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60% dos americanos acham que Suprema Corte decide politicamente

23 de novembro de 2021, 9h27

Por João Ozorio de Melo

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Em um país mais dividido do que nunca, com posições cada vez mais radicais de republicanos e democratas — e independentes flutuando de um lado para outro no meio — os eleitores dessas três tendências concordam em uma coisa: a Suprema Corte dos EUA decide com base nas posições políticas-ideológicas dos ministros — não na lei.

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supremecourtus.govMais de 60% dos americanos acham que Suprema Corte toma decisões políticas

Uma pesquisa da Universidade de Quinnipiac, divulgada no fim de semana, indica que 61% dos eleitores americanos — ou seja, 6 em 10 — acreditam que a Suprema Corte é motivada por política. Apenas 32% dos eleitores acreditam que toma decisões baseadas na lei (7% não tem opinião ou não sabe dizer).

A descrença na mais alta corte do país é maior entre os democratas: 67% apontam para a política, contra 27% para a lei (6% indecisos). Entre os eleitores independentes (ou sem partido), 62% acham que a motivação dos ministros é política, contra 27% para a lei (1% de indecisos).

O dado mais relevante, no entanto, vem da percentagem de republicanos que veem uma Suprema Corte mais politizada do que nunca: 56%. E 39% dos republicanos acham que os ministros tomam decisões baseadas na lei (5% indecisos).

Essa é uma informação surpreendente porque a Suprema Corte dos EUA é constituída por seis ministros conservadores (indicados por presidentes republicanos) e apenas três liberais (indicados por presidentes democratas). Ou seja, eles deveriam estar satisfeitos com a maioria solidamente conservadora decidindo todos os casos polêmicos a seu favor.

Pesquisas mostram que o prestígio da Suprema Corte também está em queda progressiva. A última, divulgada pela Universidade de Quinnipiac em setembro, indicou que a aprovação do trabalho dos ministros caiu para 37%, entre os eleitores registrados, enquanto 50% desaprovam abertamente e 13% não têm opinião formada — os piores números de todos os tempos.

Três ministros da corte — Clarence Thomas, Stephen Breyer e Amy Barrett — saíram em campo recentemente para defender a ideia de que a Suprema Corte não é politizada. A ministra Amy Barrett deixou uma frase para os anais da história: "A Suprema Corte dos EUA não é composta por um bando de politiqueiros (partisan hacks). Só para provocar desrespeitosos "é sim".

Uma das razões para a queda acentuada do prestígio da corte nos últimos meses foi a decisão de deixar uma lei antiaborto do Texas entrar em vigor. A lei é bem radical: proíbe o aborto após a sexta semana de gestação — um período em que as mulheres sequer sabem que estão grávidas, mas que os médicos podem detectar batidas cardíacas do feto.

A lei texana viola claramente precedente de 1973 da própria corte, que legalizou o aborto em todo o país. Em Roe vs. Wade, a corte decidiu que um aborto pode ser feito até que seja determinada a "viabilidade fetal", o que normalmente ocorre entre as 22 e 24 semanas de gravidez.

A Suprema Corte promoverá a audiência para ouvir e discutir as alegações de advogados no caso Dobbs v. Jackson Women's Health Organization, em que estará na pauta uma lei de Mississippi que proíbe o aborto após a 15ª semana de gestação.

Nessa ação, está em jogo a sobrevivência de Roe Vs. Wade. As expectativas são as de que a corte, com seis ministros conservadores e religiosos, poderá derrubar o precedente ou reformá-lo — possivelmente deixando para cada estado o privilégio de legislar sobre o aborto.

Hoje, já está florescendo nos estados vizinhos do Texas uma espécie de "turismo do aborto", uma vez que está praticamente inviável para as texanas fazer um aborto em seu estado.

Se a Suprema Corte transferir para os estados a responsabilidade de legislar sobre o aborto, os estados republicanos irão proibi-lo, os estados democratas irão mantê-lo. O movimento turístico vai aumentar bastante em todo o país.