Embora os desembargadores do Órgão Especial do Tribunal de Justiça fluminense tenham votado para suspender o aumento, de 11% para 14%, da contribuição previdenciária em prol dos servidores estaduais, a decisão pode ter efeito contrário e fazer o governo do Rio de Janeiro voltar a atrasar os salários de seus funcionários.
No fim de 2017, o Rio entrou no regime de recuperação fiscal instituído pela Lei Complementar 159/2017. O ingresso no programa proporcionou ao estado acesso a benefícios fiscais para lhe ajudar a colocar as finanças em dia, como suspensão do pagamento da dívida com a União até 2020 e dispensa temporária da necessidade de cumprir dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000). Além disso, a União avalizou empréstimo de R$ 2,9 bilhões que o Rio contraiu junto ao banco BNP Paribas para pagar os salários de servidores.
Mas a adesão ao programa, conforme a LC 159/2017 e o acordo firmado entre a União e o Rio, esteve condicionada à adoção de uma série de medidas de saneamento das contas públicas. Entre elas a privatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) e o aumento, de 11% para 14%, da contribuição previdenciária de servidores. Instituído pela Lei estadual 7.606/2017, o desconto é aplicado a todos os funcionários públicos ativos do estado, além de aposentados e pensionistas que recebem mais do que o teto do INSS, de R$ 5.645,80.
A nova alíquota, porém, foi suspensa nessa segunda-feira (9/7) pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio. De acordo com os desembargadores, o estado não pode aumentar alíquota de tributo sem apresentar estudo que demonstre a necessidade da medida. Em um cenário em que os salários de servidores estão congelados há anos, o incremento de um imposto dessa forma configura confisco, prática proibida pela Constituição.
Só que, sem a contribuição previdenciária de 14%, o Rio de Janeiro descumpre o acordo de firmado com a União, disse à ConJur o procurador do Estado Erick Tavares. Segundo ele, uma saída do regime de recuperação fiscal teria consequências trágicas para o Rio: o vencimento antecipado de todas as dívidas do estado com a União, incluindo juros e correção monetária.
E mais: o estado voltaria a entrar no regime geral da lei de responsabilidade fiscal — que é mais rígido. Ou seja: não poderia mais usar dinheiro de empréstimo para pagar seus servidores, como fez com os R$ 2,9 bilhões que tomou do BNP Paribas.
Embora os desembargadores do TJ-RJ tenham justificado sua decisão de suspender o aumento da alíquota como uma forma de proteger os servidores estaduais, a medida pode acabar prejudicando-os, afirmou Tavares.
“A decisão do TJ-RJ deve dificultar ainda mais a recuperação econômica do Rio e o pagamento de servidores, aposentados e pensionistas. Uma decisão que supostamente poderia ajudá-los pode acabar prejudicando os funcionários públicos. Podemos voltar àquele cenário antes de firmar o acordo, quando o estado não tinha dinheiro e os salários e pensões eram constantemente atrasados”, apontou o procurador.
Ida ao Supremo
Erick Tavares também criticou o fato de uma norma dessa magnitude ser suspensa por uma medida cautelar. “A lei passou por uma análise dos representantes da União, e ninguém viu nenhuma inconstitucionalidade nela.”
Ao fazer sustentação oral no Órgão Especial na segunda, Tavares citou uma frase do ex-ministro da Suprema Corte dos EUA Antonin Scalia: It's possible for a law to be really stupid, but still constitutional (é possível que uma lei seja realmente estúpida, mas ainda constitucional). Assim, o procurador do Rio disse que o fato de se discordar da Lei 7.606/2017, que instituiu o aumento da contribuição previdenciária, não a torna inconstitucional.
Ele declarou que a PGE-RJ apresentará um pedido de suspensão de liminar ao Supremo Tribunal Federal. A Procuradoria fluminense também moverá reclamação à corte, uma vez que o ministro Roberto Barroso ordenou a suspensão de ações sobre o assunto em todo o país até o julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo 875.958.
No caso, com repercussão geral reconhecida, a corte irá analisar se o aumento das alíquotas de contribuição previdenciária do funcionalismo público estadual por meio de lei local é constitucional.