; mas, como todo seguro, trará uma dose maior de segurança ao cidadão comum, ainda que, por via de regresso, profissionalize a “assunção de risco”.
5. Conferir prestígio às instituições registrais e notariais, ampliando entre os cidadãos a compreensão da necessidade e da importância do registro do título aquisitivo;
6. Valorizar a publicidade registral – isto é, estimular os credores (públicos e particulares) a fornecerem ao registro imobiliário informações sobre créditos ajuizados (através dos mecanismos jurídicos existentes), para expurgar do sistema brasileiro os “privilégios ocultos”, traduzidos no protesto contra alienação de bens, na fraude de execução, na fraude contra credores, não mencionados na matrícula imobiliária; a publicidade processual perde seu valor quando desacompanhada da publicidade registral;
7. Debater a introdução do mecanismo de reserva registral facultativa de prioridade, quer a prévia à lavratura do título, quer a posterior – a reserva de prioridade é adotada em sistemas jurídicos em que a aquisição da propriedade se dá pelo título, revestindo-se o registro do caráter meramente publicitário e não do constitutivo; se esse instituto ampliar a segurança do cidadão, sem representar mais burocracia excessiva e aumento de custo, deverá ser bem recepcionado entre nós;
8. Desenvolver estudos sobre sistemas de transmissão do direito de propriedade no Direito Comparado, para se analisar a adoção de soluções legislativas brasileiras para situações fáticas semelhantes em outros países, considerando-se a conveniência do aculturamento ou nacionalização de experiências bem sucedidas.
9. Desenvolver estudos mais profundos sobre eventuais efeitos de inalienabilidade (temporal e subjetivamente restrita) do imóvel caracterizado no regime da propriedade pré-horizontal e do parcelamento do solo.
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