Passado a Limpo

ConJur terá coluna sobre Consultoria-Geral da República

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4 de fevereiro de 2014, 18h23

A partir desta quinta-feira (6/2), a revista eletrônica Consultor Jurídico passa a contar com a coluna Passado a Limpo, na qual Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, livre-docente em Teoria Geral do Estado pela USP, vai explorar os pareceres da antiga Consultoria-Geral da República (CGR). A ideia, diz ele, é tentar mapear a história politica e administrativa do Brasil.

A CGR, posteriormente, tornou-se a Advocacia Geral da União, órgão hoje com cerca de 8 mil advogados, que atuam na defesa dos interesses da União, fazendo a representação judicial e prestando consultoria.

O projeto de reunir os pareceres da CGR iniciou-se em fins de 2010. A primeira etapa, explica o colunista — que já escreve na ConJur, na coluna Embargos Culturais — consistiu na leitura atenta de todos os pareceres da CGR tal como publicados, desde 1903.

Os textos mais ilustrativos foram selecionados e copiados. A partir dessas cópias, foram produzidas versões em português contemporâneo. Em muitos, houve a supressão de referências a doutrina estrangeira.

Foram então feitos comentários concisos sobre cada um dos pareceres. “O leitor poderá, ao longo do estudo de cerca de 300 pareceres, fazer um juízo de valor sobre a atuação histórica da advocacia pública brasileira. São textos jurídicos que revelam a inteligência, a criatividade, a seriedade e o comprometimento dos advogados públicos brasileiros”, conta Godoy.

O trabalho, diz ele, é dedicado ao ministro Luís Inácio Lucena Adams, “cujas preocupações para com o resgate do passado revelam alma elevada, culta e centrada na realização de um presente seguro e equilibrado”. O projeto, segundo ele, é uma contribuição intelectual para uma gestão caracterizada pela fixação de uma advocacia pública atuante, protagonista da história, construtora do futuro, sempre alicerçada nas importantíssimas e imprescindíveis lições do passado.

No texto abaixo, Arnaldo Godoy fala sobre a CGR:

A Consultoria-Geral da República-CGR foi criada pelo Decreto 967, de 2 de janeiro de 1903, assinado pelo presidente Rodrigues Alves. Funcionou ininterruptamente até 1993, quando se organizou a AGU, que lhe tomou prerrogativas e competências, algumas diluídas parcialmente na atual Consultoria-Geral da União. No passado mais remoto, em alguns aspectos, o papel da CGR foi exercido pelas versões de Conselho de Estado que houve no século XIX.

À frente da Consultoria-Geral da República estiveram renomados juristas da reminiscência brasileira. Entre eles, Araripe Júnior (1903-1911), Rodrigo Octávio (1911-1929), Levi Carneiro (1930-1932), Carlos Maximiliano (1932-1933), Francisco Campos (1934), Anníbal Freire (1938-1940), Orozimbo Nonato (1940-1941), Hahnemann Guimarães (1944-1945), Themístocles Brandão Cavalcanti (1945-1946, novamente, em 1955), Miguel Seabra Fagundes (1946), Haroldo Valadão (1947-1950), Brochado da Rocha (1955-1956), Caio Tácito (1957), Victor Nunes Leal (1960), Caio Mário da Silva Pereira (1961), Rafael Mayer (1974-1978), Ronaldo Poletti (1984-1985), Paulo Brossard (1985-1986) e Saulo Ramos (1986-1989).

Ao Consultor-Geral da República, nos termos do Decreto 967, de 1903, contemplava-se amplo conjunto de competências. O consultor-geral da República ocupava cargo de estrita confiança do presidente da República. Participava ativamente das grandes decisões do governo. Esse conjunto originário de competências foi substancialmente modificado pelo Decreto 22.386, de 24 de janeiro de 1933, baixado pelo presidente Getúlio Vargas. Revelando-nos o caráter autoritário do governo que baixou o decreto que aqui se menciona, governo Vargas, dispunha-se que “os pareceres do Consultor-Geral não serão [seriam] comunicados aos interessados, nem publicados, senão quando o Governo o autorize [autorizasse], salvo por motivo relevante a juízo do próprio Consultor-Geral”.

O Decreto 41.249, de 5 de abril de 1957, baixado pelo presidente Juscelino Kubitschek, alterou um pouco o modelo. As consultas somente seriam admitidas “em assuntos de alta relevância, precisando-se a questão jurídica sobre a qual se pretende [pretendia] parecer”. Ao consultor-geral da República era dado, “para efeitos protocolares e de correspondência, o tratamento devido aos Ministros de Estado”. O status do consultor-geral da República, assim, era ministerial.

No pequeno interregno parlamentarista fez-se ligeira alteração de minudência na estrutura, vinculando-se a CGR diretamente ao presidente da República e à Presidência do Conselho de Ministros. Com o fim do parlamentarismo a estrutura da Consultoria-Geral da República permaneceu do modo como até então funcionara.

Estudo dos pareceres emitidos pelos consultores-gerais da República indica simplicidade temática, comparando-se com os dias de hoje, evidentemente. Não se tinha a complexidade estatal que hoje se conhece, o que se expõe na medida em que os pareceres mais recentes começam a ser pesquisados. A litigância intragovernamental também é pouquíssimo recorrente, no início das atribuições do órgão aqui estudado, certamente porque competências eram bem nítidas, num contexto de poucos ministérios, especialmente até meados da década de 1970.

Na década de 1980 vários conflitos intragovernamentais foram resolvidos pela Consultoria-Geral da República, a exemplo de disputa entre Cade e Petrobras, relativa a  política petroquímica nacional, que o presidente da República queria avocar; de um desentendimento entre a Funai, o Ministério de Minas e Energia e o então denominado Ministério do Interior, sobre empresa que explorava estanho em área indígena; bem como vários conflitos federativos, reais ou potenciais, inclusive ligados a diferenças entre a União e o estado de Goiás ou entre a União e o antigo estado da Guanabara. A construção de Brasília suscitou algumas divergências.

Esse papel de orientação jurídica do Poder Executivo é hoje exercido pela Advocacia-Geral da União.

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