Efeito colateral

OAB vai pré-qualificar candidatos ao quinto constitucional

Autor

21 de julho de 2010, 17h40

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil espera pôr fim, em setembro, à guerra que trava com o Superior Tribunal de Justiça desde 12 de fevereiro de 2008. Naquela data, os ministros do STJ devolveram à Ordem a lista sêxtupla da qual deveria sair o nome do novo ministro que iria compor a Corte na vaga do quinto constitucional destinada à advocacia.

A justificativa oficial do STJ foi a de que nenhum dos seis candidatos obteve os 17 votos suficientes para ser indicado. Mas os nomes foram rejeitados porque a maior parte dos ministros não concordou com a escolha feita pela entidade dos advogados. Na verdade, a maioria entendeu que nenhum dos candidatos possuía as qualificações necessárias para se tornar ministro do STJ.

A decisão representou um tiro quase fatal no já combalido quinto constitucional, que vinha sofrendo ataques por parte de Tribunais de Justiça. Antes do STJ, os tribunais do Rio de Janeiro e de São Paulo já haviam devolvido listas por não querer entre seus membros os nomes indicados pela OAB.

Contra a devolução da lista, a Ordem recorreu ao próprio STJ e ao Supremo Tribunal Federal. Perdeu nas duas vezes. Partiria para outra batalha, mas recuou diante de conselhos de advogados militantes e ministros oriundos da advocacia.

O argumento comum foi o de que a Ordem poderia até ganhar a batalha, mas o quinto constitucional sairia enfraquecido e daria ainda mais munição para os ataques de entidades da magistratura. O fortalecimento do quinto não passaria pela vitória judicial, mas sim pela qualificação das listas apresentadas aos tribunais. Com nomes fortes, ministros e desembargadores não teriam motivos para rejeitá-las.

Novas regras
No dia 8 de julho, a OAB decidiu parar de brigar com o STJ e publicou edital para convocar os advogados a se candidatarem às vagas abertas com a aposentadoria dos ministros Antonio de Pádua Ribeiro, Humberto Gomes de Barros e Nilson Naves.

De acordo com a Constituição, um quinto das vagas nos tribunais do país deve ser preenchido por advogados e membros do Ministério Público indicados por seus pares. A reclamação comum entre os juízes é a de que, muitas vezes, as listas da OAB são formadas com os nomes de preferidos pela diretoria da ocasião, não com os que seriam mais vocacionados para exercer a magistratura.

A atual direção da OAB nacional parece disposta a mudar isso. A primeira atitude tomada para qualificar as listas enviadas aos tribunais foi acabar com o voto secreto. Os votos serão lidos em plenário e todos saberão quem são os escolhidos dos 81 conselheiros e dos oito ex-presidentes com direito a voto. A mudança acaba com as corriqueiras situações de um candidato receber apoio declarado de 20 colegas e, nas urnas, só receber 15 votos.

Para equilibrar as três listas, a Ordem decidiu mudar a forma de composição. O candidato mais votado comporá o primeiro lugar da primeira lista. O segundo irá para o primeiro lugar da segunda lista e o terceiro mais votado encabeçará a terceira lista. O quatro colocado também fará parte da terceira lista. O quinto irá para a segunda e o sexto para a primeira lista. Mesclando os nomes escolhidos, a entidade espera fazer três listas fortes. O que acontecia antes era que os últimos colocados compunham a última lista, o que a tornava mais fraca do que as demais.

O presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante Júnior, ressalta que advocacia e Ministério Público têm de “selecionar seis nomes que possam representar a classe de forma tal que qualquer um dos escolhidos tenha condições de se tornar ministro ou desembargador”.

Para o conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, Marcelo Nobre, reconhecido advogado militante até compor o CNJ, “a OAB tem o compromisso com a sociedade brasileira de apresentar nomes consistentes, de profundo conhecimento jurídico, que tenham o respeito da comunidade jurídica e fortaleçam o importante quinto constitucional. Isso quer dizer que o candidato precisa conciliar vida acadêmica a uma advocacia profundamente atuante”.

Corrida eleitoral
Para conseguir nomes com este perfil, além de estabelecer as novas regras, interlocutores da OAB e outras associações da advocacia estão em campo trabalhando para que advogados representativos se inscrevam para disputar as vagas.

O Fórum Nacional da Advocacia Pública, que reúne sete entidades de advogados públicos, por exemplo, declarou apoio ao procurador-geral do Banco Central, Francisco José de Siqueira. O procurador ocupa o posto mais alto da advocacia do Banco Central há pouco mais de sete anos e implantou um método de gestão que fez com que o índice de vitórias da instituição chegasse a 92% das causas.

De acordo Fabiano Jantalia, vice-presidente da Associação dos Procuradores do Banco Central, Siqueira foi escolhido por unanimidade pelos advogados públicos não porque é da classe, mas porque tem a experiência, conhecimento jurídico e capacidade de diálogo necessários para o posto. Quando o ministro Dias Tofolli deixou a Advocacia-Geral da União para integrar o STF, Siqueira foi cotado para substituí-lo.

Outros nomes de peso devem entrar na disputa. A advogada Paula Forgioni, que já foi sócia do ministro Eros Grau e é um dos nomes mais requisitados nas áreas de Direito Comercial e Antitruste, entrará na disputa. Ela conta com o apoio do advogado e ex-ministro da Justiça do governo Lula, Márcio Thomaz Bastos.

Os advogados Luís Girotto, que já disputou uma vaga no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, e Alexandre Thioller Filho também são nomes cotados para figurar nas listas da Ordem. O diretor jurídico da Caixa Econômica Federal, Antonio Carlos Ferreira, é outro provável concorrente.

São requisitados também ex-dirigentes de classe. O advogado Vladimir Rossi, vice-presidente da OAB nacional na gestão passada, e a advogada Estefânia Viveiros, ex-presidente da OAB no Distrito Federal, vêm sendo citados como concorrentes nas rodas de advogados. O ex-presidente da Associação dos Advogados de São Paulo, Marcio Kayatt, é outro nome recorrente.

Advogados respeitados como Reynaldo Andrade da Silveira, do Pará, Alde Santos Júnior, de Brasília, e Geraldo Escobar, de Mato Grosso do Sul, também são citados como fortes candidatos às vagas de ministro. Da lista rejeitada pelo STJ há mais de dois anos, apenas um candidato deve insistir na disputa: o advogado Marcelo Galvão, de Brasília.

A OAB espera receber ao menos 50 inscrições para a disputa das três vagas. “Talvez tenhamos representantes de todos os estados e do Distrito federal nessa disputa, o que seria bastante saudável porque representaria a diversidade da advocacia no Brasil”, afirma Ophir. O prazo para os advogados interessados se inscrever para disputar as vagas de ministro do STJ se encerra no dia 11 de agosto, Dia do Advogado.

Listas da discórdia
Sempre houve embates entre advocacia e magistratura por conta do quinto constitucional, mas nos últimos anos as discordâncias se acirraram e os tribunais descontentes com as listas decidiram devolvê-las para a OAB. Há um mês, por exemplo, o Tribunal de Justiça de São Paulo rejeitou duas de quatro listas apresentadas pela seccional paulista para preencher vagas naquele tribunal.

Não foi a primeira vez que isso aconteceu em terras paulistas. Em 2005, a OAB enviou para apreciação do TJ-SP cinco listas sêxtuplas de uma vez. O tribunal aprovou os nomes de três candidatos constantes em cada uma de quatro listas. No quinto caso, porém, os desembargadores rejeitaram todos os nomes propostos pela OAB.

Com os nomes mais votados que sobraram das outras listas, eles formaram uma nova relação com os três nomes a serem encaminhados à aprovação do governador. O procedimento desagradou a OAB que alegou sua inconstitucionalidade e entrou com pedido de Mandado de Segurança no Supremo.

Com base em voto do ministro Sepúlveda Pertence, o STF decidiu que os tribunais não podem interferir na composição das listas enviadas a eles pela OAB para a escolha dos advogados indicados ao quinto constitucional. Os ministros entenderam também que o tribunal poderia devolver a relação original à Ordem, desde que a devolução fosse “fundada em razões objetivas de carência por um ou mais dos indicados dos requisitos constitucionais” para a vaga de desembargador.

O tribunal paulista acatou a sugestão: justificou a rejeição de dois nomes constantes da lista e devolveu-a para a OAB. Os desembargadores alegaram que um dos indicados respondia a processo criminal e outro não tinha notável saber jurídico já que fora reprovado uma dezena de vezes em concursos para ingresso na magistratura. A OAB ajuizou, então, uma Reclamação no Supremo. Alegou que o TJ-SP descumprira decisão da Corte. Esse pedido foi julgado improcedente.

Recentemente, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que também já rejeitou listas, resolveu criar uma prova para os candidatos do quinto constitucional. A OAB fluminense contestou a medida e o Conselho Nacional de Justiça a derrubou. Mas o episódio ilustra bem como são as relações entre juízes e advogados quando o assunto é o quinto constitucional.

Os problemas deixaram de ser locais quando o STJ rejeitou a lista formada pela OAB nacional. A discussão ganhou outro peso. Os ataques da magistratura que se seguiram à rejeição da lista e as derrotas da OAB nos tribunais fizeram a entidade repensar sua atuação em relação ao quinto constitucional.

No dia 12 de setembro, o Conselho Federal se reunirá para escolher os candidatos que formarão as três listas que serão enviadas ao STJ sob os olhos de juízes, desembargadores e, principalmente, ministros daquela Corte. Para o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, a credibilidade e a respeitabilidade do quinto estão intimamente ligadas à escolha feita pela OAB. “Nós temos de ter critério, responsabilidade e consciência de que o fortalecimento do quinto passa por bons nomes.”

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!