Opinião

Reflexões sobre coisas que não deveriam existir no Brasil

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11 de março de 2017, 16h45

Estou pensando que realmente muitas coisas não deveriam existir. Começaria, por estarmos em março, pela violência que agride e mata milhares de mulheres, continuaria pelo trabalho forçado e infantil, todos com grave violação à vida, à liberdade, à educação, à segurança etc.

São tantas coisas que não deveriam existir no Brasil: pobreza, discriminação, corrupção…

Não deveria existir a intolerância, o abuso de poder, autoridades que falam e agem contra os princípios e regras constitucionais.

Não deveria existir o desprezo aos direitos sociais, o descumprimento à lei ou a vingança institucional, novo conceito a ser pesquisado pelos sociólogos após as inúmeras perseguições sofridas pela Justiça do Trabalho, com uso de outras instituições e quase sempre decorrentes de descontentamentos pessoais. Que outro ramo do Poder Judiciário incomoda tanto os donos do capital, mesmo que seja por fazer cumprir a lei? Não é à toa que sofra tantos ataques em sua missão de equilibrar interesses entre capital e trabalho, inclusive com respaldo e alarde da grande imprensa.

Será que desde a colonização tem este país vivenciado tantas coisas que “não deveriam existir” (escravidão, clientelismo, patrimonialismo) que ficou difícil superar a visão da exploração pela prática da valorização social do trabalho e livre iniciativa?

Sugiro que elevemos o debate se realmente queremos um Brasil melhor. Um país que é o segundo do mundo em acidentes e mortes no trabalho, onde 70% de seus trabalhadores recebem salários reduzidos (até dois salários mínimos) e mais de 40% nem sequer começaram o ensino médio, não mereceria uma discussão mais aprofundada sobre saúde, educação e relações de trabalho para o desenvolvimento?

A consolidação do Estado Democrático de Direito, salvo para os que acham que ele também “não deveria existir”, exige firmeza e determinação na defesa dos fundamentos da Constituição da República e na transformação da cultura da “banalização do mal e da exploração” para a cultura da cidadania, do pluralismo, do respeito e da dignidade da pessoa humana. Isso, sim, transformará o Brasil.

Autores

  • é ministra do Tribunal Superior do Trabalho, doutora em Políticas Públicas, membro da Comissão de Erradicação do Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho (CSJT-TST) e do comitê gestor do Programa de Combate ao Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho (CSJT-TST).

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